O futebol amador na luta pela igualdade de género
Mostrar o potencial de uma mulher e quebrar os preconceitos em relação à falta de oportunidades são dois dos objectivos da nova liga de futebol de rua feminino, patrocinada por O MIRANTE.
A primeira jornada foi um sucesso, teve a presença de muito público e prestou homenagem a mulheres que venceram a luta contra o cancro da mama. Arrancou um novo campeonato na região onde o resultado é o que menos interessa.
O poder de uma mulher sente-se pela paixão que tem pela liberdade e foi por isso que um grupo de mulheres se uniu para formar uma liga de futebol de rua feminino que já está a fazer a diferença na região. O último fim-de-semana fica marcado pelo arranque da nova liga “O MIRANTE futebol de rua feminino” que conta com quatro equipas: a Juventude Lapas, que ganhou por 6-5 à União Desportiva da Chamusca, e o Riachense que recebeu a equipa do Pego vencendo por 4-1. Mas o resultado é o que menos importa neste campeonato. O objectivo, para além de passar bons momentos de convívio e fazer exercício, é mostrar o potencial de uma mulher e quebrar os preconceitos de que as mulheres não conseguem fazer o mesmo que os homens, independentemente do contexto em que estão inseridas.
O sintético da Quinta da Silvã, em Torres Novas, recebeu o arranque da liga. O público aderiu em massa e antes do apito inicial as atletas entregaram lembranças a três mulheres que venceram o cancro da mama, não estivéssemos em pleno “Outubro Rosa”, o mês da prevenção da doença. Com as emoções à flor da pele, todas as atletas demonstraram entusiasmo e determinação por uma modalidade pela qual dizem sentir paixão. Nota-se em cada disputa de bola, em cada lance falhado e em cada golo marcado. Nas bancadas, o público respondeu ao esforço e entrega das jogadoras com palmas e gritos de incentivo. Não se ouviram insultos nem palavras indecentes, uma realidade completamente diferente do que se costuma ver nos campeonatos distritais e nacionais em Portugal, seja de que escalão for.
Alguns minutos antes do jogo entre as Lapas e Chamusca iniciar, O MIRANTE roubou conversa a Ana Brites, um dos rostos da criação da liga. Enérgica e proactiva, coube à atleta de 37 anos abrir as hostilidades e explicar o conceito do novo campeonato amador às várias dezenas de pessoas que assistiram à partida. “Somos só um grupo de mulheres determinadas que adora jogar à bola e que gosta de passar bons momentos em conjunto”, disse, momentos antes de entregar uma lembrança ao presidente da junta local pelo apoio que tem dado à equipa.
Foi com esse propósito que em 2022 surge o Juventude Lapas Feminino, para envolver mulheres que sempre desejaram jogar futebol, mas que nunca tiveram oportunidade. “Sempre joguei na rua com os rapazes e procurei pertencer a uma equipa a minha vida toda”, explica bem-disposta por finalmente ter conseguido alcançar o seu objectivo, sem precisar de pertencer ao “chapéu” de alguma associação. Gerir conflitos entre as jogadoras é um desafio que se leva sempre com um sorriso porque todas respeitam os feitios de cada uma. “Fazemos birra e amuamos, mas não nos vamos embora sem o problema resolvido”, refere.
As competências técnicas, ou em alguns casos a falta delas, são levadas com tranquilidade e sem pressões. “Algumas têm mais jeito do que outras, até porque temos atletas que nunca tinham jogado numa equipa na vida. Mas temos um grupo de treinadores que nos dá coças físicas e temos o apoio da comunidade local. Isso é muito importante para manter a equipa unida”, vinca Ana Brites.
Ana Brites tem um filho com 12 anos, está na área da solicitadoria e dá formações a árbitros. Diz que todas as mulheres conseguem ter uma vida activa fora da família e que já lá vai o tempo em que a autonomia e liberdade estava toda do lado do homem. “As mulheres podem fazer tudo o que querem. A competência não tem género. Espero que as mulheres que podem, mas têm medo de arriscar, mudem o chip porque estão a perder grandes oportunidades de serem felizes”, garante, acrescentando que hoje em dia se sente uma pessoa mais completa. “É incrível quando podemos fazer o que amamos”, termina.
Incentivar mulheres de outros concelhos
Um dos grandes objectivos desta liga é incentivar outras mulheres e equipas a juntarem-se e a participarem no campeonato na próxima temporada. As Lapas são um bom exemplo de como, com esforço e dedicação, se consegue fazer bons projectos. A equipa nasce quando algumas mulheres da aldeia, ou com ligações familiares às Lapas, começaram a jogar esporadicamente após a realização de um jogo de solteiros e casados na inauguração do Parque Desportivo de Lapas. As 20 atletas treinam semanalmente e já disputaram provas em vários concelhos do país, nomeadamente em Lisboa onde venceram um torneio. Já organizaram o torneio “Lapinhas”, em honra a uma antiga equipa feminina que existiu há cerca de quatro décadas com mães que vêem agora as suas filhas reavivar a memória da aldeia.
Editorial
O MIRANTE também joga com as mulheres
O MIRANTE foi convidado e aceitou dar nome, e ser patrocinador, de uma iniciativa que arrancou na região ribatejana para valorizar a prática do futebol feminino de rua. Desde a sua fundação que O MIRANTE segue particularmente as actividades amadoras e menos o futebol de competição. Desta vez não tivemos alternativa: esta iniciativa rompe com todos os preconceitos e deve ser considerada uma “pedrada no charco” no seio de um desporto que é praticamente território de atletas masculinos.