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CTT contratam serviço em vilas e aldeias a troco de quase nada 
CTT contratam serviço em vilas e aldeias a troco de quase nada

CTT contratam serviço em vilas e aldeias a troco de quase nada 

Correios funcionam em cafés, drogarias, mini-mercados associações e juntas de freguesia. Autarcas reconhecem que andam a financiar uma empresa privada prestando serviço quase de borla. CTT reagem à reportagem de O MIRANTE da edição anterior intimidando os empresários

Na maior parte das aldeias e vilas já não se vai ao correio como antigamente. Actualmente os serviços postais são assegurados por lojas, cafés, associações ou juntas de freguesia. Os pequenos empresários, dirigentes associativos e autarcas dizem que prestam o serviço a troco de quase nada mas que não o recusam para não tornarem a vida das pessoas, na sua maioria idosas, pior do que já é. Por vezes até são eles a ir pedir que seja aberto um posto dos correios nas suas instalações. Os CTT é que lucram. Não têm que ter instalações, nem contratar funcionários.

O posto dos CTT em Seiça, concelho de Ourém, funciona no edifício da junta de freguesia. É ali que os habitantes, na sua maioria idosos, vão levantar as reformas, entregar correspondência ou levantar correio registado. O presidente da autarquia, Custódio Henriques, diz que recebe diariamente entre duas a três dezenas de pessoas que procuram aqueles serviços. Para dar uma boa resposta aos pedidos, os funcionários dedicam cerca de três horas do seu trabalho aos Correios. Em contrapartida, a junta de freguesia recebe dos CTT um subsídio a rondar os 20 euros mensais.
“Estamos literalmente a financiar os CTT, uma empresa que é privada”, afirma. O autarca refere que, caso os serviços não fossem garantidos pela junta, os cerca de dois mil habitantes de Seiça tinham de percorrer oito quilómetros até Ourém, partindo de uma freguesia onde o serviço de transportes públicos é quase inexistente.
Na Parreira, freguesia do concelho da Chamusca, o cenário é idêntico. O presidente Bruno Oliveira garante a O MIRANTE que esta situação traz-lhe mais problemas do que vantagens, e que só não abdica do serviço para não prejudicar a população.
Para além de ter um funcionário a trabalhar quase exclusivamente para os Correios, ainda tem de suportar despesas relativas a alguns serviços. “Somos nós que compramos o papel que serve de recibo aos pagamentos do telefone, por exemplo. Já para não falar do custo de ter a máquina permanentemente ligada”, salienta.

“Temos prejuízo e ainda temos que levar com as reclamações”
Tal como em Seiça, também a Junta da Parreira recebe dos CTT um subsídio de 20 euros mensais. “Não chega para pagar um dia do trabalho que temos com eles”, sublinha. Na aldeia vizinha do Chouto, a 12 quilómetros de distância, o posto funciona num estabelecimento comercial particular, o Café Costa.
Em Minde, concelho de Alcanena, o posto funciona no antigo edifício dos CTT. A empresa quis fechá-lo há uns anos, mas a junta de freguesia garantiu a sua gestão. Neste momento, e à semelhança de quase todas as juntas de freguesia da região que trabalham com os CTT, os serviços são garantidos por alguns dos seus funcionários que trabalham quase a tempo inteiro para os Correios.
Em Lamarosa, onde fica a sede da União de Freguesias de Olaia e Paço, concelho de Torres Novas, o posto dos correios serve cerca de cinco mil pessoas que residem na freguesia e outras de localidades vizinhas que perderam os seus balcões.
Foi em 2007 que a transição foi feita, mas foi a partir de 2014, altura em que os CTT foram privatizados que, no entender do presidente da junta, Hélder Rodrigues, as coisas começaram a correr mal.
“Eles abusam e aproveitam-se. Nesta altura a junta está a ter prejuízo com esta situação. Entre 2007 e 2014 recebíamos cerca de 600 euros mas após a privatização o valor reduziu para 293 euros. Contratámos uma funcionária em 2007 e nem o salário da funcionária dá para pagar”, sublinha.
Mas as queixas não se ficam por ali. Trocas e atrasos na correspondência são uma realidade mas quem acaba por ter que ouvir é a junta. “Aquilo que mais acontece aqui são situações de reclamações das pessoas. Se há algum problema com os CTT é claro que é à junta que recorrem”.

Correios numa drogaria do Pego e na sede dos Dadores de Sangue do Tramagal
Quem estiver mais distraído e entrar no posto dos CTT no Pego, concelho de Abrantes, pode pensar que se enganou. Uma pequena placa no topo da porta de madeira da Vitripinturas indica que ali é o posto dos Correios. O serviço é prestado entre latas de tintas e material para pintura e drogaria.
O corredor não é largo e se há mais do que um cliente na loja tem que se esperar para a outra pessoa passar. Filipa Santos é a responsável do posto, que funciona de segunda a sexta-feira das 09h00 às 13h00. Alguns clientes reclamam pelo facto do posto não estar aberto o dia inteiro mas Filipa não consegue. Além da drogaria, trabalha também na recepção da clínica veterinária, no espaço contíguo.
Na sua loja recebe encomendas, faz pagamento de pensões de reforma e aceita registos. Apenas não envia dinheiro para o estrangeiro nem trata de apartados. Apesar do espaço dedicado ao posto dos Correios ser mínimo, Filipa Santos acredita que o trabalho não é prejudicado. Lamenta que o que recebe pela prestação do serviço às população seja pouco.
Também no concelho de Abrantes, o posto dos CTT do Tramagal, funciona há cerca de uma década no edifício da Associação Humanitária de Dadores de Sangue da vila. Lina Mendonça é a responsável da associação que trabalha todos os dias no posto dos CTT. Clientes não faltam e Lina Mendonça admite que os pouco mais de 200 euros que recebem dos Correios todos os meses, e uma percentagem pelos produtos que vendem, não compensa. “É muito trabalho e responsabilidade e quando se muda nunca se muda para melhor. Esta foi a melhor solução que a empresa encontrou para encerrar edifícios e deixar de contratar pessoal, situação que lhe ficava mais cara”, afirma.
No posto do Tramagal são pagos os vales de reformas e são entregues encomendas e cartas registadas com aviso de recepção. Quando os carteiros não as conseguem entregar, são levantadas no posto na sede dos dadores de sangue.

“Fui eu que tomei a iniciativa de pedir para explorar um posto dos correios”

Em Alcorochel, concelho de Torres Novas, o posto dos CTT existe desde 1979 na drogaria de Carlos Brites Moita. Já na altura a procura justificava ter ali, a 10 quilómetros da sede de concelho, um posto onde se pudesse entregar correspondência, levantar correio registado e pagar o telefone.
Na drogaria onde se podem adquirir desde produtos fitofarmacêuticos a ferragens, sementes e utensílios hortícolas, a procura pelos serviços dos CTT tem aumentado ao longo dos anos. Agora há mais movimento e tudo se paga no posto. A população, cada vez mais envelhecida, tem um multibanco a poucos metros da loja, mas por não saber utilizá-lo ou porque sempre aproveita para dar dois dedos de conversa prefere o atendimento personalizado de Carlos Moita.
O proprietário confessa que foi ele próprio que se deslocou aos serviços centrais, em Torres Novas, para fazer o pedido e poder instalar o pequeno posto de atendimento na sua loja já apinhada de materiais.
O objectivo, antes como agora, é poder servir as pessoas, para que não tenham que andar tantos quilómetros para fazer uma coisa simples como levantar correio registado, por exemplo. Os transportes públicos são escassos e uma ida aos Correios pode levar uma manhã ou uma tarde inteiras. Quando questionamos a quantia que recebe dos CTT para ter o posto em funcionamento, Carlos sorri e mostra a factura do último pagamento, a rondar a dezena de euros.
A pouco mais de quatro quilómetros, na Comenda, centro da freguesia vizinha de Casével, já no concelho de Santarém, o posto dos CTT está há cinco anos no Café Comendador. Situado perto da junta de freguesia, do jardim-de-infância e da escola básica, o movimento do estabelecimento está no auge pelas 09h00, ainda assim, entre croissants e cafés há sempre tempo para levantar uma encomenda ou fazer um pagamento.
“As pessoas já sabem que têm que ter paciência e esperar, mas podem beber um café enquanto o fazem”, diz-nos a proprietária Teresa Mendes. Tal como em Alcorochel, também ali existe um multibanco a curta distância, mas os serviços como pagamentos de facturas e carregamentos de telemóveis são os mais procurados. Teresa Mendes preferiu não referir o valor que recebe dos CTT pelo serviço, mas garante que mantém o posto por ser um complemento ao café e para “facilitar a vida” dos habitantes da freguesia que assim não têm que se deslocar a Vale de Figueira, a mais de 13 quilómetros, ou mesmo a Santarém, ao dobro da distância.

CTT intimidam agentes após reportagem de O MIRANTE

A direcção dos CTT telefonou aos agentes dos postos que funcionam em estabelecimentos comerciais da região a intimidá-los por terem criticado, em declarações a O MIRANTE, a forma como a empresa presta o serviço. A situação deixou os agentes dos postos de CTT assustados, uma vez que lhes foi dito que estavam a prejudicar a imagem dos Correios. Num dos casos foi mesmo insinuado que a situação podia ter consequências judiciais.
Os CTT acusaram os agentes de estarem a violar o contrato, o que os deixou com receio de virem a perder o posto, mas sobretudo de terem alguma acção judicial por causa das declarações. Isto apesar de o serviço prestado pelos agentes de postos ser mal pago pela empresa que explora o serviço público e que há quatro anos falha os indicadores de qualidade. A mais recente avaliação da Autoridade Nacional de Comunicações comprova que os CTT não cumpriram 23 dos 24 indicadores, sobressaindo os atrasos na distribuição de correspondência.
Recorde-se que na primeira parte desta reportagem, publicada na edição de 17 de Setembro, os agentes com que falámos apontaram falhas aos Correios. Estas falhas vão desde o atraso no pagamento de reformas a pensionistas, à quantia mensal que eles próprios recebem para manter este serviço a funcionar. O MIRANTE vai continuar a denunciar os contratos dos CTT a troco de quase nada. .

CTT contratam serviço em vilas e aldeias a troco de quase nada 

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