Empresários criticam asfixia fiscal e querem mais apoio e proximidade dos municípios
Os empresários com quem O MIRANTE falou à margem da cerimónia Galardão Empresa do Ano, a propósito do Dia Nacional do Empresário, que se assinala a 25 de Novembro, consideram que o Estado os sobrecarrega com impostos e que tanto as associações empresariais como os municípios precisam de estar próximos e apoiar mais quem alavanca a economia da região e do país.
Estado faz pouco por quem tanto ajuda o país
Ana Gaspar, directora e fundadora do Colégio Jardinita, em Alcanede, considera que o Estado devia ser mais amigo dos empresários e que “faz pouco por quem tanto ajuda o país”. Para a empresária faltam apoios não só ao nível financeiro, mas para impulsionarem e fazerem crescer os seus negócios. “Os bancos evoluíram e ajudam mais, já as associações empresariais fazem o que podem”, diz. Na opinião da directora do colégio “a sociedade não dá o devido valor” aos empresários que “têm contribuído tanto para o país” e considera importante as câmaras municipais apostarem e publicitarem gabinetes de apoio ao investidor, “até para incentivar mais pessoas a investir” e empreender.
O patrão é sempre o alvo a abater
A sociedade não dá aos empresários o mesmo mérito de outras profissões e o patrão é sempre um alvo a abater. Quem o diz é de Ivo Delgado, um dos sócios-gerentes da Delgometal. “São os empresários que criam postos de trabalho. Alguns partidos acham que o patrão é sempre o alvo a abater e é desanimador sermos sempre o vilão”, diz o empresário que considera que o Estado não ajuda como devia as empresas. “Praticamente de tudo o que produzimos e temos de lucro o Estado absorve. Concordo com a fiscalização porque temos de contribuir para o país, agora a carga fiscal é que devia ser revista e ter vários patamares. Uma empresa familiar não pode pagar o mesmo que paga uma multinacional. Temos de dar a volta ao texto”, critica.
A Delgometal é parceira da associação empresarial ACIS de Vila Franca de Xira e Arruda dos Vinhos que tem sido “uma boa parceira nos negócios”. Já no que toca aos bancos Ivo Delgado diz que o cenário já foi bem pior. “Talvez os novos empresários não saibam o que nós pagávamos há uns anos, mas sem os bancos não tínhamos conseguido avançar. Hoje em dia fala-se muito nos bancos mas faz parte da génese de uma empresa. Ela é criada para dar lucro e os bancos são a mesma coisa senão não vale a pena existirem”, refere. Já sobre o gabinete de apoio ao investidor que existe no município de VFX o empresário destaca a importância do seu trabalho ainda que a sua empresa nunca tenha recorrido à sua ajuda.
Temos singrado pelo nosso capital humano, não pelo Estado
A sobrecarga com os impostos, sobretudo os que estão ligados aos salários dos trabalhadores, é considerado por Maria Eulália Henriques, da Artimol, como um dos calcanhares de Aquiles para os empresários portugueses que têm “demasiados impostos e poucas ou nenhumas regalias”. Este é um dos principais motivos que levam a empresária do sector do mobiliário a afirmar que o Estado “não é amigo” das pequenas e médias empresas. “Simplesmente temos singrado pelo esforço do nosso capital humano, não com o apoio do Estado”, afirmou a O MIRANTE.
Ligada informalmente à empresa sediada em Ourém desde a sua fundação, há 50 anos, e formalmente há 14, Maria Eulália Henriques vê em alguns bancos verdadeiros parceiros de negócio, que dão apoio “e abrem caminho” ao empreendedorismo. O mesmo, defende, deveria acontecer, num outro âmbito, por parte das câmaras municipais que, no seu entender, deveriam ser mais próximas e preocupar-se mais com os anseios dos empresários locais.
Todas as câmaras municipais deviam ter Gabinete do Investidor
“O Estado poderia ser mais amigo dos empresários, mas não nos podemos queixar. Os organismos do Estado têm sido parceiros para ajudar nas dificuldades, embora pudesse haver mais informação”. As palavras são de Alexandre Cardoso, director de qualidade da Betclean, empresa que trabalha na área da higienização de indústrias alimentares, com sede em Vila Franca de Xira.
Alexandre Cardoso afirma que as associações empresariais são boas parceiras tendo em conta que acabam por reunir todos os empresários e levar as suas dificuldades junto dos organismos competentes. A relação com as entidades bancárias não tem sido difícil, mas a empresa tenta não recorrer aos seus serviços. O gerente afirma que se sente reconhecido pela sociedade enquanto empresário e acha que todas as câmaras municipais deveriam ter um gabinete de atendimento ao investidor. “Os municípios acabam por ter competência só no âmbito de estarem lá para algumas acções mas deveriam estar mais presentes. As câmaras ao estarem perto dos empresários ajudar-nos-iam sempre que precisássemos”, conclui.
Escolas precisam de formar jovens para trabalhar
As organizações empresariais deviam fazer mais pelos empresários e actuar ao nível da mão-de-obra tendo em conta que há muita dificuldade em recrutar quem saiba trabalhar. A convicção é da empresária da restauração, Gilda Ferreira, que defende que as escolas profissionais de hotelaria deviam redobrar a atenção para formar os jovens em restauração e, em particular, em saber manter a gastronomia tradicional portuguesa. “Os nossos pratos são tradicionais, se não tivermos cuidado perdemo-los porque ninguém os aprendeu a fazer. Temos uma gastronomia fantástica que vem desde há muitos anos. Os jovens quando saem de uma escola vão para uma cozinha tradicional e não sabem fazer nada disso”, lamenta.
Para Gilda Ferreira o Estado não é amigo dos empresários e não valoriza o seu património, tempo e dedicação investido no negócio. “E depois são os impostos exorbitantes. Não nos ajuda rigorosamente nada a ultrapassar os desafios”, critica, acrescentando que recorrer aos bancos nem sempre compensa porque ajudam pouco quem precisa.
A empresária defende ainda que a sociedade precisa de reconhecer o mérito dos empresários. “É uma pena não olharem para nós como uma profissão como outra qualquer”, lamenta a mulher empresária, que defende que todas as câmaras municipais deviam ter gabinetes de apoio ao investidor para ajudar a “desbloquear alguns processos”.
Estado não tem sido amigo dos empresários
Gonçalo Eloy considera que o Estado não tem sido amigo dos empresários e que actualmente as empresas sentem mais dificuldades. “Os impostos estão sempre a aumentar, torna tudo mais complicado para uma empresa. Há uma sobrecarga de impostos muito grande”, refere o empresário de Santarém, acrescentando que as entidades bancárias costumavam ser uma ajuda, mas neste momento, com a subida da taxa Euribor, também se tornaram numa dificuldade na vida de quem gere uma empresa.
Na sua opinião, as associações empresariais tentam ajudar no que podem. “Talvez sejam o suporte maior que as empresas têm junto do Estado”, reflecte Gonçalo Eloy, administrador da AgroRibatejo, que considera que a sociedade deveria dar mais valor aos empresários pelo importante papel que têm na sociedade. “Se as empresas forem caindo os empregos também vão diminuindo, deixamos de conseguir contratar, de investir e tudo isso mexe com a economia da região e do país”, sublinha. Apesar de nunca ter precisado, Gonçalo Eloy refere que todos os municípios deveriam ter um gabinete de apoio ao investidor para os empresários que necessitam de algum tipo de apoio.
Estado apoia-se a si próprio e tira partido dos empresários
Se Pedro Mota tivesse que comparar o Estado Português a um ser vivo deste planeta provavelmente escolheria a sanguessuga, isto porque este órgão de soberania “apoia-se a si próprio e está sempre à espera de tirar partido dos negócios e da vida dos empresários”, sem os quais “a economia não mexe”. O empresário do sector dos materiais de construção lamenta que outros como ele tenham que se sentir quase como “funcionários do Estado” a quem entregam os impostos que são obrigados a cobrar. “Pelo menos nestes últimos anos o Estado não tem privilegiado os empresários”, disse aos jornalistas de O MIRANTE momentos antes de ter início a cerimónia do Galardão Empresas do Ano.
Na sua opinião quer o Estado quer as câmaras municipais têm tentado substituir-se às associações empresariais, mas não têm conseguido prestar um serviço equiparado, nomeadamente ao nível da informação e apoio tecnológico. No entanto, reconhece, seria injusto não enaltecer o trabalho de alguns municípios que “têm procurado acompanhar as empresas”. Nesta conversa a propósito do Dia do Empresário, o responsável da Construmat, de Torres Novas, lamenta que os portugueses não dêem o devido valor aos empresários que em momentos de crise já ajudaram a levantar a economia do país.
PME são decisivas na economia nacional
O Estado faz o melhor que pode para ajudar os empresários nos desafios do dia-a-dia mas quem arrisca, inova e investe nas empresas poderia e devia ter alguns apoios adicionais para permitir continuar a manter a economia a funcionar. A convicção é de Carlos Gonçalves, gerente da Filourém, que considera que “as PME são decisivas em toda a economia” e que mereciam ter mais apoios.
Para o empresário a banca tem tido momentos desafiantes e a actual relação das empresas com os bancos sofre também do contexto pós-pandémico e das duas guerras que o mundo enfrenta. “Isso influencia tudo. Ainda assim há muita oferta ao nível da banca, temos uma excelente relação com os nossos três principais bancos e ajudam no que podem”, explica. Já quando questionado sobre a forma como a sociedade olha para os empresários defende a necessidade de haver mais empatia. “Temos de saber colocar-nos no lugar do outro. Quem está de um lado quer sempre mais e melhores condições e quem está do lado das empresas tem essa sensibilidade mas também muita responsabilidade. No fundo, quando as pessoas param para pensar percebem o esforço que temos de fazer para cumprir com as nossas obrigações e no fim do dia pagar salários”, afirma. Já os gabinetes de apoio ao investidor podem ser positivos para ajudar a voz das empresas a chegar mais longe na estrutura nacional.
PME deviam ter outro tipo de apoio
Os empresários debatem-se com grandes dificuldades, com sistemas muito burocráticos que nem todos conseguem ultrapassar. Além disso têm que suportar “uma carga fiscal bem complicada”. Quem o diz é Ana Carla Lopes da HACL, empresa com sede em Santarém, que se dedica à construção de edifícios residenciais e não residenciais, tanto no sector público como privado. Para a empresária “as pequenas e médias empresas” que têm um grande peso em Portugal “deviam ter outro tipo de apoio”. Também os empresários, defende, deviam ser mais valorizados pelo trabalho que desenvolvem e papel importante que têm na sociedade e economia do país.
Na sua opinião as associações empresariais são fundamentais e têm feito um bom trabalho, mas no que respeita à Nersant, da qual é associada, considera que deveria dar mais atenção a outras áreas além da agrícola para a qual está muito vocacionada. “Já fiz projectos com eles e estão sempre disponíveis, mas deviam alargar o leque”, conclui.
Todos deveriam ser patrões uma vez na vida
A engenheira Ana Lúcia Cláudio, que gere juntamente com o marido, Hélio Simões, a Hak, empresa que desenvolve projectos de edifícios e prestação de serviços na área da engenharia, diz que todos os cidadãos “deveriam ser patrões uma vez na vida” sobretudo aqueles que têm por hábito reclamar muito. Isto porque, defende, é mais fácil ser-se colaborador numa empresa do que ser o seu proprietário, sempre preocupado em saber se há condições para manter o número de trabalhadores ou se podem continuar a garantir-lhes boas condições de trabalho. Além disso, acrescenta, a mente de um empresário - pelo menos daqueles que são, responsáveis e empreendedores – nunca para de pensar sendo raro o seu descanso pleno.
Ajudaria, afirmou a O MIRANTE, não haver uma tão “grande sobrecarga fiscal” e “se os impostos fossem mais baixos”, até porque essas medidas fomentariam o crescimento das empresas e serviriam de incentivo à contratação de mais trabalhadores e aumento dos salários. Também da parte dos bancos, diz a empresária da Hak, com sede em Almeirim, deveria haver mais incentivos e vontade em se colocarem ao lado daqueles que gerem uma empresa e lutam diariamente para a manter viva e em crescimento.