Especiais | 13-07-2023 09:00

O estudo genético e a sua implicação no diagnóstico e no prognóstico de um quadro clínico de miocardiopatia

O estudo genético e a sua implicação no diagnóstico e no prognóstico de um quadro clínico de miocardiopatia
REVISTA DE SAÚDE E BEM ESTAR
Vítor Paulo Martins*

O objetivo do rastreio familiar é o de identificar a ocorrência ou o risco de desenvolvimento da doença nos parentes em primeiro grau.

As miocardiopatias são um grupo heterogéneo de doenças do miocárdio, associadas a disfunção mecânica e/ou elétrica, que geralmente se apresentam com uma inadequada hipertrofia, dilatação ou restrição ventricular e pode dever-se frequentemente a causas de origem genética.
A Sociedade Europeia de Cardiologia (ESC) classifica as causas de Miocardiopatia Dilatada (MCD) como familiares (genéticas) ou não familiares (não genéticas). Por outro lado, a American Heart Association (AHA) classifica as causas como: genéticas, adquiridas (exposição a toxinas, infeções, doenças metabólicas, etc.) ou mistas (a predisposição genética interatua com fatores extrínsecos ou ambientais desencadeando o fenótipo).
Na maioria dos estudos epidemiológicos, a proporção de doentes com MCD determinada geneticamente está subestimada devido à presentação clínica variável, a penetrância incompleta da doença e da falta de fenótipos específicos.
Estas doenças evoluem para insuficiência cardíaca com frequência sendo a miocardiopatia dilatada (MCD) a principal indicação de transplante cardíaco. Atualmente, estima-se que a prevalência da MCD idiopática seja em torno de 1 caso para cada 1 para 250 a 1 para 2.500 indivíduos.
A etiologia de origem desconhecida ou idiopática apresenta-se em cerca de 30% de todos os casos. Dos casos de MCD idiopática têm uma apresentação familiar até 50% dos casos e envolvem genes que codificam proteínas anormais. Os avanços na genética e na biologia molecular permitem hoje identificar mais doentes com causas especificas de MCD, pelo que denominação de idiopática é cada vez mais restrita.
O diagnóstico genético pode ajudar a predizer o risco futuro de arritmias ventriculares e morte súbita para algumas mutações. O estudo de familiares de um caso Índice permite identificar os que têm um risco elevado de complicações futuras.
Estão identificados mais de 120 genes implicados ou potencialmente associados ao desenvolvimento de MCD. A rentabilidade diagnóstica pode chegar a 70%. No entanto um resultado negativo não afasta de modo definitivo esse risco.
A miocardiopatia hipertrófica (MCH) é uma patologia de transmissão essencialmente autossómica dominante, expressão clínica variável e penetrância incompleta, dependente da idade.
As manifestações clínicas desta patologia são muito heterogéneas, desde a ausência de sintomas até à apresentação com sinais francos de insuficiência cardíaca ou morte súbita.
O objetivo do rastreio familiar é o de identificar a ocorrência ou o risco de desenvolvimento da doença nos parentes em primeiro grau do caso índex.
As normas de orientação internacionais da European Society of Cardiology (ESC) e da American College of Cardiology and American Heart Association (ACCF/AHA) recomendam a avaliação dos familiares em idade pediátrica a partir dos 10-12 anos.
Em cerca de 50-60% dos casos de MCH familiar é possível identificar uma mutação sarcomérica. Quando uma mutação patogénica é identificada numa família o diagnóstico genético é uma medida de rastreio familiar custo - efetiva e eficaz.
Estima-se que o risco anual de morte súbita cardíaca em doentes com MCH ronde 1%.
Quando uma mutação patogénica é identificada numa família o teste genético é uma medida eficaz de rastreio familiar. Este último permite aferir quais os familiares em risco de desenvolvimento de doença e aqueles que podem ser dispensados do seguimento.
O resultado do estudo genético pode fornecer informação sobre o momento mais adequado para o implante de um desfibrilhador como prevenção primária na MCD e na MCH. Sabemos que nas Miocardiopatias o motivo mais importante para decisão de implantar um desfibrilhador cardíaco será uma fração de ejeção inferior a 35%. No entanto, múltiplos estudos demonstram que algumas mutações genéticas têm um risco muito elevado de eventos arrítmicos e de morte súbita e estas poderão aparecer com ligeiras alterações da fração de Ejeção e discreta dilatação ventricular.
Assim os resultados do estudo genético podem ser uma valiosa ajuda para o médico oferecendo informação a nível de diagnóstico, prognóstico (especialmente em subgrupos de pacientes com alto risco de arritmia ventricular e morte súbita) e terapêutico (medidas de prevenção, orientação precoce para implante de dispositivos médicos (cardioversores desfibrilhadores, ressincronizadores cardíacos, etc.). Adicionalmente, o estudo genético em familiares de indivíduos afetados permite identificar portadores que estão em risco de expressão da doença em idade jovem oferecendo a oportunidade de uma intervenção antecipada evitando muitas vezes uma morte súbita inesperada

*Médico Cardiologista e Arritmologista
Diretor Clínico da Clínica do Coração Santarém

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