No Médio Tejo há emprego para toda a gente

Nos concelhos do Médio Tejo não há pessoas para trabalhar e por isso a taxa de desemprego devia ser zero. Entrevista com Joaquim Serras, empresário e presidente da ACE, com sede em Abrantes, que terminou agora o seu segundo mandato e deu lugar a uma nova direcção.
Joaquim Serras finalizou o seu segundo mandato como presidente da ACE – Associação Comercial e Empresarial de Abrantes, Constância, Sardoal, Mação e Vila de Rei, que faz, a 16 de Julho, 100 anos. Nesta entrevista a O MIRANTE, o empresário fala da associação, da actividade empresarial e das questões que afectam a zona do Médio Tejo.
É a favor da regionalização?
Não, porque já temos Estado a mais. Estar a fazer uma regionalização para termos mais Estado é agravar o problema do país. Concordo com a passagem de muitas das competências que agora são dos municípios para entidades que agreguem vários municípios ou várias regiões.
A desertificação do interior pode ser travada?
No Médio Tejo quase todos os concelhos perderam população nos últimos 15 anos. Existem vários programas para combater o problema mas não é fácil resolvê-lo porque a tendência a nível mundial é a concentração em grandes cidades. Para o poder político isso é bom porque dessa forma é mais fácil governar e os problemas são mais fáceis de resolver.
As pessoas saem para as grandes cidades devido à falta de empregos no interior?
Na zona do Médio Tejo não há falta de emprego. Se alguém quer contratar não há pedreiros; não há serventes; não há canalizadores; não há serralheiros; não há soldadores; não há contabilistas; não há cozinheiros. Não há pessoas para trabalhar portanto não há desemprego. Se formos ao Centro de Emprego a taxa de desemprego deveria ser zero porque colocamos anúncios e não existem pessoas para trabalhar.
As empresas e as pessoas de certas zonas da área de abrangência da Associação queixam-se de falta de internet?
Há internet para toda a gente ou praticamente toda a gente tem internet. O que se passa é que é lenta. As infra-estruturas deveriam ser melhoradas.
Como é a relação das empresas com as escolas e os politécnicos? Estão oferecer os cursos que são precisos para a região?
Penso que é boa. Podiam existir algumas formações mais adequadas, por exemplo, na formação de pessoas na área do turismo, mas isso já passa mais por escolas profissionais do que pelos politécnicos.
E qual a relação do poder político com os empresários?
De um modo geral, todos os políticos da nossa região acarinham muito os empresários e só não fazem mais pelos empresários porque não podem.
Independente da cor política?
Sim... tem dias.
Nos últimos trinta anos qual foi a maior mudança no Médio Tejo?
As acessibilidades. Penso que foi essa a maior mudança e foi muito importante.
Mas com portagens, como na A23.
É um custo que as empresas têm e que não deveriam ter. Na A23 não estava previsto haver portagens. Se queriam chamar pessoas e desenvolver o interior não deveriam ter colocado portagens.
Um dos problemas do Médio Tejo tem sido os incêndios.
É um problema que tem a ver com a gestão da floresta e que nunca ninguém quis ou soube resolver. Ao longo dos últimos trinta anos já vi coisas arderem uma série de vezes e nunca ninguém fez nada. A única coisa que mudou foi a paisagem. Onde antes havia pinheiros passou a haver eucaliptos. Os incêndios serviram para substituir pinhal por eucaliptal e vamos ter mais eucaliptos apesar da legislação ter começado a restringir a sua plantação.
Porque diz isso?
Há muitos interesses e, na prática, não existe um ordenamento da floresta. Se alguém planta eucaliptos ainda consegue ter alguma rentabilidade e não vamos sair daí. Há quem diga muito mal dos eucaliptos, mas eles acabam por dar alguma rentabilidade aos proprietários. Quem tiver alguma propriedade, herdada de algum familiar, que se calhar trabalhou uma vida inteira para a conseguir comprar, pode deixá-la ao abandono ou, para ter algum rendimento, plantar eucaliptos.
Alguma vez teve vontade de se candidatar a algum cargo político?
Nunca tive e não tenho. Tenho uma empresa, a Serras Consulting, na área da contabilidade, projectos de investimento e apoio à gestão, mas o nosso principal serviço é contabilidade. Tenho também a Dialgest, que é uma empresa na área da informática. E é muita preocupação para juntar actividade política.
A importância da proximidade
Terminou o seu segundo mandato de três anos. Como caracteriza a actividade da ACE?
A associação é muito importante para o território e para apoiar os empresários. Também na formação profissional e nos programas de consultoria.
Nestes seis anos de exercício do cargo qual foi a pior situação que enfrentou?
Foi a pandemia. Todos os outros problemas ficaram esquecidos e desvalorizados com o que nos está a acontecer.
O que foi mais positivo durante o seu mandanto?
O melhor foram os jantares temáticos feitos no decurso do primeiro mandato. Fizemo-los em praticamente todos os concelhos de abrangência da associação. Serviram para discutirmos questões das empresas, do empreendedorismo, das dificuldades que as pessoas sentiam.
Segundo os últimos dados a ACE tinha cerca de quinhentos e sessenta associados. A actual situação afectou as inscrições?
Não. O número de sócios tem estado sempre a aumentar. Temos tido mais entradas do que saídas. As pessoas reconhecem a importância da associação. E o aumento de associados fez crescer as actividades da associação.
“Trabalho, em média, doze horas por dia”
Joaquim Serras nasceu na aldeia de Panascos, concelho de Sardoal, há 47 anos, cinco dias depois do 25 de Abril de 1974. É proprietário da Serras Consulting na área da contabilidade e gestão e da Dialgest, na área da informática. Tem formação académica em contabilidade, organização e gestão de empresas, economia e uma pós-graduação em fiscalidade.
Refere trabalhar, em média, doze horas por dia. Casado, tem uma filha de 16 anos e um filho com três anos e meio com quem diz passar a maior parte do tempo livre. Os seus passatempos são andar de mota e correr.
Com espírito de empresário e sentido de humor diz, quando lhe perguntam qual o local da região que recomendaria a alguém que quisesse vir para o interior, que seria um onde tivesse um lote para vender. Mais a sério, aponta o Sardoal e Alcaravela.