“Existem muitas associações que não apresentam trabalho e pedem subsídios”
Com uma vida ligada ao teatro, Paulo de Cira fundou o grupo 7 Lemes em Vila Franca de Xira, desafiado pela Associação Alves Redol. O actor e encenador está a estudar a história do teatro no concelho e defende que os grupos deviam ser mais unidos e não olharem só para o seu umbigo.
O teatro vive da palavra e a palavra por vezes incomoda. Por isso é que o teatro tem sido tratado ao longo dos anos da pior forma. A opinião é de Paulo de Cira, actor, encenador e coordenador para a área do teatro na Câmara de Vila Franca de Xira.
Paulo de Cira diz não ter nada contra os grupos profissionais de teatro mas considera que devem dedicar alguma da sua produção ao concelho e criar espectáculos para a infância e levá-los a todas as escolas. Quanto aos apoios municipais para o associativismo, o encenador diferenciava os apoios para a cultura de outras actividades. Mas diz que se as pessoas estão descontentes com o actual modelo podem demonstrá-lo no dia em que forem votar.
“A minha visão sobre o associativismo no geral é que existem muitas associações que não apresentam trabalho e pedem subsídios. E isso tem de ser parametrizado. Nesse contexto, uns vão achar que foram injustiçados e outros justiçados. Mas muitos quando recebem muito dinheiro não dizem nada nem se preocupam com os que recebem poucas verbas”, declara.
Ligado ao teatro desde os 16 anos e à beira de fazer 60, Paulo de Cira está a levar a cabo uma investigação sobre a história do teatro no concelho de Vila Franca de Xira para escrever um livro sobre o tema. Em 1930 só a vila de Vila Franca de Xira, hoje cidade, tinha três grupos de teatro: o Grémio Artístico Vilafranquense (hoje Ateneu), o Afonso Araújo e o Clube Vilafranquense, este último que manteve a sua actividade teatral durante meio século. As freguesias de Alhandra e de Vialonga tinham um grupo de teatro cada e no final dos anos 40 apareceu um grupo em Alverca do Ribatejo.
A tese que defende refere que o teatro começa a definhar no concelho de Vila Franca de Xira porque as pessoas ligadas ao meio começaram a envelhecer, outras faleceram e não houve renovação. Considera que os grupos de teatro hoje deviam ser mais unidos, promover o diálogo e ver as peças uns dos outros. “Não se pode criar uma comunidade teatral sem que as pessoas ligadas ao teatro deem o primeiro passo. São elas que têm de criar os primeiros elos e trazer pessoas para o teatro. Quem faz teatro há mais tempo devia ser mais unido e não olhar só para o seu umbigo e fazer a sua casinha, apenas preocupados com o seu espaço”, diz.
Paulo de Cira foi mentor na primeira turma de teatro da Escola Professor Reynaldo dos Santos, em Vila Franca e Xira, quando surgiu essa disciplina. Na mesma altura fundou o grupo Teatro do Povo, na Casa do Povo de Vila Franca de Xira, e mais tarde passou pelo grupo Esteiros como actor. Esteve no Teatro Ibérico de Lisboa e em 1999 fez parte dos quadros do teatro ACERT, em Tondela. As ligações familiares a Vila Franca de Xira fizeram-no regressar às origens e começou a trabalhar na câmara municipal. Desenvolveu trabalho no serviço de promoção de leitura e literacia e durante 14 anos manteve de pé um espectáculo de teatro para a infância.
Teatro dos 7 Lemes, o grupo de VFX
A ausência de um grupo de teatro na cidade de Vila Franca de Xira levou Paulo de Cira a aceitar o repto da Associação Alves Redol e criar há um ano o grupo de teatro 7 Lemes. Sem sala própria para ensaiar às segundas e quartas-feiras, das 21h30 às 00h00, o grupo usa muitas vezes as instalações do Clube Vilafranquense. A peça “Enclausuradas” está a ser exibida dentro e fora do concelho de Vila Franca de Xira. O grupo está também a montar “As Más” com sete pessoas em cena e o objectivo é estrear no início de Dezembro no Clube Vilafranquense.
Com um orçamento quase nulo, o 7 Lemes poderá candidatar-se de futuro ao Programa de Apoio ao Movimento Associativo da câmara municipal. Mas para o encenador nem tudo é por dinheiro mas sim pela vontade de fazer acontecer. Se tivesse possibilidade, proporcionava aos grupos de teatro um espaço próprio para desenvolverem as suas actividades. “Existem black boxes onde se pode fazer teatro. São espaços pequenos onde não é necessário muito investimento. Seria também uma solução para os jovens terem espaços para criar. Este espaço podia ter várias sessões e criar o hábito no espectador. É preciso é vontade”, considera.
Desde 1974 que não tem sido opção do poder político local criar um teatro municipal. E ao longo dos anos também nunca houve intenção de recuperar espaços, como o Teatro Salvador Marques, em Alhandra. A nível escolar o teatro também não é uma prioridade, assim como a música que desaparece no 2º ciclo do ensino regular. “O objectivo nas escolas não é formar artistas é criar públicos. Não temos público para sustentar as actividades e esse é o problema”, lamenta.