Em Alvega foram os mais novos a não deixar morrer a banda filarmónica
Corajosos, decididos e conscientes da importância da associação para a dinâmica cultural de Alvega, um grupo de jovens músicos impediu que a Banda Filarmónica Alveguense caísse num vazio directivo. Para ajudar, alguns pais estão a ter aulas de música para poderem vir a reforçar a formação, reduzida a 15 elementos.
Por esta região e por este país fora existem centenas de bandas filarmónicas, das quais fazem parte diferentes gerações de músicos. Mas esta, a Banda Filarmónica Alveguense, é distinta a vários níveis, a começar pelo facto de o elemento mais velho ter 32 anos. Falamos de Filipa Dias, que embora viva e trabalhe em Abrantes não perde um ensaio da banda ao sábado à tarde. Quando a clarinetista ingressou no grupo, na altura uma espécie de jóia da coroa da cultura local de Alvega, no concelho de Abrantes, integravam-no mais de 40 elementos que, lamentavelmente, foram saindo, uns porque foram estudar para fora, outros porque não voltaram depois da paragem forçada pela pandemia.
Ao jovem núcleo de músicos que se manteve firme, além de assegurar os serviços da banda, coube um desafio ainda maior: formar uma lista e apresentar-se à direcção da associação que, com a demissão do anterior presidente, caía num vazio directivo. “Não podíamos deixar a banda morrer. Sabíamos que à partida não ia aparecer nenhuma lista, porque embora a população nos apoie, sabe-se que dirigir uma associação é trabalhoso, requer tempo, dedicação e ninguém quer ter essa responsabilidade”, refere a O MIRANTE o músico e presidente da direcção empossada em Agosto de 2023, João Pereira, sublinhando que a média de idades dos que o acompanham anda pelos 27 anos.
Há quase uma década na banda, o músico de 25 anos fala dos diferentes desafios que têm enfrentado, desde a recente demissão do maestro, ao furto da carrinha que utilizavam para transportar o material e alguns músicos, passando pela necessidade de renovação de instrumentos musicais que já não se apresentam nas devidas condições. Mas o maior deles todos, afirma, é sem dúvida o conseguir recuperar a união de outros tempos. “Antes da pandemia - que provocou a saída de muitos elementos - éramos muito ligados e é essa união que existia entre todos, e que ao longo dos anos se foi perdendo, que queremos recuperar. Acreditamos que se as pessoas se voltarem a sentir confortáveis aqui, e a criar a rotina dos ensaios, temos tudo para ter de volta essa união”.
Aposta forte no ensino da música
Não há dúvidas que em qualquer banda filarmónica a formação dos seus músicos aumenta significativamente a qualidade da música tocada. Como também ninguém duvida que se houver quem ensine é meio caminho andado para a banda crescer em número de elementos. Foi por isso mesmo que a direcção não vacilou em investir na escola de música ao contratarem uma professora. “Haver uma escola de música associada à banda é vital porque de outra forma é difícil formar músicos para a integrarem. Isto acontece principalmente quando falamos de bandas de meios mais pequenos como vilas e aldeias”, salienta a professora de formação e educação musical, Ana Raquel Pires. Até porque, nestes meios, acrescenta João Pereira, as filarmónicas são por norma o motor da dinâmica cultural e o único garante de que os mais novos têm acesso ao ensino da música. E, neste caso, de forma gratuita.
Estes são alguns dos motivos pelos quais a jovem direcção considera que as bandas filarmónicas deviam ser vistas não apenas como um grupo que se junta para tocar instrumentos e passar o tempo, mas como uma instituição que eleva a cultura numa comunidade. “Era bom que existissem beneméritos, empresários que nos apoiassem com actividades correntes como fardamento ou instrumentos. Mas já se sabe que para associações culturais como esta não há para dar como acontece no futebol. As empresas não são puxadas a isso, não há quem faça essa consciencialização”, lamenta o músico e primeiro vogal, Pedro Ferreira.
Além das quotas (8,40 euros anuais), cuja cobrança a nova direcção ainda está a tentar regularizar, a Banda Filarmónica Alveguense subsiste com um apoio anual do programa do município de Abrantes, o FinAbrantes, na ordem dos 12 mil euros. Além das despesas correntes ligadas aos músicos, instrumentos e à sede, a banda tem despesas com o Encontro de Bandas que querem que passe a realizar-se anualmente a 20 de Junho, dia do aniversário da associação fundada em 1994, e, este ano, a realização da festa anual da freguesia em Honra de Nossa Senhora dos Remédios, que se vai realizar a 23, 24 e 25 de Agosto.
Nesta banda são os pais que seguem o exemplo dos filhos
Se a tendência é filhos de pais músicos aprenderem também a tocar um instrumento, na Banda Filarmónica Alveguense começou a acontecer o oposto. Com a perda de dezenas de elementos, os pais dos que continuaram a dar música a Alvega sentiram quase uma obrigação de se juntarem ao grupo. É o caso de Paula Mingote e Teresa Ferreira, de 56 e 46 anos, duas das dez alunas da escola de música que estão a aprender as bases da formação musical na esperança de um dia integrarem a formação da banda.
“Já acompanhávamos os nossos filhos desde que eram pequenos nas saídas da banda e na organização dos eventos. Mas, agora, como tivemos uma grande recaída, decidimos entrar. E porque não, não é? Os nossos filhos até nos dizem que já devíamos ter tomado esta decisão há mais tempo”, refere Teresa, mãe de Pedro Ferreira, que tem 21 anos e está na banda desde os seis. Paula Mingote, que tem as suas três filhas e o filho na banda concorda e espera, desta vez, conseguir concluir os quatro níveis da formação musical e entrar para a banda. “Já cá tinha andado há 15 anos e agora voltei com o objectivo de aprender saxofone e um dia tocar com os meus filhos”, diz.