O jovem biólogo que transformou a paixão pelas árvores em negócio

André Alves trocou o sonho de estudar animais em África pela missão de cuidar das árvores nas cidades portuguesas. É arborista, fundou a Celtis Tree Care em 2024, e em pouco mais de um ano já duplicou a facturação, conquistou clientes de norte a sul do país e formou uma equipa de jovens biólogos que alia ciência, técnica e paixão à segurança do arvoredo urbano.
A história de André Alves começa nas manhãs de domingo passadas a ver documentários de David Attenborough, que lhe despertaram o fascínio pela biologia. Quis ser investigador de comportamento animal em África, mas acabou por descobrir o caminho das árvores. Uma escolha que o levou a fundar, em 2024, a Celtis Tree Care, empresa sediada em Alcanena, que rapidamente se tornou uma referência na arboricultura urbana. Ainda jovem, com 22 anos, começou a gerir equipas de podas e abates de árvores em Lisboa. A experiência deu-lhe não só conhecimento técnico, mas também competências de liderança em contextos desafiantes, onde tinha de lidar com trabalhadores mais velhos e clientes exigentes.
Quase quatro anos depois, decidiu arriscar. Criar a sua própria empresa não foi apenas um salto profissional, mas também pessoal. “Se alguma coisa correr mal, sei que tenho sempre mais uma skill para a vida: cortar ou podar árvores. Isso dá-me independência”, afirma o arborista, uma profissão ainda longe de ser reconhecida. O espírito empreendedor nasceu da convicção de que podia fazer diferente num sector marcado pela falta de regulamentação e pela existência de operadores sem formação adequada.
O arranque da Celtis não foi fácil. O investimento inicial revelou-se mais pesado do que o jovem empresário imaginara. Equipamentos de protecção, cordas de escalada, trituradores e moto-serras somaram rapidamente dezenas de milhares de euros. “Para podar uma árvore simples levo facilmente dois mil euros em material”, explica. Mas a perseverança compensou. No primeiro ano de actividade, a empresa facturou cerca de 100 mil euros. Em 2025, está a caminho de duplicar esse valor.
Um dos trabalhos mais marcantes foi o abate de um pinheiro com 23 metros de altura, em Cascais, inclinado a mais de 45 graus sobre uma piscina e uma habitação. A operação demorou três dias e exigiu precisão absoluta, pois nada podia cair no terreno do vizinho. Outro momento decisivo surgiu com o temporal Martinho, que deixou a Celtis em trabalho contínuo durante quatro meses, removendo árvores partidas ou em risco de queda. Mais do que cortar árvores, a filosofia da empresa passa por preservá-las. “O nosso objectivo é ter árvores bonitas, seguras e bem cuidadas. Só abatemos quando não há alternativa”, sublinha André Alves, cujo treino físico é essencial para superar o rigor de trabalhar em altura.
A Celtis distingue-se pela proximidade com os clientes e pela transparência nos processos. Desenvolveu um modelo próprio de avaliação de risco de queda, digitalizado e baseado em normas internacionais, que permite às entidades públicas acompanhar em tempo real o estado do seu arvoredo. A equipa é composta maioritariamente de biólogos, mas o factor humano pesa tanto quanto o currículo. “Prefiro alguém que saiba comunicar com o cliente a alguém muito qualificado que não tem sensibilidade”, diz. Essa aposta tem dado frutos. A Celtis já interveio em Lisboa, Setúbal, Leiria, Torres Novas, Castelo Branco e Portalegre, trabalhando com câmaras municipais, juntas de freguesia e, mais recentemente, particulares que procuram segurança para as árvores nos seus terrenos.
André Alves não sonha com uma multinacional com centenas de funcionários, mas com uma empresa de referência nacional. Entre os objectivos para os próximos cinco anos estão a criação de uma segunda equipa de intervenção, a aquisição de um camião para reaproveitamento da lenha e a abertura de um ramo dedicado à regeneração de paisagens afectadas por incêndios.
“Quero que, daqui a dez ou quinze anos, quando alguém falar de árvores em Portugal, se lembre da Celtis e do André Alves”, afirma.
Do fascínio pela arboricultura ao desafio de ser empresário
A Celtis Tree Care tem cinco colaboradores fixos, a maioria formada em Biologia, e o apoio de consultores em regime freelancer. A actuação estende-se de Lisboa e Setúbal a várias regiões do país, seja no Algarve, no Porto, na Zona Oeste, na Beira Baixa ou no Alentejo. Os clientes principais são autarquias e juntas de freguesia que procuram segurança no arvoredo das suas localidades.
O arranque exigiu um investimento robusto em equipamentos de protecção, cordas de escalada, trituradores e viaturas, num total de cerca de 30 mil euros apenas nos primeiros dezoito meses. Essa aposta permitiu à Celtis criar uma imagem diferenciada, assente na segurança, na inovação e no rigor técnico. Um dos marcos é o modelo digital próprio de avaliação de risco de queda de árvores, desenvolvido a partir das normas da Sociedade Internacional de Arboricultura e adaptado à realidade portuguesa, garantindo transparência e rapidez na comunicação com os clientes.
Natural de Lisboa, foi em Queluz que cresceu fascinado pela biologia e pelo mundo natural. Mais tarde, descobriu nas árvores a sua verdadeira vocação e juntou à formação científica a experiência de gestão de equipas e clientes exigentes. Os estudos académicos dividiram-se, num primeiro momento, em Lisboa, e, posteriormente, em Bragança, onde completou o mestrado em Agroecologia. Pelo meio viveu em Newcastle no âmbito de um programa de voluntariado europeu. Vive hoje em Alcanena, onde encontrou sossego e espaço para a família, dedicando-se a uma horta e a um pomar misto. Pai de uma menina pequena, valoriza a autonomia de gerir o próprio tempo e sublinha que a proximidade familiar foi essencial para lançar a Celtis.
André Alves praticou futebol, ginástica acrobática, kickboxing e escalada, actividades que lhe moldaram a disciplina e a resistência física necessárias ao ofício. O que mais gosta é de estar nas árvores, onde encontra uma espécie de meditação, combinando esforço físico e desafio mental. O que mais o tira do sério é a incompetência e a falta de rigor num sector onde um erro pode significar a queda de uma árvore ou um acidente grave. Entre paixões e dificuldades, diz que faria tudo de novo, porque trabalhar com árvores é, para si, mais do que uma profissão: é uma forma de vida.