“Qualquer notícia que mostre, que ainda há quem pense que a água é um recurso infinito, deixa-me incrédulo”
A tecnologia tem de servir para aproximar e não para afastar as pessoas. E quem lidera organizações tem a obrigação de não se resignar ao menu do “prima 1, prima 2, aguarde…”. A proximidade começa no atendimento.
A proximidade mexe connosco – é humana, não é falta de empatia. Infelizmente é assim que estamos “formatados”. Não é por valermos mais na nossa rua do que noutro continente, é porque o cérebro liga logo o modo “isto podia ter sido comigo ou com alguém meu”. Não desejo mal a ninguém, mas se leio uma notícia sobre uma ocorrência numa rua por onde passo todos os dias, fico logo mais alerta do que com um desastre do outro lado do mundo.
A minha terra é Santarém. Mesmo que o meu registo de nascimento esteja noutro concelho. É aqui que a vida se foi fazendo: família, trabalho, amizades, projectos. É a terra onde posso sair à rua e, em vez de GPS, uso o “bom dia, então como vai isso?”. Se é a melhor terra do mundo? Para mim é. Cada um puxa pela sua, eu puxo por Santarém – com vista para o Tejo, boa gente e muitos desafios. Não preciso de mais para ser bairrista q.b..
Admiro muito pessoas que conheço bem: autarcas, empresários, trabalhadores que ficam na região e lutam todos os dias sem fazer manchetes. Aquelas pessoas “anónimas” que seguram instituições, empresas e famílias. Depois há outras que provavelmente nunca vou cumprimentar, mas que inspiram na forma como pensam o bem comum, a sustentabilidade, a justiça e a inovação. Em comum, admiro quem tem sentido de serviço, quem não desiste à primeira dificuldade e quem consegue tomar decisões difíceis sem perder a humanidade.
O MIRANTE é um jornal que sabe onde ficam as nossas rotundas, as nossas escolas, os nossos problemas e as nossas vitórias. É uma mistura de jornal, acta de assembleia municipal e conversa de café bem informada, no bom sentido, claro. Não é um jornal que “passa por cá”. É um jornal que faz parte do dia-a-dia da região, que conhece as pessoas pelo nome próprio e que sabe que uma pequena obra de saneamento ou de água numa aldeia pode ser mais importante para quem lá vive do que um grande investimento em Lisboa.
Na maior parte das vezes, não sei quem faz, escreve e publica as informações e vídeos das redes sociais. Sabemos mais do algoritmo do que de quem está por trás das contas. É precisamente por isso que continuo a valorizar jornais com rosto, redacção, direcção e responsabilidade editorial. Nas redes sociais, qualquer um pode ser “jornal” durante cinco minutos. Um jornal verdadeiro tem de o ser todos os dias.
Acho que vale a pena pagar por bom jornalismo, tal como vale a pena pagar por bons serviços públicos. Não fico apenas nas notícias gratuitas. Quem quer informação independente tem de aceitar que isso tem custos. É uma questão de coerência com aquilo em que acredito sobre serviço público e cidadania.
Já me aconteceu, como a todos nós, ter dificuldades em ser atendido telefonicamente. Como cidadão, às vezes desespero; como responsável por uma empresa de serviço público, sei bem o lado de lá: falta de recursos, sistemas que falham, legislação que complica. Não aceito isto como “a evolução normal do mundo”. A tecnologia tem de servir para aproximar e não para afastar as pessoas. E quem lidera organizações tem a obrigação de não se resignar ao menu do “prima 1, prima 2, aguarde…”. A proximidade começa no atendimento.
Consigo utilizar bem as novas tecnologias, gosto de tecnologia e uso o telemóvel como pequeno escritório portátil. Mas também confesso que, de vez em quando, são as minhas filhas que me salvam quando alguma aplicação “decide” mudar tudo de sítio. É uma espécie de serviço de ‘helpdesk’ familiar intergeracional.
Achei este inquérito muito pertinente. Fala de proximidade, identidade e responsabilidade, temas que não são exclusivos da comunicação social, mas onde os jornais têm um papel central. Se é um bocadinho narcisista? Talvez só o suficiente para lembrar que, sem imprensa local, muitas histórias nunca chegariam a existir fora da memória de quem as viveu. E isso seria uma grande perda para a região.
Qualquer notícia que mostre, que ainda há quem pense que a água é um recurso infinito, deixa-me incrédulo. Em plena crise climática, desperdiçar água ou adiar investimentos fundamentais em saneamento e eficiência é algo que custa a acreditar. Talvez por estar ligado a este sector, estas notícias mexem comigo de forma particular.
Não sei o número exacto de pessoas que trabalham em O MIRANTE, mas imagino que sejam menos do que aquilo que o trabalho faria supor. A sensação que tenho é que o MIRANTE tem o dom da ubiquidade: está nas festas, nas inaugurações, nas polémicas, nas assembleias, nas redes… tudo isso não se faz com poucas pessoas. É uma pequena grande equipa, certamente.
Deixo uma palavra de parabéns a O MIRANTE pelos 38 anos e de agradecimento pelo papel que tem tido na afirmação da nossa região. Num tempo em que tanto se fala de “desertos” – de água, de serviços, de notícias – é importante termos o contrário: um jornal que insiste em estar presente, ouvir, perguntar e, quando é preciso, incomodar. Enquanto houver jornais como o MIRANTE, quem vive e trabalha nesta região sente que não está sozinho. E isso, para mim, vale muito.


