“O ecrã nunca substituirá o olhar, o aperto de mão ou conversa que acontece quando estamos verdadeiramente com alguém”
A verdadeira solidariedade não pode escolher geografias. O desafio é não deixarmos que a proximidade anestesie a nossa capacidade de nos importarmos com todos os que sofrem, estejam onde estiverem.
Dou sempre mais atenção à notícia da nossa rua. O que é próximo toca-nos de forma mais directa. Contudo, a vida tem-me ensinado a não hierarquizar a dor. O sofrimento de uma família na nossa rua mobiliza-nos para a acção imediata, o de dezenas noutro país deve mobilizar a nossa consciência colectiva. A verdadeira solidariedade não pode escolher geografias. O desafio é não deixarmos que a proximidade anestesie a nossa capacidade de nos importarmos com todos os que sofrem, estejam onde estiverem.
A minha terra é, e será sempre, a Carregueira. Foi aqui que vivi os momentos que me moldaram, na escola primária, na telescola e foi aqui que dei os primeiros chutos no campo Engº Vaz Gomes. Em todos os cantos, esta terra guarda uma memória. Não digo que é a “melhor terra do mundo” por vaidade, mas por gratidão. É a melhor para mim porque foi aqui que me fiz homem. O verdadeiro bairrismo constrói-se abrindo o coração a quem partilha o mesmo chão e a Carregueira é disso exemplo. Aqui, somos feitos de histórias e tradições que valem a pena contar e reviver, e de gente que vale a pena servir.
Sou por natureza um admirador de pessoas. Gosto de conhecer as suas histórias, de descobrir o que cada um tem de bom e de inspirador. A verdade é que admiro muito a bondade, especialmente quando é discreta e genuína. Nem a propósito, acabei de comentar com “admiro-te” numa publicação do Bruno Neto, um amigo que parte para mais uma missão humanitária. Pessoas como o Bruno, que dedicam a vida a servir os outros, muitas vezes longe dos holofotes, são as que mais me tocam.
O MIRANTE é como um retrato falado das nossas comunidades e da nossa região. É o jornal que regista os pequenos gestos, as festas que nos unem, as lutas que travamos e as conquistas que nos orgulham. É o jornal que reflecte a nossa identidade, que sabe e dá destaque ao avô que cultiva a horta; à filarmónica que não desiste; ao jovem que inova sem sair da sua pequena terra. É, no fundo, uma memória viva do nosso amado Ribatejo.
Para mim, a leitura atenta e verdadeira só acontece quando tenho um livro, um documento ou um jornal nas mãos. A textura, o cheiro da tinta, o virar das páginas, conduz-nos para dentro do texto, envolve-nos e exige de nós pausa e respeito. E não poderia ser de outra forma. Cresci a ver o meu pai, tipógrafo, a dar vida às palavras em folhas impressas com letras de chumbo. Enquanto houver papel, haverá leitores que lêem com o coração.
As redes sociais são, muitas vezes, um campo minado de desinformação. Locais de notícias falsas; ‘posts’ manipulados e discursos de ódio que intoxicam o debate público e que já estão a ter um impacto real na coesão das nossas comunidades. A falta de literacia tornou-se uma vulnerabilidade social. Muitos, sem capacidade para distinguir entre facto e falsidade, tornam-se alvos fáceis de quem espalha mentiras com intenção. Urge educar, alertar e contrapor com verdade antes que o ódio digital destrua pontes que levámos anos a construir e a liberdade que temos como adquirida.
Já vivi situações de atendimento frustrantes, quer em serviços públicos, quer privados. No entanto, também sou regularmente bem atendido, e faço questão de valorizar esses momentos. O que defendo, enquanto autarca e cidadão, é que o contacto humano não pode ser substituído por menus de voz ou respostas automáticas. Um bom atendimento, presencial ou telefónico, humaniza, inclui e resolve. Dou orgulhosamente o exemplo da Junta de Freguesia da Carregueira, onde os nossos colaboradores trabalham com proximidade e com prontidão para que ninguém se sinta ignorado ou sozinho perante uma dificuldade.
Confesso que hoje já nenhuma notícia me deixa incrédulo. O que sinto, por vezes, é uma indignação que me dá ainda mais força para a acção. Cada ataque à democracia, cada ameaça aos serviços públicos, cada tentativa de desvalorizar o que é de todos, reforça em mim a força de defender o que construímos juntos em 1974.
Os meus sinceros parabéns ao O MIRANTE por estes 38 anos de serviço público. Num tempo em que o ódio e a desinformação ameaçam intoxicar o espaço público, a vossa resiliência em continuar a trabalhar pela nossa região é um exemplo de esperança. Que continuem a resistir, com coragem, o mesmo apego à verdade e o mesmo compromisso com as nossas comunidades. Precisamos do vosso jornalismo para alimentar a democracia, para unir o que está dividido, para lembrar a todos que ainda há histórias que valem a pena contar com ética e alma e bairrismo.


