Entrevista | 23-02-2021 07:00

“A pandemia trouxe muita pobreza encoberta e envergonhada”

“A pandemia trouxe muita pobreza encoberta e envergonhada”
TRÊS DIMENSÕES
António Camilo

António Camilo, 61 anos, presidente da Junta de Freguesia da Golegã

António Camilo nasceu em Angola, onde viveu até aos 15 anos. Com a descolonização veio viver para São João da Pesqueira, distrito de Viseu, mas apaixonou-se por uma jovem do Entroncamento e vive na Golegã há cerca de 40 anos. Teve um tio e um primo que foram presidentes de câmara e a política sempre foi algo natural na sua família. Está a cumprir o segundo mandato à frente da Junta de Freguesia da Golegã e admite que gostava de ser presidente de câmara. Chamam-lhe o presidente dos presidentes por estar envolvido em várias colectividades da terra.

Quando cheguei a Portugal para viver foi um choque cultural muito grande. Os meus pais emigraram para Angola, onde nasci e cresci até aos 15 anos. As pessoas eram mais liberais, diziam o que queriam e não havia o espírito de calhandrice como há em Portugal. Não me recordo de vestir um casaco em Angola, excepto uma vez numa feira. O clima é maravilhoso e os locais são muito bonitos. Tive muita pena quando tivemos que vir embora.

Tive um tio e um primo que foram presidentes de câmara, por isso falar de política sempre foi natural. Ambos foram presidentes da Câmara de São João da Pesqueira, para onde fui morar quando cheguei a Portugal. Quando vim ter com um irmão que vivia no Entroncamento, apaixonei-me. Regressei ao norte mas o coração estava cá em baixo. Estagiei nas Finanças e entrei para a Câmara de São João da Pesqueira mas pedi transferência para a Golegã. Dei um grande desgosto ao meu tio mas expliquei-lhe que eram razões do coração e ele entendeu.

Toda a gente deveria fazer, no mínimo, seis meses de serviço militar. Estive apenas quatro meses na tropa, em Viseu, mas foi uma escola de vida que me deu grande aprendizagem. Nota-se a diferença entre as pessoas que fizeram tropa e as que não fizeram. Aprendemos coisas tão simples como cumprir horários e respeitar os superiores hierárquicos.

O meu tio teve grande influência quando decidi aceitar o convite para ser presidente da Junta de Freguesia da Golegã. Desde o início dos anos 90 do século passado que fui sondado para pertencer às listas mas só aceitei mais tarde, quando fui presidente da Assembleia de Freguesia da Golegã. Em 2013 fui eleito presidente da Junta da Golegã. Aceitei pelo desafio que é poder ajudar a fazer alguma coisa pela nossa terra. Gostava de ser presidente de câmara, embora saiba que é um cargo com cada vez mais responsabilidade. É uma ideia que não sei se vou concretizar. Primeiro gostaria de fazer o último mandato na junta.

Há quem me chame o presidente dos presidentes. Estive sempre ligado às colectividades e confesso que me dá mais prazer ser presidente de uma colectividade. É mais emocionante porque podemos fazer a colectividade crescer. Durante 15 anos fui presidente do Futebol Clube Goleganense (FCG). O clube estava inactivo e voltamos a dar-lhe vida. Actualmente sou presidente da assembleia-geral do FCG; presidente da assembleia-geral da Casa do Benfica; presidente do conselho fiscal nos bombeiros e presidente do conselho fiscal da Santa Casa da Misericórdia da Golegã. Sobra-me pouco tempo mas gosto de poder ajudar. É muito complicado ver as colectividades fechadas por causa da pandemia.

Os presidentes de junta deveriam ser mais valorizados. O Estado faz leis iguais para todos os municípios e todas as juntas de freguesia do país. Não percebe que uma junta do interior ou de meio mais pequeno é diferente de uma junta de um grande centro urbano. Faz leis a régua e esquadro quando o território não é igual. Tem que adaptar as leis ao território.

Temos casos de pobreza envergonhada e encoberta. As pessoas não assumem que estão a passar dificuldades por causa da pandemia. Vamos sabendo uns pelos outros por sermos um meio pequeno e o nosso sistema local de assistência social funciona muito bem. Estamos sempre em contacto e somos capazes de arranjar cabazes de emergência para ajudar quem não tem recursos financeiros e também para quem não tem dinheiro para medicamentos.

Ser pai é diferente. Quando a minha primeira filha nasceu fiquei muito emocionado porque naquela altura não havia ecografias e só soube o sexo no nascimento. Sempre quis ter uma menina e fui abençoado com quatro. Os pais educam mais do que os avós. Quando a minha filha me contou que ia ser avô andei ali um mês a digerir a notícia, porque me achava muito novo, mas depois foi uma loucura esperar pelo nascimento do meu neto. Estão sempre a dizer que estrago o Simão com mimos. Lá em casa há sempre um chocolate guardado para quando ele lá vai. E tenho outro neto a caminho. É a maior felicidade.

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