“Poesia e organização podem salvar o mundo”: Obra de Sidónio Muralha foi recordada em Santarém
A Obra Poética de Sidónio Muralha foi apresentada no passado sábado na Casa do Brasil, em Santarém, com apresentação da viúva do escritor e de Jaqueline Conte, uma das curadoras do livro.
A participação de José Raimundo Noras no livro que reúne a Obra poética completa de Sidónio Muralha foi pretexto para o lançamento em Santarém do livro editado pela Busílis & Trinta Por Uma Linha. O evento teve lugar no dia 30 de Setembro, na Casa do Brasil, e contou com a participação da viúva do escritor e presidente da Fundação Sidónio Muralha.
Sidónio Muralha ( 1920-1982) é uma figura marcante do neorrealismo e um intelectual que viveu exilado e, mesmo depois do 25 de Abril, optou por viver no Brasil onde constituiu família. Helen Anne Butler Muralha, com quem Sidónio Muralha casou em 1978, é actualmente presidente da fundação com o nome do seu marido e, embora a sua idade avançada, exerceu medicina até ao inico da pandemia, embora agora se dedique a tempo inteiro a outras actividades. Foi ela que por videoconferência explicou a importância da Obra de Sidónio Muralha, seu companheiro de uma parte da vida.
“A poesia preencheu, até inundou a casa, tanto no modo físico, através de livros, como se reproduzindo em frações de papel, em guardanapos, até de pano, palitos de caipirinha. Sidónio tinha grande facilidade em marcar qualquer acontecimento, importante ou corriqueiro, com inspiração poética, realçou Helen Butler que reconheceu ainda que o marido “escrevia não como rotina, mas por impulso” e que no Brasil era mais conhecido por escrever literatura infanto juvenil. Sidónio Muralha vivia e trabalhava no Congo Belga quando viajou para o Brasil. Helen Bluter conta que “todo o montante recebido na rescisão do trabalho como diretor geral da Unilever no Congo Belga por ocasião de sua independência, foi investido na criação da primeira editora voltada exclusivamente para o público infantil, chamada Giroflé, que tinha um amplo projeto pedagógico e envolveu muitas pessoas ligadas à cultura como Fanny Abramovich, Paulo Emílio Salles Gomes, Maria Bonomi, Aldemir Martins, Carlos Drummond de Andrade, Vinicius de Moraes tendo publicado a primeira edição da obra “Ou isto ou aquilo” de Cecília Meireles. Vivendo em época de ditadura salazarista e de grandes diferenças sociais, Sidónio tomou o caminho do Neorrealismo português, o que marcou com intensidade sua obra, tanto em prosa como na poesia”.
“Escrever é participar. É uma forma de alertar as consciências, tentar construir um mundo mais decente e mais limpo. Calar é ser conivente”. “Nasci homem antes de ser poeta. Minha poesia nunca trairá os homens, meus velhos companheiros”, citou Helen Bluter, acrescentado que Sidónio Muralha dizia que “poesia e organização podem salvar o mundo”. Para realçar o seu empenho na liderança da Fundação e a sua entrega à memoria da Obra do marido, Helen Butler recordou que ele lhe legou a responsabilidade de ela ser “a vida em sua morte”.
Jaqueline Conte diz que pandemia prejudicou centenário de Sidónio Muralha
Jaqueline Conte, jornalista, pesquisadora e escritora, contou que “antes das comemorações dos 100 anos de Sidónio Muralha, que caiu justamente na pandemia (julho de 2020), tínhamos (e temos) um grupo composto por cerca de 15 a 20 participantes, de Portugal e do Brasil, que pensava no que fazer para marcar a data. E a melhor forma de perpetuar a memória de um escritor é manter sua obra viva. Então, fizemos uma proposta de edição da poesia reunida de Sidónio. A poesia adulta, porque as infantis (ainda bem) continuam a ser publicadas tanto aqui quanto no Brasil”. Jaqueline contou ainda que aceitou fazer a curadoria do livro em conjunto com a Helen Anne Butler Muralha e Priscila Angélica Santos. A base para o livro foram os poemas já publicados e os entetanto recuperados, poemas para letras de música, cantados pela Amália Rodrigues; poemas escritos em homenagem a pessoas da família, como o “Valéria, Valéria”, feito para a neta, embora tenha reconhecido que nem tudo entrou, “fizemos uma seleção apenas dos que achamos esteticamente mais interessantes para publicação”, oportunidade para agradecer o trabalho de José Raimundo Noras que colaborou pesquisando e reunindo tudo o que havia sido publicado nos jornais portugueses”,
Por fim Jaqueline Conte lembrou que Sidónio Muralha foi um escritor muito produtivo, que trabalhou com vários gêneros literários, dos contos infantis aos relatos de viagem, poesia infantil e adulta. É autor de pelo menos 35 livros, sendo 15 infantis, em poesia e em prosa, para além do seu trabalho como editor.
Roseli Boschilia, José Raimundo Noras e o editor do livro também falaram do autor e da sua ligação à Obra reunida que ainda não tem edição assegurada no Brasil.