VASP comemora 50 anos e o editor da Guerra & Paz, Manuel S. Fonseca, faz o elogio da distribuição do livro
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Administração da VASP reuniu cerca de 200 convidados para comemorar os 50 anos da empresa. Grupo BEL comprou a distribuidora à Cofina e à impresa depois de entrar no capital com a compra do grupo do JN, DN e TSF.
A VASP comemorou meio século num encontro realizado no final da tarde da passada quinta-feira, dia 19 de Fevereiro, no Centro Cultural de Belém. Marco Galinha, do grupo BEL, actual administrador da VASP, falou do futuro da empresa e do caminho de sucesso que deseja para a grande empresa distribuidora de publicações. Sérgio Sousa Pinto fez uma conferência sobre o tema, confrontando o mundo das publicações digitais com o das revistas e jornais e livros impressos, falando do papel importante da distribuição num registo sempre irônico e bem disposto, sem deixar de ser realista. O ministro Pedro Duarte marcou presença para deixar o recado de que o Governo vai lançar um concurso internacional na área da distribuição e que os apoios à imprensa são mesmo para levar a sério a curto prazo.
No painel onde se discutiu a importância da distribuição, o destaque vai todo para a intervenção do editor da Guerra & Paz, Manuel S. Fonseca, cujo texto reproduzimos na íntegra por ser um testemunho a que nenhum editor e distribuidor pode ficar indiferente.
Recorde-se que Marco Galinha, do Grupo Bel, entrou na distribuidora depois da compra da Global Media tendo ficado entretanto com a totalidade do capital da empresa depois da venda do capital detido pela Cofina e pela Impresa de Paulo Fernandes e Francisco Pinto Balsemão, respectivamente.
Foi a VASP que nos salvou
Peço desculpa por introduzir aqui uma nota mais dramática e sentimental, mas a verdade é que eu, enquanto editor da Guerra e Paz, conheci a VASP numa situação traumática. A Guerra e Paz tinha um distribuidor que, de repente, entrou numa situação de insolvência. Fazendo breve uma história de grande aflição direi que, tal como a Senhora de Fátima apareceu aos pastorinhos, assim a VASP apareceu à Guerra e Paz. E a verdade é que a VASP nos salvou.
Foi em Fevereiro/Março de 2012. A VASP não distribuía livros. Há duas pessoas a quem ficarei grato para toda a vida, o Paulo Proença e o Fernando Guedes da Silva. Foram eles que aceitaram o meu repto e convenceram os abençoados accionistas a entrar nesse mundo maravilhoso e turbulento que é o livro. E a Guerra e Paz, que estava exangue, como um náufrago a estrebuchar na praia, recebeu respiração boca a boca da VASP e voltou à vida. Com a VASP, e aproveitando o potencial da extraordinária logística que cobria todo o país, os nossos livros foram mais longe. Não só voltámos a ser distribuídos em toda a rede livreira nacional, como, através do canal imprensa, chegámos onde antes não chegávamos, em muitos casos até, chegámos onde ninguém estava já a chegar.
O livro é o oxigénio e o sangue do conhecimento, do pensamento e da riqueza emocional de qualquer povo.
Com a VASP, de Pinhel, a minha terra, até Odemira, reactivou-se a venda de livros em pontos de venda de imprensa, que já tinham tido livros, mas que tinham abandonado os livros, por impossibilidade de a distribuição livreira tradicional rentabilizar a sua acção. Essa simbiose entre a rede de distribuição da imprensa e a distribuição livreira, foi, por assim dizer, uma espécie de multiplicação dos pães. E foi assim que o náufrago que era a Guerra e Paz não só voltou a respirar, como cresceu.
Com a VASP, com a equipa da VASP a que faço aqui uma vénia, diversificámos as nossas receitas, multiplicámos pontos de venda. Terminámos o ano de 2024 com um crescimento de 28% em relação a 2023 – e aqui só estou a falar do sell-out na rede livreira que é coberta pela auditoria da GfK. E fechámos, agora, o mês de Janeiro, com um crescimento de 34%, comparado com o período homónimo.A minha história com a VASP é, portanto, hoje, no dia em que se festejam 50 anos de distribuição, uma história feliz. E logo a seguir à Guerra e Paz vieram outros editores. Hoje, a VASP é uma peça central da distribuição do livro em Portugal e tem, por isso, uma grande responsabilidade. O livro é o oxigénio e o sangue do conhecimento, do pensamento e da riqueza emocional de qualquer povo. A VASP é a rede de veias e artérias que leva o livro a todo o país. Ao casar-se com o livro, a VASP fez mais do que um negócio, criou e tem um compromisso com o desenvolvimento cultural e artístico de Portugal. E também por ser o livro um bem essencial, a VASP Livro tem um compromisso com o desenvolvimento económico de Portugal. Meu caro Rui Moura, meu caro Marco Galinha, desejo-vos, a vós e à VASP que continuem a levar a bom porto, nos próximos 50 anos, este belo transatlântico.
Os países mais desenvolvidos lêem todos 7, 8 10 vezes mais do que Portugal. É por isso que são países desenvolvidos. Uma das causas contemporâneas do atraso de Portugal prende-se com o débil índice de leitura dos portugueses. Ora, a VASP está exactamente no olho do furacão. Duas das mais poderosas armas para alavancar o desenvolvimento da leitura são os jornais e os livros.
Encanita-me que alguém tente pôr o livro e o jornal como concorrentes. Para mim, são dois irmãos gémeos, e a VASP tem na sua barriga esses dois irmãos gémeos. Estamos, neste momento, no mundo, numa batalha – num verdadeiro teatro de guerra – contra a desinformação, contra as «fake news», contra os delírios das teorias da conspiração.
Essa batalha não é apenas uma batalha pelo conhecimento, uma batalha pelo enriquecimento emocional e cultural, é também uma batalha pelo triunfo da razão, da verdade e da ciência, ou seja, uma batalha pelo desenvolvimento e pela democracia.
Os jornais e os livros e, portanto, a VASP, que os distribui, são os protagonistas maiores dessa batalha. O que hoje estamos a celebrar aqui são os 50 anos da VASP, mas esta tem também de ser uma celebração de futuro. Ora, sem jornais e sem livros o futuro da democracia fica em perigo.
Faço um parêntesis para lembrar um dos grandes, para não dizer esmagadores, êxitos mundiais, que começou na venda de livros, a Amazon.
Ora esse gigante só é gigante porque subiu para os ombros de uma empresa de distribuição, a Ingram, que lhe ofereceu toda a logística. Sem os armazéns da Ingram, camiões, comboios, aviões – e depois com um agilíssimo print-on-demand – o arranque da Amazon não teria sido o que foi. Nessa modesta e reservada Ingram reside o maior segredo, o motor do devastador êxito da Amazon. Não houve um canto da América em que se pudessem vender livros, onde a Ingram não fosse.
À imagem da Ingram, é preciso preservar e fortalecer a VASP porque preservar e fortalecer a VASP é contribuir para o futuro da democracia, é combater uma das causas actuais do atraso português.
Os jornais e os livros têm de chegar em Portugal nem que seja a um eremita escondido na Arrábida ou no Gerês. Se a leitura é um desígnio nacional, então a existência, o fortalecimento, a modernização da VASP é tema que interessa a todos os portugueses, por maioria de razão aos governos de Portugal.
A questão da distribuição e, portanto, a questão VASP, a meu ver, é importante demais para ser tratada apenas como um caso particular. Há uma dimensão económica e política, que a converte numa questão que diz respeito aos eleitores, aos partidos ao poder político.
Desejo, por isso, ao Presidente Marco Galinha, em cujas mãos está agora a VASP, o maior êxito para os próximos 50 anos.
Não é só a Guerra e Paz, a quem a VASP apareceu como a Senhora de Fátima, que precisa da VASP. Os jornais, os livros, os leitores, a democracia precisam dessa gente e dessa logística que trabalha, tantas vezes com modéstia e sem alardes, nos armazéns da VASP. Que venham mais 50 anos.