Cultura | 23-09-2025 21:00

Roteiro literário no Freixial evoca uma das obras maiores de Alves Redol

Roteiro literário no Freixial evoca uma das obras maiores de Alves Redol
Da esquerda para a direita: Vasco Touguinha (vereador da CM de Loures), Constantino Cara-Linda, António Mota Redol e Hélio Santos (presidente da Junta de Freguesia de Bucelas) - foto O MIRANTE

Câmara de Loures e Junta de Freguesia de Bucelas lançaram um roteiro literário no Freixial em torno da emblemática obra de Alves Redol “Constantino Guardador de Vacas e de Sonhos”. No último domingo foi lançado o projecto com a presença de duas dezenas de pessoas da comunidade e do próprio Constantino Cara-Linda.

Percorrer as ruas do Freixial, Bucelas, concelho de Loures, é seguir os passos de Alves Redol e de Constantino Cara-Linda, que o escritor usou em 1962 para cristalizar a infância rural portuguesa no romance “Constantino Guardador de Vacas e de Sonhos”. Durante quatro anos, o município de Loures, em parceria com a Junta de Freguesia de Bucelas, prepararam um roteiro literário que agora viu a luz do dia e que foi apresentado na manhã de domingo, 14 de Setembro, no Freixial, com a presença de duas dezenas de pessoas.
Os visitantes são convidados a descarregar uma aplicação no telemóvel em que, através do reconhecimento da localização, são audioguiados durante a caminhada através de sete lugares icónicos da aldeia, directamente ligados com o livro de Alves Redol. Percorre-se as ruas do Freixial, com paragens no Largo do Chafariz, na ponte grande, nas ermidas da Quinta da Madame, as escadinhas da antiga escola primária, as margens do rio Trancão - onde no tempo de D. João V subiam em jangadas as pedras e os sinos para construir o Convento de Mafra - a taberna do Valdemiro e, claro, a Rua Alves Redol, onde se encontra a casa onde o escritor viveu, que está hoje com a fachada recuperada mas desabitada e fechada. O projecto conseguiu mobilizar o próprio Constantino Cara-Linda, homem conhecido por ser de poucas palavras, para estar presente na cerimónia.
Para António Mota Redol, filho de Alves Redol, reencontrar Constantino Cara-Linda foi como reencontrar um irmão. “O meu pai fez um filho e adoptou outro aqui”, brincou, para depois recordar um episódio em que a Escola Secundária Alves Redol, em Vila Franca de Xira, pediu a Constantino para ir falar aos alunos. “Tiveram de pedir autorização à empresa onde ele trabalhava; e lá ficaram muito admirados ao saber que ele tinha tanta importância”, partilhou. O filho do escritor não deixou de notar a importância do livro - que já vai na 23ª edição - e não deixou de apelar a outros autarcas da região para que sigam o exemplo da Câmara de Loures. “Os escritores são aqueles que daqui a 100 ou 200 anos continuam a ser falados, ao contrário dos presidentes e dos vereadores”, rematou.
Já Hélio Santos, presidente da Junta de Bucelas, afirmou que o roteiro enobrece a aldeia e a freguesia e é importante para trazer pessoas ao Freixial. E Vasco Touguinha, vereador do município, disse que agora o desafio é trazer pessoas à aldeia e procurar parceiros que queiram, com o município, dinamizar a rota e dar-lhe maior visibilidade.

“Estar sempre a ser procurado por causa do livro já cansa”
Constantino Cara-Linda, uma das poucas pessoas no país que se pode gabar de ainda ser um protagonista vivo de um romance, admite que a idade já pesa e que a fama que Alves Redol lhe trouxe já o cansa. Numa conversa com O MIRANTE, à margem da inauguração do roteiro literário na sua aldeia, admite que já vai sendo tempo de ter paz e sossego na sua vida. “Estar sempre a ser procurado por causa do livro já cansa. Sou uma pessoa que gosta de estar sossegado, no meu canto, venho para casa e gosto de fazer o que quero e me apetece. Por isso muitas vezes custa-me ter de estar a agendar coisas com as pessoas. Tento sempre fugir a isto”, admite.
Apesar de tudo, continua a dizer que foi um privilégio ter contactado com o escritor neo-realista, de quem fugia de manhã levantando-se de madrugada, como um dia contou numa entrevista ao nosso jornal. Constantino Cara-Linda, que sonhava construir um barco para navegar até Lisboa e acabou a trabalhar numa fábrica de helicópteros, tem hoje 76 anos e reformou-se há quase um ano, uma das poucas novidades da sua vida. Continua casado e as duas filhas continuam bem de saúde. Ainda vive na mesma casa de sempre. “Nasci ali e vou morrer ali”, garante, continuando a ser um homem de poucas palavras.
Os dias para ele são hoje como um regresso ao passado onde cresceu. Tem um terreno perto de casa, com vinha, onde gosta de passar os dias, ouvindo os mesmos pássaros que o encantavam quando era criança. “Ainda trabalho mais agora do que no tempo em que estava na empresa”, brinca. Ser a estrela do roteiro literário é para ele motivo de orgulho, mas volta a dizer que dispensa a fama. “O roteiro é engraçado e pode ser muito dinamizador para a aldeia, as pessoas passam a conhecer-se melhor, é por isso que quis vir pessoalmente à apresentação”, conta.

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