Entrevista | 24-01-2024 10:00

Luísa Henriques: a presidente de junta que gosta de ouvir e falar sobre os problemas das pessoas

Luísa Henriques: a presidente de junta que gosta de ouvir e falar sobre os problemas das pessoas
Luísa Henriques está no primeiro mandato como presidente da União de Freguesias de Madalena e Beselga, em Tomar

Luísa Henriques, 47 anos, é operadora de comunicações no Comando

Sub-regional de Emergência e Protecção Civil do Médio Tejo e presidente da União de Freguesias de Madalena e Beselga. É na função de presidente da junta que se sente mais confortável, sublinhando que nunca se sentiu discriminada por ser mulher autarca. A O MIRANTE assume que as suas maiores preocupações são o bem-estar da população e a educação do seu filho.

Luísa Henriques nasceu a 8 de Maio de 1976 e é a única mulher a presidir uma junta de freguesia no concelho de Tomar. Começou na política como secretária da assembleia de freguesia, influenciada pelo pai, sendo actualmente a presidente de União de Freguesias de Madalena e Beselga. Luísa Henriques cresceu em Casais da Madalena e teve uma infância feliz, marcada por momentos em família. Estudou Engenharia Química Industrial no Instituto Politécnico de Tomar, mas o gosto pela causa pública evidenciou-se; além de presidente de junta, trabalha como operadora de comunicações no Comando Sub-regional de Emergência e Protecção Civil do Médio Tejo, situado em Praia do Ribatejo. Gosta de atender pessoas, ouvi-las e preocupa-se com o bem-estar da população. O maior desafio da sua vida é ser mãe e educar o filho para que ele seja respeitador e um bom ser humano.

Como chegou à política?
O meu pai fez parte da assembleia de freguesia e, posteriormente, do executivo. Tinha três filhos e fui a única que segui os seus passos. Quando era jovem gostava muito de ler sobre o 25 de Abril, ouvir os meus avós sobre como era a vida antigamente. De forma natural entrei para a assembleia de freguesia, com os meus 20 anos, ganhei gosto e fui trilhando o meu caminho.
É mais difícil gerir a sua família ou a freguesia? 
Não tenho muito tempo para gerir a minha família por causa do meu trabalho no comando. Acaba por ser o meu marido a ter que gerir muitas coisas, porque também tenho a sorte, ou o azar, de trabalhar por turnos.
A quem deu o primeiro abraço quando soube que ganhou a junta?
O primeiro abraço foi à ex-presidente de câmara, Anabela Freitas, quando cheguei à Corredoura (Rua Serpa Pinto) em Tomar e nos vimos. Foi um abraço que me marcou. Ser presidente de junta não era coisa que ambicionasse muito ser, mas senti obrigação de fazer alguma coisa pelas freguesias, que estão cada vez mais envelhecidas.
Como é que a chamam quando passam por si na rua?
Umas pessoas chamam-me Luísa, outras chamam-me presidente e outras a Luisita, depende das zonas. Nas aldeias onde vivi quando era criança, de onde eram os meus avós maternos, as pessoas mais velhas chamam-me Luisita, porque a minha mãe também é Luísa. Não faço questão nenhuma que me chamem presidente, embora me sinta muito confortável nessa pele. Não sinto qualquer discriminação pelo facto de ser mulher.
Como encontrou a junta?
Já fazia parte do executivo e há sempre coisas a melhorar. Os recursos nunca são os que necessitamos para fazer face às necessidades. Somos a segunda maior freguesia de Tomar. Também temos muito associativismo que tem de ser apoiado. Depois existem obras que são sempre necessárias fazer. A junta estava bem financeiramente e assim continua.
Quais têm sido os principais desafios?
Temos duas aldeias que sofrem muito com as cheias e uma das coisas que fiz foi insistir com a necessidade de limpar a ribeira da Beselga. Enquanto essas obras não se realizaram não descansei. Uma das coisas que também já começámos, e que vamos dar continuidade, foi a criação de um parque de lazer na aldeia de Fagulhos. O ano que passou (2023) era um ano em que queríamos desenvolver essas áreas, mas não foi possível porque andavam a decorrer as obras do Largo de Cem Soldos, que é uma obra do município. Também comprámos o edifício ao lado da junta porque queremos instalar o Espaço de Cidadão. Temos a ampliação do cemitério para fazer também. Temos muitas obras para fazer, mas os recursos financeiros não são suficientes para tudo e, às vezes, as burocracias não nos deixam andar para a frente.
Como deve ser o presidente de junta ideal?
Tem que se preocupar com as pessoas, estar disponível para falar com elas, ouvir as suas preocupações e contestações. Ainda ontem houve uma senhora que me ligou para dizer que as aldeias todas estão limpas, menos a dela. Agradeço muito que façam esses reparos porque ajudam-me a gerir. Há coisas que só quem vive nos locais consegue perceber.

Anabela Freitas deixou um legado no concelho

Como avalia o trabalho da ex-presidente de câmara, Anabela Freitas?
Tomar está completamente diferente. Em uma década o concelho teve uma evolução muito grande, principalmente a cidade. Tínhamos uma cidade que estava morta e hoje vamos a Tomar a qualquer dia da semana e vemos gente na rua, muitos são estrangeiros. Tomar é uma cidade bonita, onde é confortável passear. Para mim, a Anabela Freitas deixou uma marca muito grande no concelho, um legado. Foi com ela que as juntas de freguesia ganharam algum poder para fazer obra.
Com que olhos vê o futuro com Hugo Cristóvão?
Acho que vai dar continuidade aos objectivos da anterior presidente, porque eram uma equipa. Penso que vai continuar a fazer obra, como a do rio Nabão na zona do Flecheiro, a obra que está prevista fazer na Estrada Nacional 110, em Carvalhos de Figueiredo, e os projectos para a construção de habitação a custos controlados.
As freguesias estão em segundo plano?
Não, acho que o facto de ter havido os contratos interadministrativos foi uma forma que o executivo arranjou de apoiar as juntas e de sermos nós a fazer aquilo que o município faria, porque estamos muito mais próximos das populações e da realidade. Espero que continue a haver estes contratos porque sem dúvida que ganhámos muita autonomia.
Como se posiciona na assembleia municipal?
Às vezes saio de lá um bocado triste, porque muitas vezes não se discute o que é importante. Costumo dizer que sou uma política caseira, porque não gosto de entrar em discussões só porque sim. Dizem que não há público nas assembleias, nem pode haver; a forma como decorrem, os insultos, a postura de muitas pessoas não é correcta e afasta os munícipes. Não me revejo nessa forma de estar na política.
Prometer é o grande erro dos políticos?
Quando sabem que a promessa não é possível de cumprir, é um erro crasso. A ideia que as pessoas têm dos políticos é muito negativa. Não gosto de prometer, mas não tenho problemas em dizer quais são os meus objectivos ou intenções. A única coisa que prometo é que vou trabalhar para atingir os objectivos a que me proponho.
Como estão as contas da junta de freguesia?
Estão saudáveis. Há uns anos houve alterações no sistema contabilístico e na forma como é feita a gestão das autarquias locais. Não podemos comprar nada que não tenha cabimento orçamental. É pena não haver mais dinheiro para podermos fazer mais obra, mas fazemos o melhor com o que temos.

Ninguém quer trabalhar na rua

Já lhe pediram muitas cunhas?
Não, normalmente essas coisas funcionam mais quando há postos de trabalho definidos. Quando abrimos postos de trabalho é para trabalhar na rua e aí ninguém quer andar.
A população está envelhecida?
Sim, temos uma população bastante envelhecida, apesar de achar que tem vindo gente jovem para as aldeias. Existem pessoas que estão a recuperar casas dos avós ou compram as poucas que há à venda. O problema maior tem sido garantir o acesso a cuidados de saúde, porque os médicos de família vêm e vão. A população mais idosa precisa de cuidados especiais e não conseguirmos garantir isso preocupa-me muito.
Há associativismo?
Temos uma forte componente a nível de associativismo. Sem prejuízo de me esquecer de muitas, na localidade da Carreira temos uma pequena associação que acaba por ser só um espaço de convívio; na Longra há uma associação que está com outra dinâmica, fez este ano a Aldeia Natal e já tem outros projectos; no Paço da Comenda temos a valência de Centro de Dia, há o festival Comendatio Music Fest, e uma Columbófila. Temos o Sport Club Operário de Cem Soldos (SCOCS), que organiza os Bons Sons, e a Associação Recreativa e Cultural Os Quatro Unidos, que organiza o Festival do caracol, do marisco, tem actividades e a festa anual. Existe a Associação Marmeleiro e Capela; temos a Associação da Charneca do Maxial; existe ainda o Clube de Caçadores da Freguesia da Madalena e Beselga, e o Centro Cultural e Desportivo de Porto Mendo, com os nossos campeões de futebol de praia.
Tem orgulho por ser a única presidente mulher duma autarquia no concelho?
Gosto de ser presidente de junta, mas não acho que tenha de fazer disso uma bandeira. Infelizmente não há mais mulheres na política porque não têm disponibilidade, porque têm as mesmas capacidades que os homens.
O que não lhe perguntei que gostaria de responder?
Não me perguntou se tenho filhos e eu gostaria de lhe dizer que tenho um filho, que é a pessoa mais importante para mim. No meio de tudo isto, do dia-a-dia e dos desafios que vamos tendo diariamente, o meu maior desafio é ser mãe e fazer com que o meu filho seja um bom ser humano.

Uma mulher de família que gosta de lidar com pessoas

Como foi a sua infância?
Foi uma infância feliz. Até aos quatro anos vivi no concelho de Ourém e a minha mãe estava em casa, porque éramos três irmãos; sou a mais nova e não havia disponibilidade para ir trabalhar com três crianças. A minha mãe sempre brincou muito connosco. Depois fui viver para Tomar, na aldeia de onde os meus avós eram naturais, nos Casais da Madalena, onde havia muitas crianças. Nunca gostei muito de ver televisão e de estar em casa fechada. Fui um bocado ‘maria-rapaz’.
Qual foi o seu primeiro emprego?
Em Torres Novas, numa empresa que fazia recolha de óleos alimentares que depois eram enviados para Espanha para serem tratados. Depois estive três meses em Lisboa e foi aí que percebi que é tão bom viver em Tomar (risos). Entretanto comecei a ser operadora de reforço no Comando Distrital do Operações de Socorro durante o Verão. Depois abriu o Comando Distrital em Almeirim, para onde fui trabalhar como operadora de comunicações. Entretanto os comandos distritais foram divididos em comandos sub-regionais e vim para a Praia do Ribatejo para o Comando Sub-regional do Médio Tejo.
Qual a sua verdadeira vocação?
Acho que tenho vocação para atender as pessoas, para falar com as pessoas, para as ouvir. Também sinto vocação para ser presidente de junta. Sinto-me confortável nessa função, assim como na de operadora de telecomunicações, embora seja um trabalho duro por ser por turnos.
Quem mais contribuiu para ser a pessoa que é hoje?
Não posso dizer só uma pessoa, tenho que falar da minha família no seu todo, principalmente os meus pais e os meus avós. Foram eles que me educaram, foi o que aprendi com eles que me tornou no que sou hoje e é com base nos seus ensinamentos que coloco em prática as minhas ideias.

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