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Henrique, menino de Santarém: um caso de comunicação de crise em saúde!
Isabel de Santiago*

Henrique, menino de Santarém: um caso de comunicação de crise em saúde!

O gémeo Henrique que morreu no dia de alta, dentro do serviço do hospital de Santarém, entrou na urgência com queixas decorrentes da doença de que padecia, mas que não “mata”, mas moía, e muito.

Isabel de Santiago*

O amor e a vida do Henrique não podem morrer com o seu corpo; ele queria ir de férias com a sua mãe e a sua gémea mana Leonor. O funeral foi recusado pelo Ministério de Ana Mendes Godinho, porque não era contribuinte. Pudera: o hospital deixou-o morrer nas suas instalações aos pés da mãe. E pior: mandaram o corpo para autópsia, quando o que estava em causa: era um diagnóstico eficaz e salvar vidas. Mas os recursos acabaram, e a propaganda continua, continua, cansativamente e amuadamente, continua... Obrigada pobre Hospital de Santarém!

Na vida, entre seres humanos, o amor - verdadeiro - classifica-se como um amor incondicional, de entrega total. De partilha do mal e do bem. Da pobreza e da riqueza. Da sabedoria e da ignorância. E isso faz seres humanos grandes. Melhores pessoas. Ímpares seres humanos. E não humanoides, automatizados, sem discernir bem e mal, capacidade de incapacidade, raiva e serenidade. Amuos contra paciência. Silêncio contra barulhos. Mas há outros tipos de amores, mais interesseiros: como o amor por e (só) ao dinheiro; o amor ao físico e fútil material, o amor à política no belo sentido (porque existe o mau: uso da política e doentes políticas, como as de saúde que assolam cidades de interior. O caso do Hospital de Santarém, mas já lá chegaremos. E finalmente: o amor por coisa nenhuma. Este é injustificável, porque estará associado a casos de desordens comportamentais, classificadas pela bíblia da saúde mental DSM V, ou seja Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais.

Para compreender um amor incondicional é preciso ter sentido o peso de carregar um ou dois seres humanos no ventre. Dar-lhes a mama da sua mãe, para se alimentarem, passar noites a assistir - sem dormir - aos movimentos da sua respiração. O seu cheiro, ah como me lembro do cheiro das minhas crianças, hoje adultos. Esse amor é selvagem, irracional, pele com pele, carne de carne. Isto a ciência nunca conseguirá definir, por mais amor amizade que tenha pelo pai da pediatria em Portugal, Prof. doutor João Gomes Pedro e o fundador dos touch points com o Professor americano Brazelton.

Dizia Sócrates: “não sou ateniense, mas cidadão do mundo”. Também eu. E passei por muitos cantos e recantos do mundo ao serviço da investigação e da promoção da comunicação em saúde pública, de que destaco África lusófona, onde não chega medicina de excelência, apesar de estarmos no século XXI, e eu ser do século passado e morrer certamente neste. E nessas passagens de experiências de vida, incluo Santarém.

Eu morrer, é justo. O Henrique morrer é inaceitável, incompreensível, injustificável. O Henrique é filho de uma mulher bela. Humilde, serena, doce. E tenho por ela um amor incondicional.

Por isso, gostava que a presidente do conselho de administração do Hospital de Santarém (recentemente empossada pela ministra Temido) – Ana Marília Barata Infante e o seu vogal executivo com funções de diretor clínico – Paulo José Sintra de Jesus Silva me justificassem como morre - jazendo em queda livre - à frente de sua mãe, um menino desportista, de 13 anos, com 1,90m de altura, que deixa a sua gémea Leonor (com síndroma de asperger).

O gémeo Henrique que morreu no dia de alta, dentro do serviço do Hospital de Santarém, entrou na urgência com queixas decorrentes da doença de que padecia , mas que não “mata”, mas moía, e muito. E com mais uma dor: anormal num miúdo, desportista, e isso deveria ter despertado o interesse de quem o viu. Esteve a duro soro, medicado para as dores. Morreu aos pés de sua mãe, a Sónia. A minha Sônia!!!! E exige-se atuação da DGS, do IGAS.

A pandemia da SARS-CoV2 não pode continuar como desculpa rota para a péssima gestão de recursos: Senhora D. Ana Marília: e se fosse o seu filho? É que a ciência pode definir fisiologicamente a origem da lágrima. Mas a ciência não serve para descrever a dor destas lágrimas. Afinal, parafraseando Aristóteles: “A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras”. Peço isso à mãe do Henrique. E a si, a coragem e sabedoria para inquirir até às últimas consequências. Porque o nosso menino escalabitano não volta, mas não partiu em vão.

Mensagem para a ministra Ana Mendes Godinho: como é possível ser negado a comparticipação do Estado para o pagamento de um funeral de um menino de 13 anos, porque não é contribuinte? Mas pertence ao Estado, na pessoa do Hospital de Santarém que não o deixou viver e ser contribuinte. O Estado é democrático, certo. Defende direitos liberdades e garantias no texto da constituição, certo. O artigo 64ª da CRP assim o defende: “acesso universal”, mas ele é pobre. E pode morrer. Não havia necessidade disso. A ciência não sabe definir uma lágrima, mas portugueses como eu, sentem a dor das lágrimas desta mãe. Com uma certeza: esta culpa não vai parar e morrer aqui. Vai ter as consequências que merece. O Henrique queria ir de férias com a sua mãe e a sua gémea mana Leonor.

Obrigada pobre Hospital de Santarém.

Direção Geral de Saúde? Graça Freitas, médica? Ministra da Saúde? Marta Temido? Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, Inspetor Geral de Atividades em Saúde? António Carlos Caeiro Carapeto é licenciado em Direito, o que me diz deste Estado de Injustiça? Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo – Luís Pisco? Médico?

*Especialista em Comunicação em saúde; Professora Convidada e Investigadora em Comunicação em Saúde; Instituto de Medicina Preventiva e Saúde Pública, Faculdade de Medicina da ULisboa.

Henrique, menino de Santarém: um caso de comunicação de crise em saúde!

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