Especiais | 28-03-2021 12:30

“O rio Tejo é um recurso inestimável”

“O rio Tejo é um recurso inestimável”
EDIÇÃO 1.500
Carlos Cupeto

O rio Tejo é um exemplo da falta de políticas de descentralização e proximidade.

Numa altura em que se fala num projecto de milhões para o rio Tejo, que ainda vai fazer correr muita tinta, o Governo concentrou a gestão do rio e das suas margens nas Caldas da Rainha num dos pólos da ARH ( Administração da Região Hidrográfica do Tejo) esvaziando todos os gabinetes e retirando importância no terreno a todos os técnicos que ainda resistem em Santarém, Abrantes, Castelo Branco e Portalegre. Santarém, só para dar o melhor exemplo, mantém alguns técnicos que apenas esperam pela reforma, que deixaram de ter o papel activo de proximidade e cumplicidade com as populações.

Na má gestão das políticas de descentralização talvez este seja um dos maiores exemplos. O rio Tejo é o maior rio da península Ibérica, com uma importância sem igual no território português. É o rio Tejo que abastece de água a região de Lisboa. Nesta altura tudo o que se relaciona com o rio e as suas margens é gerido a partir das Caldas da Rainha, depois da centralização dos serviços naquela cidade do Oeste, e o esvaziamento dos poderes, e da importância, dos técnicos que trabalhavam, e ainda trabalham, em Santarém onde estava concentrado todo o saber e experiência de muitos anos.

Não se conhece uma única intervenção de um deputado da região sobre decisões que visam apenas racionalizar serviços a qualquer custo, prejudicando o interesse das populações e do território mais castigado pelo abandono.

Carlos Cupeto, que entre Novembro de 2008 e Janeiro de 2012 teve responsabilidades nestes organismos, recordou isso mesmo em entrevista a O MIRANTE em 27 de Outubro de 2016. “Em 2007 o ministro do Ambiente Nunes Correia, pessoa conhecedora do sector da água, implementou uma coisa que a lei já previa há anos que eram as Administrações de Região Hidrográfica. Foram criadas cinco, entre as quais a do Tejo. Nessa altura começámos a gerir os recursos hídricos como no resto da Europa, não a partir das CCDR que são territórios administrativos, mas a partir do conceito de bacia hidrográfica (...) Assimilámos todos os serviços dispersos dentro das ARH e ao fim de três anos estavam a funcionar. Tínhamos um serviço próximo dos utilizadores (câmaras municipais, particulares, agricultores industriais). Trabalhávamos para os utilizadores; trabalhávamos em mesas redondas (...) Eram mais de uma centena de câmaras na área da bacia hidrográfica do Tejo. Estava sempre nos locais a resolver os problemas com as pessoas. Tínhamos um serviço de parceria, compromisso e de cumplicidade. É a melhor forma de trabalhar. A gente senta-se à frente das pessoas, olhos nos olhos e o nosso princípio era proteger e valorizar recursos hídricos. O que se faz normalmente não é isso, nomeadamente em matéria de ambiente e conservação da natureza. O que se faz é proibir. É proibido fazer isto; é proibido fazer aquilo... é o mais fácil. Nós tínhamos outra forma de trabalhar. Só se protege o que se conhece e só se valoriza aquilo que se vive. O Tejo vivo e vivido é o contrário do Tejo proibido.

Quando surge a crise enveredou-se por princípios economicistas e as ARH foram integradas todas no mesmo organismo que é a Agência Portuguesa do Ambiente. Foi tudo adulterado (...)Santarém agora depende das Caldas da Rainha. O Tejo agora depende das Caldas da Rainha. Vejam bem a patetice. Eu não percebo quais os critérios.

O Tejo é um recurso inestimável. Tem que ser vivido e tem que ser bem gerido. É um rio fabuloso mas tem todo o tipo de pressões. Não há leis que, por si só, resolvam os problemas. As grandes empresas podem sempre dar a volta às leis. Tem que haver cumplicidade e compromissos. Tem que haver trabalho, cultura, proximidade... O empresário também é cidadão, tem filhos, vive à beira do Tejo. Temos que cativar, arranjar parceiros e não acenar com penalizações. Não há país com tanta legislação ambiental e o resultado está à vista.

É verdade que, muitas vezes, cada município quer fazer aquilo que lhe vem à cabeça como aconteceu em Abrantes com o açude, por exemplo. Toda a gente quer fazer coisas que às vezes não são as mais acertadas (...) O Eng.º Pedro Serra, que foi presidente do INAG (Instituto Nacional da Água) durante vários anos, confessou num encontro na Barquinha que enquanto foi ele a decidir, o açude de Abrantes não foi licenciado. Isto quer dizer alguma coisa. Aquela obra que ali está, por muito caricato que possa parecer, ainda não está licenciada”.

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