Presépio solidário e comunitário na Aldeia da Pedra d’Ouro
O Presépio da Aldeia da Pedra d’Ouro, em Alenquer, volta a atrair visitantes nesta quadra natalícia. O projecto comunitário celebra dez anos e pode ser visitado gratuitamente até 6 de Janeiro. Com figuras quase reais, recria ofícios e costumes da aldeia que se mantêm vivos através desta iniciativa.
O Presépio da Aldeia da Pedra d’Ouro, no concelho de Alenquer, assinala este ano uma década de existência e continua a afirmar-se como um projecto comunitário único, construído com base na memória colectiva, no voluntariado e na valorização dos ofícios e profissões tradicionais já desaparecidos da aldeia. Pode ser visitado até ao Dia de Reis, 6 de Janeiro, sendo depois desmontado e guardado, para regressar no ano seguinte.
A história começou em 2015, a partir de um desafio lançado pela União de Freguesias de Alenquer para a criação de uma árvore de Natal a concurso, mas a comunidade foi mais longe e construiu um presépio com as principais figuras. “A adesão foi grande. As pessoas vinham, ficavam entusiasmadas e nós também. A partir daí todos os anos temos vindo a desenvolver e a fazer crescer o presépio”, recorda Álvaro Granadas, um dos mentores do Presépio da Aldeia da Pedra d’Ouro.
Quem entra no presépio e depois faz o percurso circular depara-se com dezenas de figuras em dimensão quase real (cerca de metro e meio de altura) muitas delas automatizadas, representando ofícios e profissões que fizeram parte do quotidiano da aldeia. Para além das figuras clássicas do presépio, o visitante encontra o ferreiro, o carpinteiro, o agricultor, a mercearia, o barbeiro e outras actividades que marcaram a vida da aldeia. “Isto é também uma homenagem”, explica Álvaro Granadas, acrescentando que as figuras que hoje são visitadas foram pessoas reais, com nome, que moraram na aldeia e exerceram aqueles ofícios. Ano após ano, Natal após Natal, os moradores da aldeia alocados ao projecto do presépio foram acrescentando mais profissões e pormenores.
Um presépio feito com carolice e materiais reciclados
A aldeia tem à volta de 60 moradores, alguns mais recentes que outros. Os mais antigos, refere Álvaro Granadas, fazem o presépio por carolice sendo que a entrada no presépio é gratuita. Os materiais usados para a construção das figuras, casas e estrutura, incluindo um moinho, são sobretudo materiais recicláveis. A trabalhar na área da gestão de resíduos, Álvaro Granadas usa madeiras e chega a pedir aos clientes para lhe fornecerem materiais para o presépio.
A preparação das figuras e dos cenários leva cerca de três meses, para além da manutenção ao longo do ano, nomeadamente da limpeza das ervas e da conservação da estrutura. Parte do presépio permanece montada durante todo o ano, mas as figuras são desmontadas e guardadas. “Os bonecos são automatizados. Se ficassem aqui ao tempo, degradavam-se e no ano seguinte já não funcionavam”.
Álvaro Granadas nasceu e cresceu na aldeia e reconhece-se nas histórias que o presépio conta. Recorda uma Pedra d’Ouro em festa, marcada por tradições como o Carnaval, o jogo da malha e as vacadas. A ligação à memória cultural passa também pela história familiar: o seu avô, poeta popular, compunha cegadas para várias terras da região, incluindo a Pedra d’Ouro, Alenquer e Camarnal. Está sepultado em Alenquer, onde uma lápide o identifica como “o poeta da aldeia da Pedra d’Ouro”.
Regresso ao passado com valor pedagógico
O desenho e a concepção das figuras estão a cargo de António Manuel Marcelino, projectista do presépio. O desafio surgiu a convite de Álvaro Granadas e implicou pesquisa, projecção de imagens e desenho manual. “Andei uns dias a pensar como é que havia de ser”, recorda. Algumas figuras revelaram-se particularmente exigentes, como o camelo, devido aos pormenores. “É quase tudo à escala real”, explica. Todos os anos há novidades. Mantêm-se os ofícios já representados, mas surgem sempre novos elementos. Apesar das limitações do espaço, há planos para acrescentar mais três ou quatro ofícios nos próximos anos.
Nem tudo tem corrido sem sobressaltos. Durante os trabalhos deste ano, um incêndio deflagrou na cabana do Menino Jesus. A estrutura, feita com um loureiro e palha, aqueceu devido à queda de um projector, acabando por arder. O fogo obrigou à intervenção dos bombeiros. “Foi um susto”, recorda António Manuel Marcelino, mas a reconstrução começou de imediato nessa mesma tarde.
O presépio abre diariamente após o almoço e encerra entre as 22h30 e as 23h00. Não existe contagem oficial de visitantes, mas na inauguração juntam-se habitualmente entre 200 a 400 pessoas. Ao longo da quadra natalícia, chegam visitantes de vários pontos do país, incluindo Braga, Coimbra, Entroncamento e Lisboa. Muitos deslocam-se propositadamente à aldeia para conhecer o presépio.


