Tânia Grazinas e Otília Marques dão vida à oficina de cestaria e latoaria de Tomar
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A nova oficina de cestaria e latoaria de Tomar tem como artesãs residentes Tânia Grazinas e Otília Marques. O espaço pretende valorizar e salvaguardar as artes tradicionais. O MIRANTE visitou a oficina e conversou com a funcionária da banca que investiu na cestaria e com a latoeira que é continuadora do negócio familiar.
Preservar e promover as artes tradicionais locais é o objectivo da nova oficina de cestaria e latoaria localizada no Convento de São Francisco, em Tomar. O espaço, inaugurado a 18 de Janeiro, pretende não ser apenas um local de produção, mas também um centro de formação e partilha. Nesta fase inicial, as artesãs residentes são Tânia Grazinas e Otília Marques, cesteira e latoeira, respectivamente. O MIRANTE visitou a oficina e conversou com as artesãs sobre o trabalho que têm realizado nesta área, mas também sobre os seus percursos de vida.
Tânia Grazinas, 43 anos, residente em Tomar, é cesteira desde 2022, mas trabalha na banca e é licenciada em História. A prática na arte da cestaria surgiu no âmbito de uma formação que realizou nesse ano, desenvolvida pela Câmara de Tomar. Conta com muitas horas de formação junto do mestre José Henriques, de Ferreira do Zêzere. “Tem-me acompanhado neste percurso, se não fosse ele se calhar também não estava aqui, tive a sorte de ser acolhida pelo mestre”, refere.
Recorda que, antes de 2022, o único contacto que tinha tido com a arte da cestaria foi em criança, na aldeia onde morava na freguesia de Carregueiros. “Havia uma cesteira que morava na aldeia, lembro-me que houve uma abordagem, mas a senhora achou que eu não tinha jeito nenhum para a coisa e nunca mais pensei no assunto. Mas sempre gostei muito de trabalhos manuais”, confessa. Tânia Grazinas trabalha há 17 anos na área financeira, na banca de investimento, numa empresa localizada em Lisboa. Vai em média duas vezes por semana à capital e nos restantes dias faz teletrabalho em casa.
Embora trabalhe na área financeira, a sua formação superior é em História. “Ainda fiz um estágio no Convento de Cristo, mas que não passou disso e depois tive que procurar trabalho, numa área que não era a minha”, refere. Tânia Grazinas teve um esgotamento em 2017 devido ao trabalho, que a deixou parada durante um ano. “Nos primeiros anos de trabalho tinha que ir todos os dias para Lisboa, tinha uma criança pequena para cuidar, só tinha responsabilidades, não tinha tempo para mais nada”, recorda.
Com uma vida agitada, entre Tomar e Lisboa, e um trabalho que a obriga a estar oito horas por dia em frente a um computador, Tânia Grazinas sentia a necessidade de ter outra ocupação. “A cestaria surgiu dessa necessidade, é algo que me interessa verdadeiramente, que me motiva, que me interessa em termos de conhecimento, mas também de prática”, sublinha. A artesã diz estar entusiasmada com a criação da nova oficina em Tomar, que é também um novo local de trabalho para si. Na oficina, tem dedicado o seu tempo a fazer cestos, empalhamentos de garrafas e garrafões, peças decorativas e contemporâneas. Além da cestaria, Tânia Grazinas gosta de ler, ouvir música, viajar e de “mexer” na terra, ter contacto com as plantas.
Aprendeu a arte da latoaria com o pai
Otília Marques, 63 anos, também residente em Tomar, diz que trabalha com latoaria desde sempre. Cresceu a ver o seu pai e o irmão a trabalharem na arte. O pai tinha uma oficina em Tomar, onde Otília Marques passava grande parte do seu tempo em criança. Conta que muito do que aprendeu ao nível da latoaria foi através da observação. “O meu pai não me ensinou directamente por causa de eu ser mulher. Na altura dizia-se que as mulheres não podiam trabalhar com latoaria. Eu sabia fazer as coisas porque via, absorvi imensas coisas do que ele ia fazendo”, explica. Após adoecer, o pai fechou a oficina e decidiu abrir uma em casa, que perdura até hoje. “Temos um espaço grande em casa, que agora é demasiado grande porque actualmente estou sozinha nesta área. Os meus pais e o meu irmão já faleceram”, conta.
Para além de funcionar como oficina, o espaço localizado na casa de Otília Marques é também um museu de latoaria, integrando o roteiro turístico da cidade de Tomar, mais uma ideia do seu pai. Ao longo da sua vida, a artífice teve outras experiências profissionais, trabalhou num café e numa peixaria, mas nunca deixou de fazer latoaria, que hoje é a sua única ocupação.
Otília Marques gosta de aplicar a história e a cultura de Tomar naquilo que vai fazendo em latoaria, nomeadamente bijuteria em latão, cobre ou folha de Flandres. Também faz as coroas que encimam os tabuleiros da emblemática Festa dos Tabuleiros. É ainda a única pessoa na cidade que faz as panelas das fatias de Tomar, doce conventual da cidade. “Já há muito tempo que não faço porque é muito minucioso. O meu pai dizia que quem sabia fazer a panela tinha a licenciatura em latoaria”, recorda.
Há três anos, Otília Marques passou por uma fase mais complicada, quando o irmão morreu repentinamente, vítima de uma embolia pulmonar. “Estive de luto durante muito tempo, foi um choque, ainda hoje penso nisso”, refere. Apesar da tristeza que sentia, nunca deixou de fazer latoaria. “Já tinha tido uma depressão antes e quem me ajudou foi o meu irmão, ele dizia para eu ir para a oficina para me distrair e a verdade é que me ajudou. Lembrei-me disso no luto e dediquei-me muito à latoaria”, conta.
Hoje, Otília Marques diz que se sente muito feliz e que o trabalho que faz é uma forma de preservar a tradição da família. “Quando estou na oficina, sinto que eles estão comigo”, afirma, acrescentando que adora trabalhar a ouvir música e que gosta de ir à biblioteca requisitar livros de História, sendo a cultura antiga outra grande paixão.
Oficina aberta ao público
A nova oficina de cestaria e latoaria de Tomar, localizada no Convento de São Francisco, está aberta ao público de terça a sexta-feira das 10h00 às 13h00 e aos sábados das 10h00 às 13h00 e das 14h00 às 17h00. A inauguração contou com a presença do presidente da câmara, Hugo Cristóvão, e da vice-presidente com o pelouro da cultura, Filipa Fernandes, entre outras personalidades. Para o futuro está previsto a realização de aulas e workshops no local, assim como a integração de outros artesãos.