David Pato Ferreira: sou contra um aeroporto em Alverca; estamos esganados com falta de acessibilidades
Licenciado em Economia e gestor de negócios na área farmacêutica, David Pato Ferreira está a cumprir o seu segundo ano como vereador da oposição na Câmara de Vila Franca de Xira pela Coligação Nova Geração (PSD/PPM/MPT).
Quer até final do mandato deixar uma marca de empenho, seriedade e respeito institucional, mas lamenta que muita gente ainda desconheça que muitas ideias que o PS tem implementado tenham saído de propostas da coligação. Recusa futuras coligações com o Chega e avisa que com o CDS só se Filomena Rodrigues não estiver na liderança da concelhia. Tem 31 anos, é casado, tem uma filha e o desporto é outra das suas paixões. Na juventude frequentou a festa do Avante antes de perceber que era o PSD que tinha a pluralidade de ideias que procurava. Nesta entrevista a O MIRANTE fala dos temas estruturantes do concelho, da saúde à economia e turismo, incluindo a exigência de que o Futebol Clube de Alverca, a entidade que mais apoios recebe da câmara, seja mais transparente sobre as suas contas.
Como tem sido o seu dia?
Hoje é sexta-feira, mas só costumo entrar de fim-de-semana ao domingo à tarde. Trabalho na indústria farmacêutica, na área do desenvolvimento de negócio. Percorro todo o país. Tento encaixar estas dinâmicas todas num só dia sendo a minha grande prioridade ter tempo para a minha filha. Vou sair desta entrevista e ainda vou a Oeiras ao escritório. À noite ainda tenho um congresso de endocrinologia e amanhã (sábado) já estou a trabalhar novamente. Não me posso queixar com falta de trabalho.
O que mudou na sua vida desde que assumiu responsabilidades políticas?
Tenho menos tempo disponível, mas também reconheço que mudou a minha exposição e das pessoas que me rodeiam. É algo para o qual não estamos preparados. Estava preparado para ser candidato a uma câmara desta dimensão, mas não estava para o facto das pessoas que me são próximas lerem coisas sobre mim menos positivas. As redes sociais, nesse aspecto, desajudam muito. O que interessa é que, quem gosta de nós, sabe que estamos a servir de corpo e alma.
Não está desiludido com a política?
Quem faz a política pela política não se desilude, é uma actividade muito nobre. Tornamo-nos mais realistas, embora ainda tenha uma visão um pouco idílica. É muito difícil mudar o status quo. É muito difícil quem se habituou à mediocridade durante tantos anos, perceber que não tem de ser sempre assim.
O que trouxe de novo para Vila Franca de Xira?
Do ponto de vista de postura tento sempre estar muito preparado. Não entro em discussões de cor, tento ter profundidade nas minhas intervenções. Em termos objectivos conseguimos trazer para a discussão, ao fim de mais de 20 anos, a possibilidade de isentar o IMT a jovens até aos 35 anos. No bairro da Mata, um muro que estava a cair para cima das pessoas está a ser corrigido porque temos insistido numa solução. Este ano vamos ter mercado de Natal porque nós fizemos esforço para que isso acontecesse. Temos insistido, com grandes progressos, na digitalização da câmara municipal, nomeadamente com a criação de uma aplicação…
Ser oposição em Vila Franca de Xira não é ingrato?
Depende do ponto de vista. Felizmente temos conseguido negociar a introdução das nossas propostas. O problema é a falta de reconhecimento na rua que, bem sei, faz parte do caminho. A parte ingrata é as pessoas pensarem que estas medidas vêm todas do Partido Socialista, de quem está no poder, quando não é assim. A máquina de quem tem poder é sempre mais forte do que a da oposição.
Dois anos depois das eleições Fernando Paulo Ferreira já se emancipou?
Trouxe uma diferença gritante, de postura e uma equipa mais competente que a anterior. Mas não trouxe capacidade, ideias e o pensamento estratégico para fazer as coisas acontecer. E tem condições para isso porque não sofre de oposições que sejam forças de bloqueio. Neste mandato não queremos pelouros.
“Trazer ensino superior é fundamental”
Já assistimos a cinco revisões de orçamento este ano. Isto quer dizer que o PS está a deixar todas as obras para o final do mandato?
Tendencialmente o PS empurra as obras para a segunda fase do mandato. Mas estas alterações permutativas são falhas de planeamento. É uma forma de gestão com a qual não consigo compactuar: o navegar à vista. Se de dois em dois meses estamos a fazer alterações ao orçamento é porque não temos planeamento a médio prazo. Isso não dá estabilidade nem previsibilidade. É incompetência na gestão.
Admite um dia incorporar o Chega na coligação?
Não. Defendemos uma forma de estar na política local que não se coaduna com aquela que tem sido a forma de estar do Chega, a da terra queimada, da impreparação e de apresentarem propostas com dados errados. Não posso amanhã ser presidente de câmara e ter na minha vereação pessoas mal preparadas. Comigo têm de estar os melhores e entrarão na coligação todas as pessoas, não socialistas, que queiram fazer um projecto alternativo para o concelho.
Incluindo Filomena Rodrigues (do CDS)?
Há líderes do CDS com quem hoje não trabalho. Se os líderes do CDS forem na data das eleições os mesmos que são hoje, o CDS não fará parte da coligação. O que não invalida que se o CDS ganhar juízo e tiver líderes disponíveis para serem sérios com o que acordam connosco então poderá vir a estar. O PSD é o principal partido da oposição no espaço não socialista/comunista do concelho e assim continuará a ser. Se amanhã fosse presidente de câmara convidava todos os partidos a terem pelouros.
Para ter os inimigos por perto?
Não. No poder local há espaço para toda a gente contribuir. Para mim não importa se a pessoa é da CDU, do PSD ou do Chega. Tem a ver com a pessoa. É competente, tem integridade, seriedade e lealdade? Então tem espaço. É uma pessoa que ataca o carácter pessoal e tende a ser pouco sério na discussão? Então não tem espaço. Nuno Libório (CDU) e Filomena Rodrigues são dois rostos que não teriam esse espaço.
Já sabe o que mudar no programa eleitoral para as próximas eleições?
Vamos reforçar a aposta na necessidade de captar ensino superior para o concelho. É fundamental. Agilizar e aproximar o poder administrativo, centralizar os serviços camarários e reduzir impostos. Melhorar as acessibilidades e criar um plano transversal de estacionamento para o concelho é fundamental, com estacionamento de superfície e subterrâneo, que retire os carros dos passeios. Temos de agilizar os processos de urbanismo e avançar com os nós de acesso à A1.
Vila Franca Centro, quartel da GNR da Castanheira e escola básica de Vialonga são problemas por resolver. É um embaraço para os políticos?
É um embaraço para quem decide. No caso do VFC são 80 proprietários, vai ser um processo difícil e ainda não há luz verde. Para nós a solução para o VFC passa pela centralização de todos os serviços camarários naquele edifício. A câmara é dona de um conjunto vasto de edifícios na cidade. Se comprássemos o VFC, bastava fazer obras para o adaptar a uma superfície comercial e onde os munícipes tivessem as Finanças, uma Loja do Cidadão e os serviços municipais e depois vendíamos os restantes espaços espalhados pela cidade. Com isso teríamos capital para suportar o investimento.
Apostar tudo na logística é boa solução?
Não. O concelho cresceu em cima de indústrias diferenciadoras e não devemos ver o diabo na logística e na indústria. Mas defendo que a logística tem de ser na Castanheirado Ribatejo, não no Sobralinho ou em Alverca do Ribatejo, onde temos contentores a fazer uma parede. Parece o muro das lamentações.
A associação empresarial ACIS devia estar mais presente nas ruas de VFX e a fazer acções com o comércio local?
Fico sempre triste quando há associações relevantes para a dinâmica económica e corporativa do concelho que foram perdendo relevância ao longo do tempo. Como a ACIS há outras, até de carácter desportivo. A ACIS perdeu relevância e não é hoje a associação que foi outrora, de dinamização do comércio e porta-voz junto dos órgãos autárquicos. Resta saber porque é que isso aconteceu. É importante que as associações vivam, resistam e desenvolvam a sua actividade de forma independente dos partidos políticos e que estes não tenham a tendência de as instrumentalizar.
E a AERLIS, uma associação que em VFX raramente aparece?
Nem a conheço nem nunca tive interacção com ela.
Aeroporto complementar à Portela em Alverca, sim ou não?
Sou frontalmente contra um aeroporto em Alverca. É uma má solução para o concelho e as pessoas de Alverca. Estamos esganados com falta de acessibilidades por isso imaginem meter aqui um aeroporto. Alverca não se posicionou para acolher os voos executivos e permitiu-se deixar de ser a grande cidade da aeronáutica em Portugal. Onde estão as escolas de aviação? O ensino superior que possa ter um pólo de aviação? Há um curso de piloto de aeronaves na Universidade Lusófona no Campo Grande, em Lisboa. O pólo não podia estar em Alverca?
Um concelho como VFX não merecia ter um Politécnico?
É uma das nossas grandes bandeiras. Temos vantagens que mais ninguém tem na Área Metropolitana de Lisboa (AML). Um Politécnico na antiga escola da Armada seria perfeito: tem um apeadeiro próprio, está junto do rio, das piscinas de Alhandra, tem uma piscina própria, um campo de futebol e até um heliporto. As condições estão todas aqui e o imóvel é da câmara.
É uma questão de lobbies de Lisboa?
Sim e com incapacidade de fazer lobby ao contrário. Não temos capacidade de influenciar a vinda dos politécnicos para cá. Temos um dogmatismo ideológico gritante. Santarém tem o ISLA e é sabida a dinâmica que isso traz à cidade. Aqui temos um sítio óptimo para isso e não o usamos. É a incapacidade de influenciar decisões nas grandes instituições públicas e privadas. Porque é que o pólo de medicina da Universidade Católica foi para Sintra em vez de vir para cá?
VFX tinha mais a ganhar se pertencesse ao Turismo do Alentejo e Ribatejo?
Não ganhamos nada em estar na AML. Somos o único concelho do país entalado em três regiões: AML, Ribatejo e Centro. Não ganhamos escala nem maior comparticipação dos fundos europeus. No turismo mais se nota embora aí falte um plano estratégico. Se a promoção do turismo do concelho funcionasse melhor no Alentejo/Ribatejo então sim, prefiro. O Turismo de Lisboa para nós não tem funcionado. Mas não podemos sacudir a água do capote e dizer que a culpa é deles na totalidade. O que temos feito localmente? Temos um departamento de turismo que se esmifra a trabalhar mas falta-lhes orientação estratégica política. Porque é que em relação à Feira de Outubro, não enobrecemos a festa? Somos a Golegã dos pobrezinhos. Porque é que Santarém tem uma Feira de Gastronomia brutal e nós só temos a feira das sopas no mercado? Porque é que Santarém tem a FNA e nós que dizemos que somos um concelho do Ribatejo não temos nada sobre agricultura…
Como vê o projecto da Infraestruturas de Portugal de alargar a linha de comboio entre Alhandra e VFX?
Sou contra o projecto. O enterramento da linha é a solução. A câmara não tem poder de decisão sobre isto mas podemos e devemos exigir contrapartidas se nos impingirem esta solução.
Futebol Clube de Alverca tem de prestar contas
Como vê o facto do Futebol Clube de Alverca ser o clube que mais dinheiro recebe de apoios municipais?
Em determinado momento o clube foi mais próximo da gestão e aconteceram coisas com mais facilidade do que com outras associações. O FCA tem de ser mais transparente e de prestar contas porque recebe fundos públicos, da câmara e de outras entidades públicas. É obrigatório mostrar essas contas. E não as mostra porquê? Tem de apresentar aos sócios mas sendo uma instituição de utilidade pública tem de as mostrar e não custa nada meter as contas no site para todos verem.
Como vê o impacto que a saída da SAD do União Desportiva Vilafranquense teve na cidade de VFX?
A SAD só apareceu com aquela facilidade porque o clube estava e está de rastos com uma dívida ao Estado enorme que o esgana e não permite ter contas no banco, ter órgãos eleitos nem receber subsídios da câmara. O que aconteceu ali foi uma brincadeira digna de um caso de polícia. Quem é que recebeu o dinheiro da venda dos 10% da SAD se o clube não tem contas bancárias? Como alienou os 10%? Quem assinou a alienação porque a comissão administrativa não é um órgão? Se o UDV já tinha um problema com a dívida meteram-se agora numa outra embrulhada jurídica e fiscal tremenda. O UDV teve uma oportunidade de ouro para resolver o problema da dívida porque a SAD tinha dinheiro para resolver o problema. Sobre isto está tudo amorfo na cidade e no poder político.
“Ministério tem de entregar o hospital a quem o saiba gerir”
É uma das vozes mais críticas da actual gestão do Hospital de VFX. Porque é que a unidade está a funcionar tão mal?
É, em primeiro lugar, um problema da tutela que nomeia estes gestores. Não é a atirar mais dinheiro para cima dos problemas que estes se resolvem. E é um problema da gestão que toma decisões no dia-a-dia. Se a gestão do hospital tinha um protocolo com a CUF para permitir aos utentes utilizar a TAC, porque motivo a gestão do hospital, por dogmatismo ideológico puro e duro, decidiu que tinha de ter uma máquina própria de TAC e com isso gastou um milhão e meio de euros? Para quê? Esse valor dava para contratar mais enfermeiros e tomarem decisões que permitissem resolver o problema das instalações, que já são curtas para as necessidades. Porque é que quando o hospital era privado funcionava e agora que é público não funciona?
É um problema de quem gere?
Tivemos uma reunião com o grupo parlamentar do PSD no hospital onde a administração, tal qual ungida por Cristo, nos disse que são um dos hospitais mais tecnológicos do país. Pergunto de que serve essa inovação se têm doentes 10 horas à espera. Nessa reunião o senhor que hoje é director executivo do ACES, na altura vogal por avença na administração, disse-me que era um problema de percepção nossa. É um problema meu e das outras 150 mil pessoas servidas pelo hospital.
Já viveu na primeira pessoa esses problemas?
Sim, os pequenos poderes instituídos dentro da administração pública do hospital que colocam em causa o serviço. Na pediatria do hospital o serviço é exemplar, o problema é até lá chegar. Uma recepção aberta que serve as urgências de adultos e pediátricos, pais com os miúdos ao colo à espera para fazerem a admissão, miúdos prostrados ao colo sem poder entrar na triagem, como foi o meu caso. Tinha a minha filha desmaiada ao colo e pediram-me para preencher uma ficha primeiro. Quando alguém da administração do hospital responde a uma munícipe a dizer que vai mandar para o Ministério Público as queixas que ela fez, que são todas verdade, só me diz uma de duas coisas: ou é mentiroso ou não sai do gabinete para ir lá abaixo ver o que se passa. Convido o administrador e até me ofereço para ir com ele mascarado visitar as urgências às duas da manhã e sentir o que as pessoas vivem. Isto mexe comigo.
O Ministério da Saúde devia nomear novos gestores?
Ou metemos aqui uma gestão que dê o mesmo valor aos utentes que a Parceria Público-Privada ou então devolvemos isto à gestão privada. É tão simples como isto. Eles já provaram que não conseguem. Têm de trocar esta gestão. Ou temos gestores competentes para gerir ou então temos de entregar a saúde a quem sabe. Não acho que o diabo está na administração pública. Mas o que aconteceu é que mudámos quando as coisas estavam boas e agora que as coisas estão más não mudamos….