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“Na Câmara de Abrantes trabalha-se muito para a imagem e pouco para mudar a realidade”

“Na Câmara de Abrantes trabalha-se muito para a imagem e pouco para mudar a realidade”

Margarida Togtema lidera a bancada do PSD na Assembleia Municipal de Abrantes apesar de não ser filiada nesse partido.

Há meses foi convidada para ser cabeça de lista à Câmara de Abrantes nas próximas autárquicas, mas não aceitou as condições impostas pelo PSD. Num discurso crítico e frontal, diz que o PSD de Abrantes precisa de se afirmar como alternativa credível e diz que a gestão socialista do município tem estado mais preocupada com a imagem do que com o futuro do concelho.

Que balanço faz da gestão PS na Câmara de Abrantes? Tem sido uma gestão muito má. Abrantes é um concelho em perda há décadas. Em perda de população, perda de serviços…
Esse é um mal que afecta muitos outros concelhos da região. Sim mas curiosamente há concelhos vizinhos que estão em crescimento, como Ourém ou Torres Novas. Na nossa região há concelhos que crescem, provavelmente porque vão buscar população a outros, mas se isso acontece é porque oferecem melhores condições. Abrantes nunca foi capaz de se pôr entre os concelhos atractivos e, pelo contrário, é um concelho que afasta, por inúmeras razões.
O que não deixa de ser estranho num concelho bem situado, com boas vias de comunicação e razoavelmente bem equipado de serviços públicos. Abrantes está estrategicamente colocada em termos geográficos. Abrantes tem dois rios, o Zêzere e o Tejo, o território tem uma diversidade fantástica e tinha tudo para ser um concelho em crescimento, que oferecesse boas condições de vida. E não é porque nunca houve uma estratégia de desenvolvimento. Temos medidas avulsas que foram sendo tomadas ao serviço de interesses, sabe-se lá quais, mas nunca houve um plano estratégico de desenvolvimento sério que definisse onde se pretendia chegar e em que investir.
O anterior presidente da câmara, Nelson de Carvalho, pretendeu deixar uma marca de modernidade com projectos como o açude insuflável, o cemitério à americana ou o campo de basebol. Revê-se nessa estratégia? Não, de todo! Ainda se fizesse um estádio de basebol que viesse a ser um ex-libris para a cidade… Agora, essa modalidade não tem tradição nenhuma em Abrantes e é muito difícil fazer com que uma determinada modalidade que não está enraizada passe a ser um ex-libris. E temos um açude que não se percebe para que serve…
Não vê virtudes em projectos como o do Aquapolis, nomeadamente na valorização da frente ribeirinha de Abrantes? Acho importantíssima a valorização dos espaços ribeirinhos mas não gosto da forma como isso foi feito em Abrantes. Gosto imenso do que foi feito em Vila Nova da Barquinha ou em Tancos, onde há uma zona ribeirinha que tem a ver com o sítio onde nós estamos. Em Abrantes acho que não tem nada a ver. Acho o restaurante simpático, gosto de lá ir, é muito agradável ter o Tejo ali, mas depois olho à volta e aquilo é inóspito. Não é atractivo, é frio.
Com tantos defeitos que aponta, por que razão os abrantinos continuam a dar sucessivas maiorias ao PS? Os abrantinos fazem realmente isso mas se formos olhar para os números da abstenção percebemos que não é a maioria dos abrantinos. Metade da população não vota, se calhar porque não está satisfeita com a governação. O problema é que não há alternativas…
E o que acha de Maria do Céu Albuquerque como presidente da Câmara de Abrantes? Não vou falar da pessoa mas da presidente. Acho que a presidente Maria do Céu Albuquerque vem na linha do que é a imagem da governação abrantina com a qual não concordo. É o show-off, são as inaugurações sucessivas de tudo e mais alguma coisa, é o viver da aparência. Trabalha-se muito para a imagem e pouco para mudar de facto a realidade. Acho que Abrantes tem uma governação um pouco terceiro-mundista.
Em que sentido? Quando se precisa de estar constantemente na fotografia ou quando se faz uma governação assente no aparecer, quando se fazem cerimónias para inaugurar a relocalização de uma escultura numa rotunda acho que isso é completamente terceiro-mundista. O presidente da câmara não tem que estar sempre na fotografia. Isso não é de quem está verdadeiramente preocupado em mudar o seu território, é de quem está preocupado em aparecer. Não gosto deste tipo de fachada que, no fundo, tem a ver com o tipo de governação. Não vemos nada a acontecer em Abrantes.
Vive em Abrantes e trabalha em Santarém. Que diferenças mais substanciais nota entre as duas cidades? Trabalho em Santarém há mais de vinte anos e acabo por não usufruir muito da cidade. Vou directa à escola, passo lá o dia e vou-me embora. Gosto muito de Abrantes e de Santarém, são cidades com grande potencial, pelo seu legado histórico, pela localização que têm - é um privilégio esta proximidade ao Tejo - mas acho que carecem de outro tipo de energia, de intervenção. Acho que são poucos os governantes no nosso país que têm uma visão projectada para o futuro de uma forma equilibrada.
Entrou na política em 2013. Este mandato chegou para ver que a política não é a sua praia? Por ora não. É um desafio de que estou a gostar. Gosto muito desta coisa da política. Naqueles anos quentes a seguir ao 25 de Abril, a minha irmã pertencia à JSD e eu, ainda muito nova, ia com ela colar cartazes na rua. A política fascina-me como actividade de serviço, de procura do bem comum.
Acha que dava uma boa presidente de câmara? Não sei, não sei… (risos).

A advogada cedeu a carreira à professora

Margarida Togtema nasceu em 28 de Abril de 1969 em Lisboa. É casada e tem um casal de filhos.
É licenciada em Direito pela Universidade Católica Portuguesa e em Psicologia e Pedagogia da Música pela Universidade da Sorbonne - Paris IV. É mestre em Ciências da Educação pela Universidade de Lisboa e doutoranda em Psicologia e Pedagogia da Música na Universidade da Sorbonne. Tem o título de professora especialista na área da Música e dá aulas há mais de 20 anos na Escola Superior de Educação de Santarém.
Entre 1976 e 1986 estudou música no Instituto Gregoriano de Lisboa. É diplomada em Pedagogia Musical Ward, pelo Conservatório de Tomar. Frequentou cursos livres, de aperfeiçoamento, no Instituto de Música e Música Litúrgica de Paris. Dirige o coro e a escola de música da Sociedade Artística Tramagalense, bem como o coro do Instituto Politécnico de Santarém.
Entre 1994 e 1998 exerceu advocacia, como profissional liberal. Tem uma vasta actividade no âmbito do voluntariado, colaborando com várias instituições e projectos, quer no concelho de Abrantes quer em Santarém. Reside em Cabeça Gorda, no concelho de Abrantes e, em termos autárquicos, integra também a Assembleia de Freguesia de Aldeia do Mato e Souto.

“Há pessoas no PSD de Abrantes que parece que têm a função de provocar o desaire”

Foi convidada para ser a cabeça de lista do PSD à Câmara de Abrantes e não aceitou. Porquê? Não aceitei porque houve uma condição que me foi imposta: o presidente da concelhia teria que ser o número dois. Não aceitei e ainda tornei a condição um bocadinho mais exigente ao dizer que não aceitava na lista nem o presidente nem os vice-presidentes da concelhia.
Por que razão? Sendo eles os dirigentes da estrutura concelhia do partido não faz sentido que integrem as listas às eleições autárquicas? Para mim não. Tem a ver com a minha perspectiva. Não tem a ver com questões pessoais mas sim por entender que os dirigentes de um partido, seja em termos locais ou distritais, têm como tal determinadas funções e responsabilidades. Não faz sentido para mim que os cargos políticos sejam misturados com os cargos de governação a nível local.
Mas isso é uma tradição no nosso sistema político. Admito que seja, mas acho que há uma promiscuidade prejudicial quer ao desempenho na posição de autarca quer à ligação que deve ser feita pelo partido em termos locais. Deve haver colaboração, cooperação, mas são posições diferentes em contextos diferentes. Misturá-las, em meu entender, perverte um pouco as finalidades quer de uma quer da outra.
Esse é um assunto encerrado para si? É um assunto encerrado.
Não pensa concorrer por outras forças políticas ou até noutro lugar nas listas do PSD? Não é de todo um objectivo meu. Demorei muitos meses a aceitar admitir essa questão de me candidatar à câmara. Tenho uma vida profissional que me enche, que me realiza, na qual me sinto muito bem e mesmo gostando de desafios neste momento não tinha condições porque estou envolvida em projectos em que tenho responsabilidades. Teria que sacrificar esses projectos para aceitar outro desafio.
Mesmo assim admitiu essa hipótese... Não estava de todo motivada, mas devo dizer que acabei por aceitar discutir ou negociar esta questão movida por razões de cidadania. Não basta criticar. É preciso apresentar alternativas e mostrar outras formas de fazer. Além disso há outra questão importante, que é a da independência que tenho afirmado ao longo deste mandato e que acho que poderia ficar comprometida com essa situação. Para mim o que vale são os interesses das pessoas, os interesses colectivos em prejuízo dos interesses partidários. Aceitar o presidente do partido para número dois podia ser lido como havendo ali algum controlo.
O que acha do candidato escolhido pelo PSD para cabeça de lista à Câmara de Abrantes, o arquitecto António Castelbranco? Não tenho nada a dizer sobre esse assunto, por uma razão muito simples: não conheço o arquitecto Castelbranco o suficiente para fazer qualquer juízo de valor acerca da sua pessoa. É uma pessoa cordial, com quem estive algumas vezes. O que mantenho é que não concordo com os processos anteriores e com o que se passou antes dessa escolha.
A história repete-se e mais uma vez o PSD de Abrantes surge esfrangalhado antes de umas eleições autárquicas. Como se explica esta tendência? Explica-se porque há pessoas no PSD de Abrantes que parece que têm a função, justamente, de provocar o desaire. De fazer desabar tudo quando as coisas deviam estar a construir-se. Tive oportunidade de responder ao dr. Armando Fernandes, que para mim é um dos grandes responsáveis pelo que se passa, pelas cisões. São inúmeras as pessoas que saíram ou que se afastaram do PSD por causa das atitudes, dos comentários, daquilo que é dito pelo dr. Armando Fernandes, que sinceramente não percebo o que é que está a fazer no PSD. Nem percebo por que razão o PSD quer um militante como o dr. Armando Fernandes, sendo reconhecido por toda a gente que é dos grandes responsáveis por destruir todos os projectos autárquicos.
Com todas estas polémicas, o PS tem a vida facilitada mais uma vez. Pois, acho que sim. Acho particularmente grave esta situação que se repete com o PSD, porque, justamente por causa disso, não existe uma alternativa séria e credível em Abrantes. O que tem feito com que o Partido Socialista esteja a dar cabo do concelho.
A oposição que existe também não parece muito assertiva e aguerrida. A única vereadora do PSD na Câmara de Abrantes, Elza Vitório, parece algo branda. Não se vêem muitas posições contestatárias à governação PS se compararmos, por exemplo, com o mandato anterior. Acho que isso tem a ver com a maneira de ser das pessoas. A dra. Elza Vitório tem feito oposição mas não é uma pessoa de confrontos verbais, tem um estilo diferente dos vereadores anteriores. Ela não deixa de ser firme, mas fá-lo de outra forma. São várias as declarações de voto que tem apresentado opondo-se a determinadas decisões. Tem marcado a sua posição.
Os vereadores do PSD no anterior mandato para além de serem, entre aspas, mais aguerridos eram também mais eficazes a passar a sua mensagem. As posições do PSD de Abrantes raramente chegam à opinião pública. Aí há uma culpa do próprio PSD. Fui uma das pessoas que mais chamou a atenção para a necessidade de haver, em termos de partido, uma postura mais interveniente, mas os meios de comunicação também não facilitam…
Em que medida? Os meios de comunicação, de uma forma geral, não passam a nossa mensagem. Tive situações de grande conflito na assembleia municipal e nunca vi nada disso espelhado na comunicação social.
Continua a liderar a bancada do PSD na Assembleia Municipal de Abrantes, apesar de não ser filiada no partido. Acha que continua a ter legitimidade para tal, tendo em conta o que se passou com o partido cujas listas integrou? Quem me escolheu foram os eleitores e é isso que legitima a minha posição enquanto eleita local. E quem me elegeu líder da bancada do PSD foram os meus pares. A nossa eleição foi anterior a esta comissão política. O dr. Armando Fernandes é que defendeu que me devia ser retirada a confiança política e que eu devia demitir-me. Mas eu não tenho que me demitir pois não foi ele nem o PSD que me deram posse. Se quiserem tirar-me a confiança política estão à vontade, mas exijo que expliquem as razões por que a vão tirar. Porque se houve coisa que nunca aconteceu foi qualquer falta de lealdade para com o PSD.

“Na Câmara de Abrantes trabalha-se muito para a imagem e pouco para mudar a realidade”

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