Uma motorista de transportes públicos que assa castanhas nas feiras em homenagem à sua mãe
Sandra Ramos, natural de Tomar, é motorista de transportes públicos, mas há dezenas de anos que vende castanhas em feiras para homenagear o legado que a sua mãe deixou. O MIRANTE encontrou-a na Feira Nacional do Cavalo, na Golegã, e falou com a castanheira sobre como é manter vivas as tradições.
De geração em geração, a venda de castanhas assadas continua a ser um dos símbolos da Feira do Cavalo, na Golegã. Muitos dos vendedores herdaram o negócio dos pais e mantêm viva a tradição, contando com a ajuda dos irmãos, irmãs e outros familiares para darem continuidade à actividade. É o caso de Sandra Ramos, uma vendedora de castanhas, natural de Tomar. Trabalha como motorista de transportes públicos, mas também se dedica ao comércio sazonal de castanhas em nome da sua mãe. Há mais de 30 anos, juntamente com os irmãos, que anda de feira em feira a aquecer as mãos e o coração dos seus clientes. Sandra Ramos conta que a primeira vez que esteve na Feira da Golegã tinha apenas 10 anos. “O significado de estar aqui na Golegã é grande, porque é uma tradição que conseguimos manter. É algo que me orgulho em preservar, ainda que a geração mais nova não demonstre muito interesse em seguir este caminho,” conta a O MIRANTE.
O negócio familiar também passa por Marco Ferreira, natural de Lisboa, que vai à Golegã há 17 anos, levando para a frente o legado deixado pelos pais. O vendedor explica a O MIRANTE que participa também em outras feiras, como as de Alcácer, Sintra e Cartaxo, mas revela que a Golegã tem um “sabor” especial: “quando chega Dezembro, fico logo com saudades deste lugar. A convivência com as pessoas aqui é diferente”, vinca.
A colheita deste ano das castanhas trouxe opiniões distintas. Sandra Ramos menciona que a qualidade das castanhas é superior, mais doce, embora o preço também tenha subido. Já Fernando Gomes, que é negociante de cavalos, e veterano na feira há mais de 50 anos, tem uma visão diferente sobre a produção deste ano. Segundo o vendedor, a falta de chuva e as condições climáticas adversas enfraqueceram o calibre das castanhas, tornando-as menos viáveis para o mercado. “Foi um ano muito mau para a colheita, as castanhas vieram fracas”, lamenta, ao ver na escassez da água um dos maiores obstáculos enfrentados pelos produtores de castanhas em Portugal. Marco Ferreira também sentiu o impacto da seca, observando que “devia ter havido chuva em Agosto para melhorar o desenvolvimento da castanha”. Já Sandra Ramos salienta que, além do clima, o sector enfrenta dificuldades devido à falta de mão-de-obra jovem. “A colheita ainda depende muito das pessoas idosas, que estão cansadas e, muitas vezes, precisam de ajustar os preços para compensar o esforço,” explica.
A procura por castanhas tem variado nos últimos anos, dependendo do clima e das condições económicas. Os vendedores garantem que o calor nesta altura do ano reduz a venda, uma vez que a castanha é mais procurada em dias frios, pelo conforto que proporciona. Fernando Gomes observa que, além do calor, o baixo poder de compra dos visitantes tem impactado o negócio. No entanto, Marco Ferreira diz que há um aumento da afluência à feira, inclusive de estrangeiros, principalmente espanhóis, o que traz algum alívio.
O preço das castanhas permanece uma questão delicada. Para Sandra Ramos, muitos clientes não percebem os custos envolvidos, incluindo o carvão, a mão-de-obra e o próprio trabalho físico. “Três euros parece muito, mas se virmos o que está por detrás, acaba por ser um preço justo”, esclarece. Quando se fala no futuro do sector, os vendedores têm uma visão pessimista. Os três comerciantes são directos e dizem que é um negócio que vai acabar, enfatizando que o sector enfrenta um futuro sombrio com os custos a aumentarem e o interesse a diminuir. Sentem que o futuro é incerto, dado o trabalho árduo e o baixo retorno financeiro, e destacam que a adesão das novas gerações é mínima, e que “só os antigos” é que continuam a vender castanhas.
Uma feira com visitantes fiéis
Além das exibições equestres e das castanhas assadas, a Feira Nacional do Cavalo é uma festa cultural. O público é diversificado, e muitos visitantes, ao partilharem as suas impressões, ressaltam a importância do evento como um espaço de encontro entre tradições e modernidade. José Gonçalves, de Braga, é um dos visitantes assíduos da Feira da Golegã. Há dez anos que faz questão de marcar presença no evento, que considera um ponto de reencontro com amigos e uma oportunidade para apreciar o mundo equestre. “É um encontro anual,” afirma, reforçando a importância da feira como uma ponte entre o passado e o presente, onde as memórias se misturam com as novas realidades do evento.
Maria Moisés e João Moisés, um casal do Montijo, estão a viver a experiência da Feira da Golegã pela primeira vez. “É uma feira muito bonita, e gostamos especialmente dos cavalos e da forma como a feira está organizada”, contam. Para o casal, o ambiente equestre é um grande atractivo, mas também não deixaram de experimentar o artesanato e a gastronomia local. “Aproveitámos para comprar algumas peças de artesanato e almoçámos na feira, porque queríamos experimentar tudo que faz parte deste evento. Acreditamos que a feira é essencial para a economia e a cultura da Golegã, pois mostra muito do que a região tem a oferecer”, destaca Maria Moisés. Ao comparar com outras feiras, como a de Santarém, que apreciam pelo enfoque na agricultura e nos animais, o casal afirma que a Golegã oferece um carácter único, com uma forte ligação ao mundo equestre e ao artesanato. “Com certeza voltaremos no próximo ano”, acrescenta.