Bruno Simões saiu da Póvoa de Santa Iria para singrar no mundo da animação
Se viu filmes como A Idade do Gelo, 007 Skyfall ou Harry Potter é provável que tenha visto o trabalho de Bruno Simões e o seu nome nas fichas técnicas.
Realizador de animação, apaixonou-se cedo por uma arte que o levou a viver em Londres, Nova Iorque e Barcelona, onde está actualmente e fundou o seu próprio estúdio, o Kimchi. A sua primeira curta-metragem estreia no final de Março no Festival Monstra de Lisboa.
O concelho de Vila Franca de Xira é uma incubadora de talentos mas é pena que não tenha um cinema nem um cineclube que promova com regularidade a exibição de filmes e que, dessa forma, fomente uma maior paixão nos mais novos pela Sétima Arte. A convicção é de Bruno Simões, realizador de animação que nasceu em Vila Franca de Xira, viveu na Póvoa de Santa Iria e hoje lidera em Barcelona o estúdio de animação Kimchi, que o próprio fundou.
Na conversa via Zoom com O MIRANTE, Bruno Simões fala da sua terra, do trabalho e dos sonhos para o futuro. “Fico orgulhoso por ver o concelho ter tanta gente com reconhecimento nacional e internacional mas triste por ver que entre a Póvoa e Vila Franca de Xira não existe um único cinema nem um cineclube. Isso é uma grande falha que temos e precisamos de ultrapassar”, confessa a O MIRANTE.
Bruno Simões recorda os tempos em que integrava uma banda de garagem e como o concurso de bandas promovido pelo município ajudava a dar impulso à criatividade. “Era bastante inclusivo e dinamizava muita gente”, diz o realizador que vem a Portugal várias vezes por ano, ainda tem família na Póvoa de Santa Iria e diz sempre com orgulho o nome da sua cidade por onde passa.
Não é homem de fotografias apesar de estar ligado a um ramo que vive da imagem. Bruno Simões tem 42 anos, dois filhos e vive em Barcelona. Diz ter tido uma infância calma e feliz na Póvoa, onde vivia no Bairro da Bolonha, e da janela conseguia ver um olival, antes da freguesia ter sido invadida por prédios. “É uma terra pacata, simpática e onde gosto sempre muito de voltar”, garante.
Começou por estudar design gráfico na Escola de Tecnologias Inovação e Criação (ETIC). O seu primeiro emprego foi numa gráfica de pré-impressão em Miraflores. Esteve lá dois anos antes de entrar na faculdade. Foi estudar design multimédia nas Caldas da Rainha e foi aí que começou a lidar com animação 3D pela qual se haveria de apaixonar, indo a Barcelona completar os estudos nesse ramo. “Sempre gostei de cinema e animação mas até então não tinha sido uma opção de profissão”, explica.
Em mundo de feiticeiros
Bruno Simões rumou a Londres para procurar trabalho na área, numa cidade onde, tal como Barcelona, a animação é bastante forte. Entrou na Moving Picture Company (MPC), uma multinacional especializada em efeitos especiais, animação e design, tendo trabalhado em dez filmes, incluindo os quatro finais da saga Harry Potter (de “A Ordem da Fénix” até à segunda parte de “Os Talismãs da Morte”). Na cantina chegou a cruzar-se com os actores. “Os meus amigos ficaram muito entusiasmados. Como podíamos fazer visitas guiadas ao estúdio, cheguei a levar alguns a visitar os locais de filmagem”, confessa.
O realizador esteve envolvido também na produção do épico de ficção científica de Ridley Scott “Prometheus”, uma das aventuras de James Bond – “Skyfall” – e outros filmes como “X-Men First Class” ou “World War Z”. Fazia os chamados previews ou maquetes. Depois de cinco anos em Londres mudou-se para Nova Iorque, onde esteve três anos nos Blue Sky Studios envolvido em projectos como A Idade do Gelo, Rio ou Snoopy & Charlie Brown. Bruno Simões acabaria por regressar a Barcelona pouco tempo antes da Disney comprar a Fox. O que se revelou uma decisão acertada, já que os Blue Sky Studios acabariam por ser encerrados.
Casas mais baratas que em Lisboa
Bruno Simões diz-se apaixonado por Barcelona e pelo papel que Espanha teve na animação dos anos 80 e 90. “Em Portugal vejo uma grande dependência do carro. Aqui as pessoas vão buscar os filhos a pé e há um convívio diferente que não vejo em Portugal. A habitação em Lisboa está mais cara que aqui e os nossos ordenados mínimos são mais elevados”, afirma. Admite um dia voltar a Portugal mas para já os seus planos são ficar com a família.
Não é uma pessoa irritável mas tira-o do sério quem cataloga um filme de mau só por ser de determinado género. “Criticar e chamar mau a um filme à partida só porque é de super-heróis, por exemplo, irrita-me”, diz o realizador que confessa ter pouco tempo para ver filmes agora que tem filhos pequenos. “Tenho visto muitos filmes de animação com eles e ultimamente os da Guerra das Estrelas”, afirma.
A Boneca de Kafka
Bruno Simões é fundador do Studio Kimchi, que lida sobretudo com encomendas de publicidade e institucionais. Exemplos disso são os anúncios de Natal da Popota para Portugal. Depois de três anos em produção, o estúdio vai finalmente dar a conhecer ao mundo a primeira curta metragem de Bruno Simões, chamada “A Boneca de Kafka”, escrita quando estava em Londres, em 2009, e que está na selecção oficial do Monstra – Festival de Animação de Lisboa onde será estreada no final de Março. “A Boneca de Kafka vai correr vários festivais e espero que tenha muito sucesso. Gostava imenso de exibi-lo em Vila Franca de Xira e no Grémio Povoense”, confessa.
O realizador gosta de todos os tipos de animação e no filme usou uma mistura de 2D e 3D em estilo cartoonístico. Se pudesse gostava de passar mais tempo com Yuri Norstein, animador russo que está a fazer uma longa-metragem desde o final dos anos 70 e que considera ser um dos maiores nomes da animação mundial.