Entrevista | 14-01-2024 10:00

Hospital CUF Santarém na vanguarda da tecnologia com a laparoscopia 3D com fluorescência

Hospital CUF Santarém na vanguarda da tecnologia com a laparoscopia 3D com fluorescência
Paulo Alves é cirurgião geral no Hospital CUF Santarém e um dos médicos que está na vanguarda da tecnologia

Paulo Alves, cirurgião geral no Hospital CUF Santarém, é um dos médicos que está na vanguarda da tecnologia aplicando-a a cirurgias que se tornam mais seguras e menos agressivas para o doente.

Uma das técnicas mais avançadas que está a ser usada na CUF é a cirurgia laparoscópica 3D com fluorescência, que é menos invasiva e mais precisa - para o tratamento de alguns tipos de cancro, como o colorretal, do fígado, da mama e o melanoma. Paulo Alves é especialista na área do cancro colorretal e refere que com esta técnica moderna é possível um trabalho com melhores resultados, menos tempo de recuperação e menos dor para o doente. A fluorescência permite que o cirurgião veja as margens do tumor com maior definição, aumentando a qualidade da cirurgia e a precisão dos resultados e tornando-a mais segura. Com esta técnica o risco de complicações pós-operatórias diminui. O Hospital CUF Santarém dispõe de três salas de bloco operatório, duas unidades de recobro, internamento e equipamentos tecnológicos de última geração, respondendo de forma especializada, rápida e articulada às necessidades de cada doente.

Os meios tecnológicos permitem técnicas mais avançadas e menos invasivas. Em termos cirúrgicos o que é que está a mudar?
Quando comecei a especialidade os doentes com cancro colorretal eram todos operados. Na altura fazia-se laparoscopia para cirurgia da vesícula biliar e pouco mais. Tudo o resto era cirurgia clássica, aberta. Um tumor do cólon operado fazia com que a pessoa ficasse internada no mínimo oito dias. Actualmente conseguimos que ao fim de três ou quatro dias o doente esteja em condições de ir para casa.
Com a laparoscopia há mais precisão, mais segurança e menos limitações…
No dia seguinte, na generalidade dos casos, os doentes já se levantam e vão à casa-de-banho. Não ficam presos à cama quer pela dor, quer pela agressividade da cirurgia.
E o que é que a fluorescência na laparoscopia veio representar para os doentes?
No caso da cirurgia colorretal tem uma aplicação já validada de aferir a circulação sanguínea. Quando tiramos um bocado do intestino vamos precisar de o ligar, mas precisamos que a circulação esteja boa para que se faça a cicatrização.
Como é que vai funcionar a fluorescência nessa situação?
Alguns produtos têm características que quando expostos a uma luz própria emitem uma radiação. Utilizamos um composto relativamente inócuo, que faz uma fluorescência em verde, e que é injectado numa veia e vai entrar em circulação fazendo uma angiografia. Isso permite ver se a zona intervencionada tem boa circulação ou se é preciso cortar mais um pouco. Porque quanto mais vascularizado mais condições tem de cicatrizar bem.
A junção de tudo isto a imagens com qualidade 3D é outro grande avanço.
A laparoscopia já nos dava uma ampliação da imagem, que nos permitia trabalhar com mais precisão. Numa televisão com imagem 2D aferimos a profundidade pelo jogo de sombras, por exemplo. O 3D permite-nos ter a profundidade visível, o que melhora o desempenho em procedimentos mais exigentes, de suturas por exemplo. Há estudos que comparam a laparoscopia convencional com a laparoscopia 3D e há ganhos de 10% em termos de precisão do gesto.
Entre a cirurgia aberta e a com recurso a laparoscopia quais são as diferenças em termos de cicatrização.
Sendo menos agressiva, a cirurgia e a recuperação vão ser mais rápidas porque existe menos manipulação dos tecidos. O doente vai recuperar mais facilmente. Costumo dar um exemplo aos meus doentes que é: quando magoam um braço dão descanso ao braço, o intestino não o conseguimos manter a descansar. Se o agredirmos menos ele fica menos inflamado. Uma cirurgia que antes era feita com uma incisão que causa desconforto e dor passou a ser feita com três ou quatro furinhos de um centímetro.
Estas técnicas vieram também colocar aos médicos outros desafios e outros conhecimentos…
Implica uma formação contínua. Vamos tendo cursos regulares da Sociedade Portuguesa de Cirurgia. Temos cursos nacionais e internacionais para se conseguir fazer uma diferenciação porque não basta ver uns vídeos e achar que é fácil.
No caso do cancro colorretal quais são especificamente as grandes diferenças que se registaram a nível médico?
Houve uma mudança de paradigma. Porque inicialmente achava-se que uma cirurgia por laparoscopia não seria tão segura quanto meter lá as mãos. A destreza com os dedos é diferente de uma pinça com cerca de 30 centímetros e que tem uma mandíbula rija. As máquinas têm potencia e são muito importantes na medicina, mas também precisam de ser ensinadas e controladas. Na cirurgia ainda não chegámos ao ponto de ser possível que uma máquina trabalhe sozinha.
Com tanta tecnologia sente-se mais médico ou informático?
No bloco operatório ainda consigo sentir-me mais médico porque a acção e reacção parte do nosso movimento. Mas também tenho muito trabalho administrativo e burocrático.
Hoje em dia que outros conhecimentos o médico-cirurgião tem de ter para executar a sua profissão?
Hoje já não chega só a formação de medicina. Temos de ter conhecimentos de ergonomia, de triangulação, quase engenharia, além de electrocirurgia para equipamentos como bisturis ultrassónicos, pinças bipolares e monopolares em que cada uma tem vantagens e desvantagens. Não temos nada perfeito. Aos meus internos, que estou a formar, tento sempre incluir uma parte de engenharia. Sempre fui um bocado curioso da parte informática e electrónica.
E porque é que é importante um médico saber ergonomia?
Porque há certas posições viciosas que adoptamos que, se não tivermos cuidados, vamos ter mazelas no futuro e seremos clientes da ortopedia. No trabalho de laparoscopia temos um doente à nossa frente, pinças dentro do doente e estamos a olhar para um ecrã. Se a marquesa não estiver à nossa medida estaremos a trabalhar com os braços mais elevados. Uma cirurgia que demora duas a três horas, ao fim desse tempo nota-se o esforço nos ombros e articulações das mãos.
Como é que se previnem essas situações?
Há ângulos que o nosso corpo está mais preparado para aceitar. Antes as questões ergonómicas dos profissionais não era uma preocupação. Agora vêm nos manuais de laparoscopia. Aceitava-se que com a idade iam aparecer mazelas e ponto final. Fiz recentemente certificação europeia em cirurgia minimamente evasiva e no manual o primeiro capítulo era ergonomia.
Quando é que começou a preocupar-se com isso?
Quando fui interno de Joaquim Costa, actual director clínico da CUF Santarém, já era uma questão que me preocupava. Uma das minhas funções na altura era posicionar o doente para não estarmos em posições tão viciosas. Nem sempre temos a posição ideal porque os médicos também são diferentes, com alturas diferentes. Fiz um estágio há uns anos em Estocolmo e eu e outro médico éramos os mais baixos. Em todas as cirurgias tínhamos um estrado para estarmos à altura dos mais altos. Em Portugal ainda temos algum pejo nisso. Se for um chefe os outros é que têm de se baixar e não é o chefe que vai pedir um estrado.
Os médicos de hoje, da Era tecnológica, já não são os que fazem tudo como antigamente?
As tecnologias vieram obrigar à criação de sub-especializações. O cirurgião geral classicamente era o faz tudo e agora, por exemplo, dedico-me mais à cirurgia colorretal, outros dedicam-se mais a outras áreas como a parte esófago-gástrica… Neste momento o saber é tanto que é muito difícil alguém saber tudo e vamo-nos diferenciando e depois trabalhamos em equipa.

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