Alenquer candidata Pintar e Cantar dos Reis a Património Cultural Imaterial da UNESCO

O ritual ancestral do Pintar e Cantar dos Reis, praticado em Alenquer, poderá vir a integrar a lista de Património Cultural Imaterial da UNESCO. A tradição, já classificada a nível nacional, cruza arte, devoção e identidade local. A candidatura foi formalizada em Março, após um extenso trabalho de investigação e recolha.
A Câmara de Alenquer entregou, em Março, o dossiê que formaliza a candidatura do evento Pintar e Cantar dos Reis a Património Cultural Imaterial da UNESCO. A tradição é Património Imaterial Nacional desde Julho de 2021 e candidata-se agora para tentar obter reconhecimento internacional.
O primeiro passo foi dado com a classificação de interesse municipal a 22 de Dezembro de 2016.
Outrora um ritual iniciático importante para os jovens rapazes do concelho, hoje o Pintar e Cantar dos Reis estende-se a ambos os sexos e a várias faixas etárias. Como há mais de 100 anos, os reiseiros (termo que define os praticantes da tradição) encontram-se de forma espontânea em várias localidades para abraçar e pintar uma simbologia única. Inscrições como “BF” (Boas Festas), “B.R.” (Bons Reis), “V.R.” (Viva a República ou Viva os Reis) ou “BRM” (Bons Reis Magos) surgem nos muros, fachadas e entradas das casas, em que predominam os tons de vermelho almagre e azul anilina, juntamente com o desenho de vasos com ramos floridos, corações ou a “Estrela do Oriente”, por exemplo. Os desenhos, elaborados com tinta e um pincel, podem representar diferentes profissões, composições do agregado familiar, estados civis, serviços, actividades recreativas, religiosas ou comerciais. Ao mesmo tempo, um grupo, liderado por um apontador, surge mais atrás para cantar em uníssono versos inspirados em episódios bíblicos, como a viagem dos Três Reis Magos.
Tradição está viva mas deve ser reconhecida fora do país
A vereadora com o pelouro da Cultura, Cláudia Luís, afirma que o município quer garantir a continuidade da tradição para as gerações vindouras e preservar memórias. “A candidatura garante visibilidade nacional e internacional, elevando o prestígio e o reconhecimento da tradição, sublinhando a sua importância histórica, social e artística — não apenas para Alenquer, mas para a humanidade”, ressalvou.
Nos últimos anos, a tradição, que passa de geração em geração, fortaleceu-se com o acréscimo de pessoas a nela participarem, mas também com o ressurgimento de uma manifestação que tinha perdido fulgor em alguns lugares do concelho, onde antigamente se cumpria o desígnio de pintar e cantar os Reis. Em 2025, pelo menos Abrigada, Bairro, Cabanas de Chão, Cabanas de Torres, Casal Monteiro, Casais do Chorão, Catém, Espiçandeira, Labrugeira, Mata, Olhalvo, Ota, Paúla, Penafirme da Mata e Pocariça saíram à rua numa das madrugadas mais gélidas do ano, para colocar em prática uma tradição que cruza a festa, a linguagem escrita, os ritos, os cantares e os cultos.