Benavente está em autogestão e já nem se sabe quem é presidente da câmara
Sónia Ferreira é vereadora do PSD na Câmara de Benavente desde 2021 e está disponível para voltar a ser candidata à presidência do município nas próximas eleições autárquicas.
Acredita que é desta que vai chegar ao poder sem coligações com o Chega. A consultora de comunicação numa empresa de energias renováveis diz que não há estratégia na actual gestão comunista, falta proactividade e, neste momento, com a doença do presidente, a câmara está em autogestão repartida com a vice--presidente, reconhecendo que é mais fácil de dialogar com Carlos Coutinho. Católica praticante, que se aproximou ainda mais de Deus com a morte da mãe e da filha, critica a falta de voz do vereador do PS e diz que era de esperar mais competência do presidente.
Está satisfeita com o trabalho do PSD em Benavente? Quase todas as semanas levamos à reunião de câmara as necessidades que os munícipes nos fazem chegar. O nosso trabalho é contínuo apesar de não estarmos a tempo inteiro. Temos as nossas profissões e, por isso, é mais difícil estar no terreno do que quem está a tempo inteiro, mas levantamos e apresentamos propostas para melhorar as condições de vida da população.
E como é que analisa o trabalho da CDU? A Câmara é governada pela CDU desde o 25 de Abril e se existem lacunas a ela se deve. Até há dois mandatos tinham maioria absoluta no executivo. Mas com a geringonça invertida e a falta de voz do PS no executivo ficou tudo na mesma e consegue aprovar as propostas sem discussão. Não haver maioria é bom para quem está na oposição porque podemos negociar e conseguirmos que sejam aceites propostas que fazem sentido.
Vê a experiência autárquica do presidente da câmara como uma vantagem? O grande problema deste executivo é falta de estratégia. O presidente da câmara está lá desde 1997 e era de esperar mais conhecimento e qualidade no exercício das suas funções. Temos vários problemas ligados à Saúde, Educação, às zonas industriais e o comércio está a desaparecer.
Como é que vê o facto de Benavente ser o município da Lezíria que mais cresce em população? Era expectável que se antevissem os problemas e que se desse mais qualidade de vida às pessoas que já cá vivem há muito tempo e às que estão a chegar. Benavente pode ser um arredor de Lisboa com qualidade. Pode ser a Oeiras ou a Cascais da região. Temos dois rios que atravessam o município, zonas de golfe e zonas verdes, a 30 minutos de Lisboa, que podiam ser aproveitadas de outra forma.
O crescimento demográfico contribui para a descaracterização do concelho? Pode contribuir nas tradições ribatejanas, que não dizem nada a quem vem de fora. Mas temos de integrar as pessoas e dar-lhes condições. Quem escolhe o concelho para morar não tem escolas para os filhos e levam-nos para os sítios onde trabalham. Aos fins-de-semana levam-nos para brincar onde existem parques infantis, jardins e espaços de qualidade. Assim estamos a tornar o município num dormitório.
A vereadora Catarina Vale tem assumido a câmara devido à doença do presidente. A gestão está bem entregue? Temos um presidente que está e não está. Uma vice-presidente que ou é vice ou é presidente. Uma câmara municipal não pode estar em autogestão. Benavente já não é um município pequeno e exige trabalho e dedicação a tempo inteiro e as pessoas têm de estar nas suas condições plenas para que isso aconteça. Mas respeitamos as condições de saúde do Carlos Coutinho.
Fazia sentido o presidente Carlos Coutinho deixar o cargo? Não me compete responder a essa questão. Mas temos um presidente que supostamente vai trabalhar a meio tempo mas que não vai às reuniões de câmara nem às assembleias municipais. A oposição e a população nem sabem neste momento quem é o presidente. A Catarina Vale vem na linha de continuidade, mas em relação ao Carlos Coutinho é uma pessoa mais difícil de dialogar e trabalhar. Com ele conseguimos chegar a mais consensos.
O bairro social do Porto Alto e o aeroporto
O PSD tem referido que o executivo omite informações. Sempre foi assim. Viu-se na questão dos moradores do Porto Alto. O executivo levou à assembleia municipal a quarta revisão orçamental e a estratégia de habitação. Questionámos acerca da diferença que havia de mais de 200 mil euros para a aquisição de prédios urbanos. Foi dito que o terreno era para um parque urbano. Posteriormente vai a reunião de câmara a compra urgente desse terreno. Abstivemo-nos porque faltavam os documentos de avaliação do terreno. Passado um ano e meio quando este assunto foi novamente à reunião era a propósito da candidatura ao IHRU.
Como é que classifica essa situação? Considero de má-fé, porque o terreno foi comprado para um determinado fim e depois é utilizado para outra estratégia. Se fosse de boa-fé tinham dito que havia falta de terrenos para compra, ou a custos muito elevados, e que iam usar metade do terreno do Porto Alto para habitação. A partir de agora vamos questionar tudo e todos.
Acredita que o aeroporto será uma realidade no Campo de Tiro na freguesia de Samora Correia? Não sou técnica, mas para mim é das melhores localizações. Não por uma questão local, mas por ser o melhor para o país. É uma oportunidade para o município se assim o quiser aproveitar. Mas temos outras soluções no distrito, como Santarém. O PSD distrital chegou a falar em Tancos numa solução Portela+1. São tudo localizações que trazem oportunidades para Benavente.
A vontade de ganhar sem coligações, a saúde, a falta de proactividade e os líderes do PSD
Vai ser candidata nas próximas autárquicas? Faz coligação com o Chega se disso depender a vitória? Tenho essa vontade e disponibilidade e acredito que daqui a dois anos o PSD pode ser poder na Câmara de Benavente. O objectivo é ganhar com maioria absoluta e não pondero coligações.
Vê-se num papel como o do vereador do PS? Não aceito nem compreendo como é que qualquer partido que entre numa coligação se anule completamente. Se hipoteticamente estivesse numa situação dessas iria exigir muito mais de quem está a governar. Não me ia esquecer de tudo o que prometi aos eleitores e negociava. A população ganhava mais sem esta coligação com o Partido Socialista.
Onde se imagina daqui a dez anos? Presidente da Câmara de Benavente e que este município esteja muito diferente do que está hoje em dia.
O que faz falta ao município de Benavente? A saúde. Sabemos que é um problema transversal e da responsabilidade do Ministério da Saúde, mas o que se vê é o arrastar das situações e falta de proactividade. Estamos à espera de uma reunião com o ministro da Saúde e é a Comunidade Intermunicipal a marcar. Há sempre uma dependência. Não é o presidente da câmara que tem iniciativa.
Mas a câmara aprovou incentivos para captar médicos… Aprovou-se em 2021 o programa e esteve mais de seis meses na gaveta porque não foi publicado em Diário da Republica. Há uma falta grande de proactividade. São quase 12 mil pessoas sem médico de família. No meu agregado familiar ninguém tem médico de família e eu não tenho há 18 anos. O que se está a criar é uma saúde para ricos e outra para pobres. A juntar a isto há um grave problema de mobilidade. Quem mora afastado da sede de concelho não tem transporte.
Montenegro, Passos Coelho e o crescimento do Chega e da IL
Luís Montenegro é o líder nacional que o PSD precisa? Penso que sim. É uma pessoa muito bem preparada e que tem muitos anos de líder parlamentar, incluindo nos anos da Troika em que a situação financeira era complicada.
Trabalhou com Pedro Passos Coelho. Consegue estabelecer alguma comparação entre os dois? São duas pessoas muito bem preparadas e com objectivos definidos do que querem para o país. Estiveram juntos no Governo e faziam uma excelente equipa. Faltou a Pedro Passos Coelho a retribuição aos portugueses do que contribuíram para que as contas ficassem em ordem. Hoje, as pessoas começam a perceber porque é que na altura foram tomadas certas decisões. Se não tivesse sido assinado o memorando de entendimento não havia dinheiro para pagar os salários na função pública.
Preocupa-a o crescimento de partidos como o Chega ou Iniciativa Liberal? Não vejo com bons olhos tudo o que é extremo, seja à esquerda ou à direita. Mas a verdade é que os extremos estão a ganhar força em toda a Europa porque dizem o que é fácil de dizer, o que as pessoas gostam de ouvir.
A morte da filha e a ligação a Deus
Que papel tem Deus na sua vida? Ao contrário de outras pessoas que passaram por determinados problemas da vida e se afastaram, vejo a minha fé reforçada. Desde pequena que estou habituada a ir à igreja. A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) foi vivida de uma forma muito descontraída e é isso que falta ao povo português. Temos muito o fado e o velho do restelo. Tivemos franceses em Benavente, que vivem a religião de forma mais alegre e solta. Ganhávamos em viver a nossa vida de uma forma mais alegre e a agradecer mais.
Transmite essa fé às suas filhas? As minhas filhas vão comigo à igreja desde que nasceram. Com a mais velha eu saia a transpirar da igreja porque não queria que ela chorasse e fizesse barulho. Depois percebi que é uma criança e é natural fazer barulho. Temos um pároco fantástico com as crianças. Para elas, ir à igreja não é uma seca nem uma obrigação, mas um local de convívio onde estão pessoas que conhecem. É o amor…
Tem duas filhas… Tenho três filhas. Tive uma septicemia e a minha filha Teresa nasceu prematura. Esteve uma semana internada, mas acabou por falecer há sete anos.
Como é que lida com esta perda? Se Deus não estivesse tão presente na minha vida seria mais difícil. Foi uma altura bastante complicada da minha vida. Perdi a minha mãe com 61 anos e seis meses depois perdi a minha filha. Foi uma altura de desamparo total, mas tenho um marido que me apoia em tudo. Estas perdas não são só para a mulher. O meu marido ia ver-me ao hospital e depois ia a outro hospital ver a Teresa. Ainda voltava para casa para tratar da nossa bebé de dois anos e meio. Muitas vezes esquecemos o papel do homem quando falamos nestas perdas. Muitos casais sofrem um desgaste e afastam-se, mas connosco foi o contrário.
Os investimentos na JMJ foram bem feitos? Podemos discordar de muitas adjudicações directas que foram feitas. Mas não nos podemos esquecer que a Câmara de Lisboa mudou a presidência e o presidente Carlos Moedas já apanhou o processo em andamento. Havia muito para fazer em pouco tempo. Às vezes para que as coisas aconteçam em Portugal é preciso que haja qualquer iniciativa. O que fica é o sucesso que foi e as palavras do Papa de que foram as jornadas mais bem organizadas. O retorno para os municípios é maior que os investimentos que foram feitos.
A consultora que foi assessora no Governo de Passos Coelho
Sónia Ferreira vive em Benavente e é licenciada em Relações Internacionais pela Universidade Lusíada de Lisboa. Desempenha funções como consultora de comunicação e relações públicas na Firstrule, uma empresa portuguesa na área das energias renováveis. Foi professora na Escola Profissional de Hotelaria e Turismo de Lisboa, gestora de clientes empresariais numa sociedade de mediação de seguros. No Governo de Passos Coelho foi assessora de imprensa do secretário de Estado do Desporto e Juventude e assessora de comunicação digital nos gabinetes do ministro dos Assuntos Parlamentares e do ministro do Desenvolvimento. Trabalhou ainda como gestora de comunicação e relações institucionais na Fundação da Juventude.
Na vida política, Sónia Ferreira desempenhou desde 2008 funções de presidente e vice-presidente da Comissão Política de Secção do PSD Benavente e foi secretária da mesa da Assembleia Distrital do PSD Santarém. De 2009 a 2017 foi autarca do PSD na Assembleia Municipal de Benavente e vereadora do PSD em regime de substituição na Câmara Municipal de Benavente. Desempenhou ainda funções de deputada à Assembleia da República. Desde as últimas autárquicas é vereadora na Câmara de Benavente em conjunto com Luís Feitor.