Filipe Barreira: “Os concursos públicos são um convite para trabalharmos para o prejuízo”
Filipe Barreira, 53 anos, proprietário da empresa de construção civil Mira & Barreira Construções, Lda.
Filho de pais agricultores, não lhes seguiu as pisadas e fez-se empreendedor. É da Chamusca, mestre a trabalhar a pedra e dono de uma empresa de construção civil, com 22 anos e uma dezena de trabalhadores. Diz que sem uma ponte nova sobre o Tejo não há desenvolvimento e sem um museu a identidade da vila esmorece e a história apaga-se. Não gosta de injustiças e tem o coração ao pé da boca.
Nunca sonhei ser rico nem presidente do que quer que fosse. Na política há o vício do poder, mas não pode valer tudo. Sempre que apanho um político na rua falo-lhe de tudo o que está a ser feito, do que não concordo e do que falta fazer.
As pessoas que levam a vida a enganar os outros tiram-me do sério. Geralmente penso em tudo o que digo, mas quando se trata de injustiças tenho o coração ao pé da boca.
Nasci na Chamusca a 100 metros do rio Tejo. Todos os dias vou à zona ribeirinha, mas já não encontro a beleza de outros tempos. O Porto das Mulheres, que em tempos foi uma praia excepcional, está ao abandono. Os chamusquenses são um povo que sabe receber e gosta de dar a conhecer o que a terra tem de bom, mas é cada vez menos o que podemos mostrar com orgulho.
Sou filho de pais agricultores. Tentei fazer uma horta mas faltou-me a paciência. Quando era criança o meu pai mandava-me regar as laranjeiras, mas eu queria era ir para a brincadeira, então despejava a água toda de uma vez.
Sou muito exigente comigo e não gosto de falhar. Todos os dias o trabalho vai comigo para casa.
Falta de tudo um pouco na construção civil em Portugal. Sou pedreiro e proprietário de uma empresa com 10 trabalhadores. Fazemos de tudo, desde o biscate à grande obra.
Os concursos públicos para obras têm sido raros e os que aparecem nem vale a pena pegar-lhes. Fazendo contas iríamos estar a trabalhar para o prejuízo. Talvez nalguns casos a ideia seja desculparem-se com a falta de empresas para não se fazer a obra. Quero acreditar que não.
Não sou homem de grandes ambições. Quero é ter saúde, as minhas mãos para trabalhar e cabeça para pensar.
A ponte da Chamusca é a morte dos seus empresários. Está a impedir o desenvolvimento e quem a governa não faz pressão. A Chamusca precisa urgentemente de uma nova travessia que funcione. Chego a estar uma hora para conseguir passar o rio Tejo para o lado da Golegã, onde faço 90 por cento do meu trabalho.
Não basta permitir que as empresas se fixem nos territórios, é preciso exigir que ajudem a desenvolvê-lo. A Chamusca tem um aterro de resíduos perigosos, mas onde está a mão rija a exigir contrapartidas a favor da terra e da população?
Uma terra que não sabe preservar a sua história perde a sua identidade e os seus valores. A Chamusca deve ser a única sede de concelho que não tem um museu. É uma terra com um historial agrícola riquíssimo, mas peca por não saber contar a sua história.
O mercado da Chamusca era a festa do sábado de manhã. Transformava-se numa feira entre roupa, calçado, convívio, sem esquecer o homem das cassetes. Também era onde muitos arranjavam trabalho. Sentavam-se nos degraus da igreja à espera que algum encarregado os empregasse.
Dói-me ver o mercado da Chamusca fechado há quatro anos. E dói-me que tenham transformado o jardim municipal, um dos mais belos que já vi, num jardim de calçada, com um parque de estacionamento feito em cima de uma mina e que qualquer dia vai abaixo.
A minha mãe foi o pilar da minha vida. Dizia-me que para poder entrar em qualquer lugar sem baixar a cabeça a minha consciência tinha de estar tranquila. E está. Prefiro ficar prejudicado do que enganar alguém. Sou casado e tenho uma filha e um filho, ambos maiores de idade.
Na juventude apanhava tomate à caixa. Queria ganhar o meu dinheiro. Como apanhava muito, os patrões lá acharam que ia enriquecer e passei exclusivamente a servir água às mulheres e a ajudar as que ficavam para trás.
Prefiro um convívio caseiro com amigos a ir comer a um bom restaurante. Na hora de sentar à mesa sou um bom garfo. Desde que não me sirvam favas.