Transformar vidas e promover conexões através do teatro em Santarém
Na Universidade da Terceira Idade de Santarém, o teatro transforma vidas, promove conexões e prova que nunca é tarde para brilhar sob os holofotes.
No coração de Santarém, a Turma de Teatro da Universidade da Terceira Idade (UTIS) é um exemplo de como a arte pode transformar vidas em qualquer idade. Criada em 2004, a turma nasceu da visão de Eliseu Raimundo, que foi seguido por professores dedicados, como Fernanda Narciso, Hélder Santos e Carlos Oliveira. Actualmente, sob a orientação do professor Carlos Doles, o grupo de 18 alunos continua a encantar e a trazer histórias envolventes e um espírito de companheirismo único. Carlos Doles descreve o teatro como uma ferramenta de conexão e descoberta. Segundo o professor, o objectivo principal da turma não é formar actores profissionais, mas sim criar um espaço onde os alunos se possam expressar, rir e partilhar as suas vivências.
Longe de seguir um modelo rígido ou pré-estabelecido, Carlos Doles opta por começar o ano com um “quadro em branco”. “Iniciamos com exercícios simples para explorar as dinâmicas do grupo, identificar talentos e entender as energias de cada aluno”, explica. O ponto de partida é a improvisação. Os alunos são incentivados a partilhar ideias, experiências e temas que os toquem pessoalmente. Este ano, o grupo embarcou na criação de uma comédia, abordando com leveza e humor as situações e desafios do envelhecimento. “Rir de si mesmos é libertador, e isso cria uma conexão muito especial entre eles e o público. Abraçam essa proposta com entusiasmo porque se reconhecem nas histórias”, afirma. Carlos Doles pretende desenvolver comédias que desafiem estereótipos. “O perfil sénior mudou, e queremos reflectir isso. Vamos brincar com os desafios e mostrar o lado positivo dessa fase da vida”, adianta. Carlos Doles descreve como os alunos, inicialmente tímidos ou inseguros, ganham uma nova postura quando pisam o palco. “Ver alguém que, no início, hesitava em improvisar uma frase, agora actuar com confiança em frente a uma plateia, é emocionante”, vinca.
Sobre um dos momentos mais marcantes para a turma de teatro, o professor destaca a criação de uma peça em celebração dos 50 anos do 25 de Abril. Para os alunos, não era apenas um espectáculo, era uma oportunidade de reviver e partilhar as memórias de um dos períodos mais significativos da história portuguesa. A proposta de trazer as suas experiências pessoais para o palco gerou uma conexão poderosa entre os alunos, o público e a própria narrativa histórica.
Um novo capítulo de vida
Desde os 17 anos que Ana Paula Miranda já sentia o apelo do teatro, ao participar nos recitais escolares que lhe despertaram a paixão pela arte de representar. Porém, os tempos eram outros, e os seus sonhos de ser actriz foram deixados de lado. Foi na UTIS que Ana Paula encontrou a oportunidade de reviver aquele desejo antigo. “Decidi entrar no teatro aqui, e desde então nunca mais quis sair. Este espaço tornou-se parte de mim. Quando, por algum motivo, não posso vir, sinto-me triste, sinto que devia estar aqui”, afirma. No teatro, Ana Paula redescobriu não só a sua paixão, mas também um novo sentido para a vida. “Cada peça é uma experiência transformadora. Antes de entrar em palco, sinto aquele friozinho na barriga, as mãos tremem. Mas, assim que estou lá, parece que me transformo. Saio do palco uma pessoa diferente, mais leve, mais feliz”, explica.
Para Margarida Loureiro, o teatro foi uma verdadeira mudança de vida. Após ficar viúva em 2009, Margarida mergulhou numa fase de isolamento que parecia não ter fim. “Entreguei-me à solidão, estava sem rumo, sem vontade de fazer nada”, recorda. A convite de amigos, decidiu experimentar uma aula de teatro e a experiência foi surpreendente. “Quando estou em cena, deixo de ser a Margarida, encarno outra personagem e ganho uma nova vida”, garante. A aluna também destaca a importância de estar num ambiente com diferentes gerações.
Ambas as alunas destacam a magia de estar no palco e de sentir a resposta do público. O nervosismo na pré-apresentação transforma-se em confiança e alegria, e as alunas admitem que quando sentem que o público está a aderir, ficam em êxtase. “É a nossa recompensa, saber que tocámos as pessoas, e que não há limite para a idade quando se trata de nos divertirmos e sermos verdadeiros em palco”, sublinham.