Cultura | 08-09-2024 18:00

O artista de Salvaterra de Magos que vai a Lisboa tatuar pastéis de nata

O artista de Salvaterra de Magos que vai a Lisboa tatuar pastéis de nata
Pedro Almeida começou a tatuar aos 25 anos e hoje colabora com vários estúdios

Pedro Almeida, tatuador natural de Salvaterra de Magos, começou já tarde na arte da tatuagem, mas a paixão superou as dificuldades iniciais. De aprendiz local a experiências internacionais ou a tatuar turistas em Lisboa, Pedro conta as histórias, desafios e momentos marcantes de uma carreira que, para ele, nunca é monótona.

Pedro Gaspar Almeida, natural de Salvaterra de Magos e residente no Porto Alto, Samora Correia, é tatuador há sete anos e meio, tendo começado a sua jornada em 2017. Casado e pai de uma menina de quase dois anos, descreve-se como alguém caseiro, que gosta de ver filmes, séries e jogar. “Desde que fui pai, o tempo fica mais escasso”, confessa.
Fez todo o percurso escolar em Salvaterra de Magos, onde estudou Artes até ao 12.º ano. Depois, começou a trabalhar nos empregos que surgiam. “Trabalhei no Continente, nas obras, em pintura e numa fábrica de reparação de paletes”, lembra. Desde cedo, habituou-se a ajudar o pai durante o Verão. “A primeira vez que reprovei, o meu pai fazia-me o Verão de praia, que é como quem diz ir com ele para as obras”, conta, explicando que, mesmo quando passava de ano, pedia para trabalhar para ganhar algum dinheiro para si.
Hoje com 33 anos, começou a tatuar aos 25 anos e, desde então, dedica-se de corpo e alma a esta arte. “Há muito tempo que queria tatuar, mas não era fácil de começar porque é preciso que alguém esteja disposto a ensinar. Não há uma escola de tatuadores e a maior parte dos tatuadores, na altura em que comecei, também não queriam passar o conhecimento porque ficaria a saber o mesmo que eles”, recorda.
Em 2017, Pedro encontrou a oportunidade que precisava quando se cruzou com Luís Gomes, tatuador do estúdio em que trabalha, hoje, em Samora Correia. “Falei com ele, disse-lhe que gostava de tatuar, mostrei-lhe alguns desenhos e tatuagens que já tinha feito em pele sintética e couratos [de porco]. Ficou por ali, mas depois encontrei-o em Salvaterra e ele disse-me que a aprendiz dele tinha desistido e que tinha ficado com uma vaga. Foi assim que comecei”, conta.
Na altura, Pedro trabalhava na Sugal e saía do trabalho às 17h00 para ir para a loja de tatuagens até fechar. “Sentia que não estava a aprender nada, estava cerca de uma hora na loja e, normalmente, o Luís já estava a tatuar quando eu chegava. Houve um dia em que cheguei à fábrica e despedi-me. Vim para a loja em full time”, relata. “Ele até me chamou de maluco porque ia estar ainda um tempo a aprender, sem ganhar dinheiro”, diz.
A primeira tatuagem que Pedro Almeida fez não tem uma história especial: foi uma letra chinesa que correspondia ao nome da pessoa. No entanto, houve outra tatuagem que marcou o seu percurso. “Um dente de leão, que é simples, mas foi um grande passo na tatuagem. Foi quando deixei de fazer apenas linhas para passar a fazer tatuagens com sombras, coisas mais delicadas e outros detalhes. Foi a que me marcou mais em termos de evolução”, revela.
A pessoa mais velha que tatuou tinha 78 anos e era a sua primeira tatuagem: “Veio fazer um terço, à volta do pulso, a cair para a mão”. Entre as várias experiências, Pedro Almeida confessa que, às vezes, sente-se “tatuador e meio psicólogo” porque as pessoas sentem-se seguras para falar de tudo durante o processo.

As experiências em Inglaterra e Lisboa
Em 2021, começou a explorar novas experiências fora do país, concretamente em Inglaterra. “Comecei a ter aquela vontade de fazer guest spots fora do país, experimentar outras coisas, conhecer pessoas novas e ter outras experiências. A primeira vez fui para Colchester, num estúdio muito conhecido em Inglaterra, o Monumental. Foi incrível”, conta.
Pedro Almeida também se estabeleceu regularmente num estúdio temático de Harry Potter no Chiado, em Lisboa, onde trabalha uma semana por mês. “Quando começaram a anunciar que iam abrir o estúdio no Chiado, em Novembro de 2023, comecei a enviar portfolio a pedir guest spots. Em Janeiro deste ano fui lá pela primeira vez, eles gostaram de mim e eu deles, ao ponto de se tornar um trabalho regular”, explica. “É na Rua do Carmo, junto aos Armazéns do Chiado, uma zona muito turística, portanto faço muitas tatuagens de azulejos e sardinhas”, acrescenta. Os turistas, segundo o próprio, costumam chegar com ideias baseadas nas visitas guiadas que fazem pela cidade. “Por norma, são azulejos, sardinhas, o eléctrico também é uma coisa que se tatua muito, assim como os pastéis de nata”.
Sobre a evolução do sector, Pedro Almeida refere que tanto as técnicas como os materiais mudaram significativamente. “As primeiras máquinas de tatuagens eram de bobinas, que faziam um barulho incrível, eram pesadas, existia um cabo e um pedal para fazer a máquina trabalhar. Havia uma máquina para fazer a linha, uma máquina para sombrear e outra para pintar. Hoje em dia é uma caneta na mão, com uma bateria em que só é preciso trocar a ponta, que é a agulha”, explica. Também as tintas evoluíram. “Os pigmentos hoje em dia são muito melhores. As tintas são vegan, foi uma evolução enorme”, destaca. Para o tatuador, a parte menos positiva desta evolução é a facilidade com que, por vezes, qualquer pessoa se consegue iniciar sem ter atenção a determinadas questões e recomendações.
Pedro Gaspar Almeida começou na Old Cat Tattoo Shop e, desde então, tem crescido na profissão. Em breve, vai abraçar um novo projecto, no qual continuará a dar vida à sua paixão pela tatuagem. “Decididamente, com a tatuagem é a primeira vez em que não tenho um dia que pense: ‘ora bolas, lá vou eu outra vez para o trabalho”, conclui.

O cliente que desmaiou e um jogo do galo marcado na pele

Ao longo dos anos, Pedro Almeida acumulou várias histórias curiosas. “A tatuagem mais estranha ou engraçada que fiz foi um Batman como se estivesse esborrachado numa nádega. Foi decidido na última hora com uma aposta de amigos à mistura”, conta. Também fez um jogo do galo numa ocasião: “O cliente tinha um espacinho e não sabia o que fazer. Pegou então numa caneta, jogou ao galo com a namorada e foi essa a tatuagem”, relembra.
Mas um dos momentos mais inesperados no seu percurso como tatuador foi o primeiro desmaio de um cliente. O incidente aconteceu antes mesmo de se começar a tatuar, quando o cliente, nervoso e ansioso, desmaiou subitamente, caiu e acabou por partir a cabeça. A situação envolveu uma ambulância e uma ida ao hospital, mas tudo não passou de um grande susto, com ferimentos superficiais. Embora o cliente o tenha voltado a contactar para o tatuar, Pedro Almeida recomendou que, talvez, não fosse a melhor ideia.

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