A Câmara de Constância autorizou a colocação, provisória, numa zona nobre da vila, de uma estátua evocativa de um cidadão do concelho que sofre de perturbações mentais causadas por traumas de guerra e abuso de drogas, conhecido por ‘Zé de Malpique’. A decisão gerou alguma supresa e reacções diversas. Há quem considere que se pode tratar de um atentado aos direitos do cidadão ali representado e que a câmara não devia aceitar a instalação da imagem na Praça Alexandre Herculano. Mas também há quem pense o contrário e veja a escultura como um tributo a uma geração marcada pela guerra colonial e como um alerta para o abandono a que foram votados muitos veteranos do Ultramar que sofrem de stress pós-traumático e outras mazelas insanáveis causadas pela guerra em África.
A escultura em gesso, bastante realista, é da autoria do artista local João Reis e está acompanhada por um texto de enquadramento assinado por um primo direito do homem evocado. O ‘Zé de Malpique’ é uma figura muito conhecida na zona, que passa os dias a vaguear a pé pelas estradas do concelho. O primo, Custódio Rodrigues, conta abreviadamente a história de vida “bem real (infelizmente) de uma figura castiça conhecida de muita gente pelos piores motivos”.
“Todas as terras têm o seu ícone do desvario, falando meigamente de alguém que, por vontade e propósito alheio, anda desligado da realidade mundana”, escreve Custódio Rodrigues, referindo que o caso do seu primo “é um espelho fiel da ausência da responsabilidade do Estado para tratar os seus cidadãos, especialmente quando tem influência directa na sua saúde ou na falta dela”.
Diz ainda que o primo “denota uma degradação psicológica cada vez mais latente” e “é o reflexo de uma sociedade moderna de consumo onde os valores se estão a perder de geração para geração, onde os portadores de deficiência são marginalizados quando deviam ser acarinhados e recuperados”. O ex-combatente recebe uma pequena reforma que, segundo o primo, nem dá para o seu sustento.
O presidente da Câmara de Constância, Sérgio Oliveira, confirma a O MIRANTE que a autarquia autorizou a instalação da escultura, colocada no dia 11 de Setembro, e que a mesma não custou absolutamente nada ao município. “Apenas autorizámos a sua colocação provisória, e a título expositivo, na Praça Alexandre Herculano”, refere o autarca, concluindo: “Saudamos os diversos trabalhos que o senhor João Reis tem feito e continuaremos a valorizá-lo”.