“Os Camponeses” de Riachos são a prova de que o folclore não é o parente pobre da cultura portuguesa
Fundado há 66 anos, elementos descrevem o Rancho Folclórico “Os Camponeses” de Riachos como uma família. Cerca de 80 elementos fazem parte do grupo. Paulo Sérgio, Fátima Soares e Telma Pereira são três dos elementos da direcção e falaram com O MIRANTE sobre os desafios de gerir a colectividade, a propósito do Dia Nacional do Folclore Português, que se comemora anualmente no último domingo de Maio.
Paulo Sérgio é o presidente do Rancho Folclórico “Os Camponeses de Riachos há seis anos. Pertence ao grupo desde 1987, quando tinha 10 anos. Fátima Soares é secretária da associação e entrou aos 17 anos, tendo saído mais tarde e regressado há dez anos por influência da filha. A vice-presidente, Telma Pereira, entrou em 1989 a convite de uma amiga e nunca mais saiu. Apesar da constante necessidade de mudança e actualização, referida pelos três dirigentes associativos como fundamental à sobrevivência da associação, valores como a disciplina, o respeito e o companheirismo nunca se perderam ao longo do tempo e são pilares fundamentais. Actualmente, o rancho “Os Camponeses” de Riachos conta com cerca de 80 elementos, com idades entre os dois e os 80 anos.
Manter os jovens entre os 14 e os 21 anos é um desafio para algumas associações culturais, no entanto, Paulo Sérgio diz que o rancho não se pode queixar. “Temos vários jovens entre essas idades. Começam em crianças e mantêm-se pelo espírito do grupo e pela paixão ao rancho. Tivemos de nos adaptar, com uma mudança de aprendizagem menos exaustiva, apenas um ensaio por semana e com mais convívio do que antigamente, mas existe um grande respeito e consideração pelo rancho e pelos ensaios, da parte dos mais novos” diz o presidente do grupo.
Telma Pereira defende que é de louvar que tantos jovens ainda procurem manter-se no rancho e honrar os seus compromissos com a associação. A ligação do rancho à comunidade local é forte e os três elementos da direcção afirmam que nunca houve razão de queixa de falta de apoio por parte dos riachenses, contando em vários eventos com casa cheia.
Jovens aprendem com os mais velhos
Paulo Sérgio acredita que para dançar bem é preciso ritmo e bom ouvido, mas confessa que nos bailes de outros tempos era mais fácil. “Aprendi a dançar nos bailaricos com as senhoras mais velhas. Ali é que se aprendia. É uma pena que hoje não haja tantos e isso vê-se na dificuldade que as pessoas têm em aprender a dançar. Mas com força de vontade, mesmo os que têm menos ritmo lá conseguem”, diz bem disposto. O grupo não tem nenhum professor de dança e todos os novos membros que entram devem aprender com os elementos mais velhos. Nenhum elemento do rancho paga quotas ou mensalidades. A associação subsiste com os apoios das autarquias mas, essencialmente, dos eventos para angariação de fundos que realizam durante o ano.
O grupo desenvolve actividades junto da comunidade local como workshops de dança e criação de instrumentos de cana rachada nas escolas, além de eventos de demonstrações típicas de épocas antigas. “Sou apologista de fazer pouca coisa mas bem feita. Temos cerca de 35 actuações agendadas este ano e não quero mais. Fizemos uma actuação de um casamento à antiga onde tudo tinha de corresponder à época. As louças, a mesa, os trajes, tudo, até ao mínimo detalhe”, explica Paulo Sérgio, que afirma ter gosto pelo tradicional e simples. “Temos editados alguns livros, um tem todas as músicas que se cantavam nos Riachos, nossas e de outros grupos. Temos outro com registos fotográficos desde 1958 até 2019 que contam um pouco da nossa história ao longo do tempo”, explica.
Folclore é visto como parente pobre da cultura
As dificuldades financeiras são, de forma unânime, apontadas pelos três elementos da direcção como a maior preocupação. No entanto, Paulo Sérgio afirma que com muito esforço nunca ficou a faltar nada e que o rancho trabalha sempre num ano, para juntar dinheiro para o próximo. O grupo usa trajes e calçado próprios, feitos com tecidos que, segundo dizem, são cada vez mais difíceis de encontrar e mais caros. Para poupar dinheiro, Paulo Sérgio, Fátima Ribeiro e Telma Pereira, foram os operários que com a ajuda de outros elementos do grupo, colocaram chão novo no gabinete da direcção. Apesar de já ter actuado em países como Estados Unidos da América, Alemanha e Bélgica, Telma Pereira admite com tristeza que todos os anos têm de negar convites a actuações no estrangeiro para economizarem.
Telma Pereira acredita que o folclore português é visto como o “parente pobre da cultura” mas defende que nenhum outro estilo musical ou de dança pode ser comparado. “O folclore é diferente, não é melhor ou pior. Tem recriações de vivências antigas, tradições, costumes, vai muito além da dança, mas é uma representação cultural da história do nosso país”, diz. Os três elementos da direcção acreditam que o folclore devia ser mais valorizado face a outras artes musicais. “O rancho folclórico é uma escola de vida, não é só dançar e cantar, mas criar relações interpessoais. O rancho é uma família, existe muito companheirismo e respeito. Se alguém tiver um problema pessoal ou for necessária ajuda para realizar um evento, todos se unem e ajudam” remata Telma Pereira com um sorriso.