Ter razão continua a ser muito sobrevalorizado em detrimento da procura de consensos
As tradições são um dos alicerces para a inovação e para o desenvolvimento. São a expressão do que temos de único, de diferenciador, não enquanto pessoas individuais, mas enquanto colectivo, enquanto comunidade.
Tem boa ou má memória?
Não sou pessoa de memória curta, isso é certo – estarei no meio termo, no que se refere à memória. Diria que não guardo tudo, nem descarto tudo. Penso que, como em muito na vida, em termos de memória, o que mais importa não será a quantidade do que nos lembramos, mas a qualidade das memórias que preservamos.
Existindo boas e más memórias, guarda mais das primeiras ou das segundas?
Não sendo a nossa memória infinita, nem estando inteiramente à nossa escolha o que guardamos e o que evocamos, acredito que a memória também se treina, que também resulta de um esforço pessoal e deliberado. Pessoalmente, tento guardar memória do que é positivo, do conhecimento que me torna melhor pessoa ou capaz de tomar decisões mais justas e esclarecidas; procuro deixar cair no esquecimento qualquer rancor sem consequência e acalento as memórias dos dias bons e dos ensinamentos das pessoas que me ajudam a resistir e a acreditar que conseguirei alcançar muitos outros dias bons.
Qual a melhor memória que guarda?
Não tenho uma memória concreta, um dia ou um acontecimento que queira nomear. As melhores memórias, que me esforço por guardar, são sempre momentos com a família e com os amigos.
E a pior?
A minha pior memória é a do momento em que perdi a minha mãe.
Já lhe aconteceu estar com um amigo ou familiar que viveu um acontecimento consigo e que não recorda nada do que se passou, ou recorda-se dele de forma muito diferente?
Claro que já me aconteceu. O ditado popular “quem conta um conto, acrescenta um ponto”, explica bem que em tudo o que relatamos, acrescentamos o nosso olhar único; é esse nosso modo de ver diferente que nos leva a guardar memórias distintas, de uma mesma situação. Mas distinto, não quer dizer incompatível. É importante que aceitemos, uns e outros, que um entendimento diferente, é apenas uma outra perspectiva sobre a realidade, é uma memória, não é a realidade. Ter razão continua a ser muito sobrevalorizado em detrimento da procura de consensos.
Que acontecimentos considera memoráveis na vida da região e porquê?
A nossa região é rica em momentos definidores para a sua identidade cultural, social e económica. É memorável o percurso de inovação que alguns sectores como a agricultura, nos últimos anos. São memoráveis os contributos que pessoas e instituições deram ao país e ao mundo, em áreas como o desporto ou a cultura. Mas aqui quero destacar, como factor memorável, a Academia – na acepção de instituições de ensino superior instaladas na região – com o seu contributo para a formação de profissionais qualificados, a par da atracção de talento na investigação científica, ensino e inovação. Precisamos de mais Academia, de maior partilha de conhecimento, de mais pessoas capazes de inovar no nosso território.
Se pudesse propor a construção de um memorial público seria dedicado a quê ou a quem?
Com o devido respeito e merecimento de muitas pessoas e instituições que alcançaram feitos extraordinários em nome do Cartaxo, esse memorial seria dedicado ao orgulho de ser do Cartaxo. A esta energia que nos une. Um memorial feito da resiliência das nossas gentes perante a adversidade, da sua capacidade de sonhar nos momentos mais difíceis e de dar tudo o que têm sempre que sentem que o nosso Cartaxo precisa. Um memorial que fosse símbolo de um ser e de um sentir comum. Como uma mensagem nossa, dirigida a nós próprios, para nos inspirar quando o caminho nos parecer mais acidentado.
Diz-se muitas vezes que as pessoas em cargos políticos têm má memória. É uma crítica justa?
Assumir um cargo político é assumir um compromisso com uma comunidade, com uma causa ou com uma missão pública, aceitando a enorme responsabilidade que é gerir bens comuns ou decidir por outras pessoas, a favor dessas outras pessoas. É preciso nada esquecer sobre promessas feitas, sobre expectativas criadas, ainda que circunstâncias novas condicionem o seu comprimento. Nesse caso há que dar explicações porque quanto maior for a transparência e a prestação de contas, menor importância assume a memória da pessoa que exerce o cargo.
O que pensa das tradições?
As tradições são um dos alicerces para a inovação e para o desenvolvimento. São a expressão do que temos de único, de diferenciador, não enquanto pessoas individuais, mas enquanto colectivo, enquanto comunidade. O conhecimento acumulado, a nossa identidade, posiciona-nos no mundo. Como mero exemplo, veja-se a importância das tradições expressas em manifestações culturais ancestrais, tanto quanto na configuração da paisagem, na arquitectura das cidades ou até na gastronomia ou na produção vitivinícola, para o crescimento económico proporcionado pelo turismo ou pela procura externa de produtos endógenos a cada região.
O que acha desta tradição de O MIRANTE assinalar cada aniversário pedindo aos seus leitores e anunciantes que partilhem as suas opiniões sobre um determinado tema?
Tal como gostamos de ter os nossos amigos e a nossa família junto a nós na celebração do nosso aniversário, penso que esta tradição criada por O MIRANTE de chamar às suas páginas os leitores e os anunciantes, como quem os convida para uma festa, para os ouvir e celebrar com eles as conquistas de mais um ano de vida, é uma tradição a manter. Pelo serviço prestado à promoção da região e pelo papel essencial na informação que leva a casa de cada leitor, esta é uma tradição que espero possa repetir-se por muitos e muitos anos. Parabéns a O MIRANTE, que tenha uma longa e próspera vida.