Confinamentos sedentários e estreantes no exercício físico aumentaram procura por fisioterapeutas
Se antigamente era o trabalho no campo a maior fonte das patologias, hoje o sedentarismo e as largas horas ao computador são os piores inimigos da boa postura. A propósito do Dia Mundial da Fisioterapia, O MIRANTE falou com dois terapeutas da região sobre os efeitos do confinamento nas articulações e a saúde de uma especialidade que não está ao alcance de todos.
Os fisioterapeutas beneficiaram com o período de confinamento provocado pela pandemia de Covid-19, que atirou muita gente para o sofá. As más posturas quer a dormir, quer a trabalhar com uma maior descontração em casa, para quem esteve em teletrabalho, levaram a que, assim que foi decretado o desconfinamento, a procura por clínicas de fisioterapia aumentasse. No topo da lista de patologias estão as tendinites no ombro e no cotovelo e as dores na coluna.
“Muitas pessoas procuraram os nossos serviços com dores associadas a más posturas. Foram muitos dias sedentários em casa a acumular esforço em zonas do corpo que tinham algum movimento e deixaram de ter”, explica a fisioterapeuta do Entroncamento, Cláudia Marchão. Jorge Oliveira, fisioterapeuta em Benavente, destaca ainda que para este aumento contribuiu o “receio de uma ida ao hospital ou centro de saúde” para tratar dores nas articulações.
Também as corridas e caminhadas, sem que no final fossem feitos alongamentos de forma correcta, imobilizaram muita gente, na opinião dos dois terapeutas. “Muitas das pessoas que víamos a fazer caminhadas na rua não tinham experiência e nem alongavam no fim. E é algo que após alguns meses tem as suas repercussões”, explica Cláudia Marchão.
Mas se houve “autodidactas, sem experiência, que acabaram por prejudicar as articulações”, o período de confinamento veio tirar muitas pessoas, sobretudo jovens, do “sedentarismo habitual” que faz com que a “sua coluna sofra desde muito cedo”, nota o fisioterapeuta observando que “há patologias severas na coluna a aparecer em faixas etárias cada vez mais baixas”.
Serviço público não consegue dar resposta
O serviço prestado pelos fisioterapeutas nos hospitais públicos é insuficiente, devido ao reduzido número destes especialistas no sector público. Aliás, há ainda quem desconheça existir esta especialidade quer nos centros de saúde, quer nos hospitais. “Se me perguntar se é insuficiente, a resposta é taxativamente que sim, muito insuficiente”, aponta Cláudia Marchão. Exemplo disso são as longas listas de espera para a especialidade e, por consequência, o tempo muito elevado de espera para iniciar um tratamento.
Por outro lado, a fisioterapeuta lamenta que o trabalho desenvolvido pelos colegas do público nem sempre tenha a qualidade que deveria ter, não por culpa dos profissionais, mas por não haver uma aposta em equipamentos mais avançados e, dessa forma, não terem as condições necessárias para trabalhar com o doente. A par disso, nota ainda Jorge Oliveira, no público estes profissionais “não dispõem do tempo adequado para tratar os seus pacientes”, um factor que considera fundamental para o acelerar da recuperação.
“Ainda é uma área da medicina de luxo”
Regra geral, os portugueses procuram os fisioterapeutas em estados já avançados das patologias. Muitos aguentam a dor até não conseguirem suportar mais. Se há uns bons anos o estilo de vida das pessoas, habituadas a trabalhar no campo arduamente, provocava doenças crónicas, principalmente na coluna, hoje o sedentarismo e o uso excessivo do computador são os principais culpados das doenças dos ossos e musculares.
E a “diferença não reside apenas nas causas, mas também na procura de tratamento”, diz Cláudia Marchão, acrescentando que esta deixou de ser uma especialidade desconhecida, mas que por ser suportada pelo sector privado, maioritariamente, muita gente não tem dinheiro para a procurar”, deixando agravar a dor. “Ainda é uma área da medicina que é considerada de luxo, à qual muitas pessoas querem, mas não podem recorrer por incapacidade financeira”, vinca Jorge Oliveira, lamentando que a solução que muitos adoptam passa pelo uso exclusivo de medicação que não faz mais do que camuflar a dor.
Jorge Oliveira é fisioterapeuta há 13 anos, actualmente na clínica Oliveira Saúde, em Benavente e na Clínica Central Samorense, em Samora Correia. Além da licenciatura em Fisioterapia tem especialidade em Osteopatia. Aposta preferencialmente na terapia manual para tratar os seus pacientes.
Cláudia Marchão integra e dirige a equipa de profissionais da clínica Reabilit’Arte, no Entroncamento, desde o início de 2020. Licenciou-se em Fisioterapia, na Escola Superior de Saúde de Alcoitão. Trabalhou em centros de dia e lares de idosos. Especializou-se nas áreas de Saúde da Mulher, Pilates Clínico e Osteopatia.