Com a idade o coração pode bater mais lento mas o pacemaker ajuda a ter uma vida normal
Hélder Santos, cardiologista no Hospital CUF Santarém.
Quem tem um ritmo cardíaco muito lento precisará de um pacemaker para ajudar a bombear o sangue rico em oxigénio para o resto do corpo. Esta situação, designada de bradicardia, acontece essencialmente em função da idade. Ou seja, a partir dos 70 anos há o risco de precisar de um dispositivo, mas a franja da população afectada é mínima, por exemplo, em Santarém será de um a dois por cento. A bradicardia pode ser grave por isso é essencial não ignorar sinais como cansaço, tonturas, falta de ar ou até desmaios. O questionário médico e a observação na consulta de Arritmologia - disponível no Hospital CUF Santarém - são o primeiro passo para o diagnóstico de uma bradicardia e identificação da sua potencial causa. Com o pacemaker, que dura oito anos, altura em que a bateria é trocada, a pessoa pode fazer uma vida totalmente normal e com maior qualidade.
O que leva a que um doente tenha que usar pacemaker?
Há múltiplas situações que levam a que uma pessoa tenha de usar um pacemaker. Normalmente o que acontece, ou que está associado, e que faz a pessoa procurar um médico cardiologista, é uma bradicardia, ou seja uma frequência cardíaca inferior em relação à população em geral. Depois há uma franja mínima da população que tem miocardiopatias (doenças que afectam o músculo cardíaco) ou problemas genéticos, que podem levar a que precisem deste dispositivo.
E quais são os factores que fazem com que se tenha uma bradicardia?
Para a maioria dos doentes o principal factor de risco é a idade. É tão simples quanto isso, simplesmente a idade. A partir dos 60 anos já há pacientes com pacemaker. A franja da população a partir dos 70 anos é a que tem mais pessoas a precisarem deste dispositivo. Esta situação afecta tanto homens como mulheres em proporções mais ou menos idênticas.
Isso tem a ver com o facto de o organismo já não ter as mesmas capacidades?
Exactamente! É isso que tento explicar sempre aos doentes. Quando somos mais jovens o nosso organismo consegue rapidamente responder a tudo o que fazemos. Mas com a idade o nosso coração fica mais cansado e demora mais tempo a fazer certas coisas. É isto que acontece, o coração fica a bater mais lentamente.
E costumam aparecer situações mais precoces por exemplo aos 30 ou 40 anos?
Podem aparecer. Já tivemos jovens de 20 anos com bradicardias significativas. Não é frequente mas às vezes acontece. O mais frequente é a partir dos 70 anos, mas há jovens com situações significativas.
E isso acontece por razões genéticas ou por outros factores?
Depende de cada jovem, de cada situação. Alguns é por razões genéticas e isso é mais identificável. Outros é, normalmente, devido a práticas desportivas muito intensivas. No entanto, nos atletas de alta competição, apesar de terem bradicardia, o organismo deles adapta-se ao esforço e se precisarem de pacemaker será a partir dos 50 ou 60 anos.
As bradicardias e a necessidade de utilização de pacemaker afectam muito a população?
É uma percentagem mínima. Por exemplo, na população de Santarém será de um a dois por cento. Apesar de tudo não há uma grande percentagem.
Qual foi a evolução destes dispositivos, quais são as diferenças?
Há dez anos os pacientes tinham de vir cada dois ou três meses à consulta para avaliação. Os pacemakers foram reduzindo o tamanho, que é de quase um terço. Agora o próprio pacemaker é capaz de perceber se o doente está a precisar de fazer mais alguma coisa e ele próprio, com os algoritmos que programamos, trabalhar mais ou menos. A grande evolução é a monotorização remota e agora os doentes vêm a cada seis meses à consulta. Para o doente esta evolução trouxe uma segurança maior.
Uma pessoa com pacemaker pode fazer exercício?
Deve fazer exercício. A maior parte dos doentes não pode é fazer de forma competitiva e intensa. O pacemaker só funciona se o coração estiver a funcionar abaixo do que é normal.
Há fármacos que podem levar a que a pessoa tenho um ritmo cardíaco mais baixo?
Na área da arritmologia há muitos medicamentos que baixam a frequência cardíaca. A bradicardia pode ser secundária a alguns medicamentos.
Quais são os principais sinais a que a pessoa deve estar atenta para procurar ajuda?
Às vezes o que verificamos é que a pessoa até nem tem sintomas e é através de exames que percebemos que alguma coisa pode estar errada. Normalmente os primeiros sintomas são o cansaço, depois vem a dificuldade respiratória, depois as tonturas, a sensação de que vai desmaiar. O sintoma mais grave é quando a pessoa tem uma síncope ou perda de conhecimento.
As pessoas valorizam estes sinais tanto quanto deviam?
No que toca ao cansaço as pessoas normalmente associam esse sintoma a outras situações e não pensam que a causa principal possa ser o coração. Quando em saúde há alterações temos de pensar que há alguma coisa que pode estar errada. Há doentes que ficam bradicárdicos no momento em que ficam cansados. Outros têm um cansaço progressivo, que se vai instalando. Depende muito do organismo e do contexto.
Como é que se detecta a bradicardia e a necessidade de se usar pacemaker?
O eletrocardiograma é o primeiro exame a fazer. Por vezes não é suficiente porque só dá os dez segundos do ritmo cardíaco. Nesses casos temos de fazer o Holter durante 24 horas para ver como o coração se comporta. O ecocardiograma também é importante para se perceber a contratilidade do coração porque se ela for má temos que por um dispositivo mais potente ao pacemaker. O ecocardiograma é importante para colocarmos logo o dispositivo certo.
Qual foi a evolução em relação à instalação do pacemaker?
O procedimento não mudou muito nos últimos anos, mas agora é menos evasivo para os doentes no sentido em que a colocação do dispositivo é feito com apoio da ecografia para ir logo directamente ao sítio certo. Há mais eficácia e mais segurança.
António Arraiolos com pacemaker continua a cultivar a horta
António Arraiolos, de Alpiarça, queixava-se de cansaço e numa consulta de arritmologia no Hospital CUF Santarém conformou-se que tinha uma bradicardia. Aos 89 anos faz uma vida normal com o aparelho. Continua a ter uma horta que trata frequentemente, trabalhando inclusivamente com o motocultivador.
Com indicação para colocação do dispositivo aproveitou-se o facto de também estar para ser operado a uns problemas de pele na zona do peito e foi-lhe colocado o pacemaker, em 2018, no Hospital CUF Santarém. António Arraiolos confessa que o aparelho não o incomoda e que com ele faz a sua vida normal e já não sente o cansaço que sentia.
António Arraiolos foi motorista de pesados de transporte de combustível e foi um dos fundadores da ARPICA - Associação de Reformados, Pensionistas e Idosos do Concelho de Alpiarça, da qual foi presidente.