Pedro Beato: o novo rosto do turismo no Ribatejo
Nasceu em Santarém, saiu da cidade quando foi estudar para Lisboa e regressou à terra natal 25 anos depois como vice-presidente da Entidade Regional de Turismo do Alentejo e Ribatejo para abrir uma delegação dessa organização na emblemática Casa do Campino. Pedro Beato quer ajudar a afirmar os municípios da Lezíria como destino turístico e conta com a ajuda de autarcas e sector privado. Reconhece que há muito a fazer para potenciar o rio Tejo, acha que a festa brava ainda é vendável como produto turístico e defende que é preciso construir mais hotéis.
A tauromaquia ainda é vendável como produto turístico? Bom, posso dizer-lhe que o Campo Pequeno, por exemplo, enche com muitos turistas. São factores de atractividade também, basta olhar para outros países, como Espanha. É um tema sempre quente, mas existe uma tradição na nossa região e os turistas aderem. Ainda em Junho, em Santarém, a praça encheu pela Feira Nacional de Agricultura. Feira essa onde nós estivemos pela primeira vez presentes com um stand do Turismo do Ribatejo. Não houve Turismo do Alentejo. No Ribatejo há que afirmar o Ribatejo, para não se diluir noutras marcas promocionais.
O que significa para si a festa brava, a tourada? Sou aficionado, mas isso é a título pessoal. A festa brava tem uma abrangência maior, desde a ida ao campo, o convívio, as próprias largadas, a identidade do próprio vestuário, as tradições associadas, o turismo equestre. Tudo isso está ligado. Quando falamos de festa brava não podemos olhar apenas e só para um momento. Há toda uma cultura e não vai ser o turismo que irá reprimir aquilo que são as tradições e as vontades das pessoas.
O maior rio da Península Ibérica atravessa todo o Ribatejo mas são poucos os municípios que têm tirado algum proveito turístico dessa realidade. Tem havido insensibilidade política em relação ao potencial do Tejo? Não diria que seja insensibilidade. Há questões de base relacionadas com as condições para usufruto em segurança de um rio que é intenso e díspar. Tanto existem mais mouchões como existem cheias, embora sejam cada vez mais raras. Há também uma dimensão ambiental a ter conta. É um tema complexo por isso, porque todas as intervenções que possam possibilitar um uso em segurança carecem de intervenções muito especiais e específicas. Agora, parece-me que temos aqui um recurso que tem que ser olhado de modo a que possa ser mais potenciado.
Como vê o actual estado da Ribeira de Santarém? Conheço as intenções e o projecto que o município tem, que entendo ser bastante relevante para dar essa dinâmica e para que a cidade possa olhar de frente para o Tejo. Eu sou de Santarém e bem sei que durante muitos anos as costas estavam voltadas para o Tejo. Mas isso foi uma realidade também noutros pontos, como Lisboa, onde as coisas só mudaram com o impulso da Expo 98. Esses projectos estão muito alavancados na disponibilidade financeira.
Pondo-se na pele de autarca, essa não deveria ser uma prioridade já há muitos anos? Não me ponho no papel de autarca mas sim do turismo. Acho que devemos ter um rio que possa ser uma mais-valia para a dinâmica do turismo. E já existem bons exemplos na região. Temos estado a fazer um trabalho promocional, chamado Sentir o Tejo, que pretende evidenciar as potencialidades que o Tejo tem.
A região é atravessada pelos caminhos de Fátima e de Santiago mas esse potencial parece ser pouco explorado. Tem ideia do retorno dessa realidade para a economia local? Em relação aos Caminhos de Santiago, fizemos há quatro anos a remarcação dos mesmos segundo as normas. E um dos principais percursos hoje é o caminho central, que passa aqui no nosso Ribatejo. Quanto aos Caminhos de Fátima, posso dizer em primeira mão que fizemos a revisão do mesmo e tem uma marcação nova desde Vila Nova da Rainha até ao limite norte do concelho de Santarém. Não temos contabilização quanto ao número de peregrinos, mas serão milhares de pessoas a percorrer esse percurso em cada ano.
Nasceu em Santarém e aí viveu até aos vinte anos. Agora regressou para trabalhar. Que cidade veio encontrar? Eu começaria pela velha máxima “O bom filho à casa torna”. Só isso já me dá um entusiasmo adicional. Vim encontrar uma cidade diferente, mais desenvolvida, com outras ofertas, também com outra realidade em termos de extensão da própria cidade. Diria que nestas duas últimas décadas e meia Santarém deu um salto.
E cresceu bem? As cidades, e não é exclusivo de Santarém, têm passado por desafios. Mas diria que Santarém, hoje, é uma cidade de qualidade, de conforto, e também por isso o turismo tem vindo a crescer, tal como a procura imobiliária.
A proximidade a Lisboa leva mais do que traz ou traz mais do que leva? Temos que pensar nas oportunidades. E estar perto da capital do país é uma oportunidade, do meu ponto de vista. Talvez por isso hoje Santarém esteja a beneficiar dessa proximidade. Mas também traz os desafios da força centrípeta que Lisboa exerce.
O fluxo turístico da capital está a ser devidamente aproveitado por esta região? Isso é um trabalho que tenho estado a fazer junto dos operadores, com a Associação Portuguesa das Agências de Viagens, para apresentar aquilo que a Lezíria tem. Na próxima edição da Bolsa de Turismo de Lisboa vamos ser destino convidado. Isso traz-nos uma excelente oportunidade e uma responsabilidade acrescida de podermos comunicar o Ribatejo e o Alentejo. Temos que promover na prática aquilo que existe. Mas depois voltamos à questão do alojamento. É mais exigente ainda promover um território que não tem um hotel de 5 estrelas e que tem apenas dois ou três hotéis de 4 estrelas.
A localização escolhida para o novo aeroporto de Lisboa, no sul do distrito de Santarém, vai dar um novo impulso a esta região? Claro que sim. O Ribatejo vai beneficiar, desde logo, porque a localização é num concelho do Ribatejo, que é Benavente. O aeroporto ficará junto de Santo Estêvão, nas proximidades da A13, com um excelente acesso para todos os municípios do nosso Ribatejo. Mas o mais importante é fazer o aeroporto.
Seria essa a sua escolha? As entidades regionais de turismo não foram ouvidas em termos técnicos. Não tivemos acesso às fundamentações e daí não termos tomado nenhuma posição. Porque nós somos profissionais, não podemos ter um turismo de ‘achómetro’. É uma decisão tão estratégica para o país que se fala disto há décadas. O foco é faça-se, o importante é fazer.
Teme que o processo se possa arrastar mais uns anos, como já aconteceu noutras ocasiões? Não posso acreditar nisso, porque houve uma comissão técnica independente que apresentou o seu ranking, o Governo decidiu e por mim está decidido. É uma oportunidade para tirarmos o melhor partido para o nosso Ribatejo.
Muita coisa vai mudar na paisagem daquela zona, caso a construção do aeroporto avance. A pressão urbanística e demográfica será maior. Não teme que haja uma descaracterização do território? Não. Por isso é que há estudos de impacto ambiental, para se perceber o que se pode fazer. Tem que haver regras, o território tem que estar ordenado, mas nós precisamos é de pessoas para o nosso território e de investimento.
“O Alentejo é uma realidade e o Ribatejo é outra”
A criação de uma delegação em Santarém é um sinal de que a Entidade de Turismo do Alentejo e Ribatejo (ERTAR) quer estar mais próxima deste território? Este é um dos sinais fundamentais. Na prática, é uma porta de entrada do turismo, um ponto avançado. Eu diria que é a sede do turismo do Ribatejo. Até final do ano contamos ter um técnico superior de turismo que só pense o turismo do Ribatejo. É tão importante ter este pólo do turismo do Ribatejo que o meu gabinete formal é aqui, em Santarém.
Será uma situação para durar ou a criação da nova NUT II que vai agregar as actuais comunidades intermunicipais da Lezíria do Tejo, do Médio Tejo e do Oeste pode causar mexidas no actual mapa das regiões de turismo? Este foi um desafio que lançámos ao município de Santarém e queríamos que fosse aqui, na Casa do Campino, também por uma razão simbólica, porque o Turismo do Ribatejo tinha aqui a sua sede. Fizemos um protocolo com o município e esta é uma sede para ficar. Quanto à questão da nova NUT II, não sabemos os próximos desenvolvimentos e o nosso foco é exclusivamente continuar a trabalhar para os 11 municípios da Lezíria do Tejo. O que vier virá e só teremos que nos adaptar.
A Entidade de Turismo do Alentejo acolheu em 2013 no seu seio os 11 municípios da Lezíria do Tejo e acrescentou Ribatejo ao nome. Não será uma designação demasiado abrangente, já que muitos municípios ribatejanos estão noutras regiões de turismo? O Ribatejo é por si só uma marca no mercado interno. E em termos de turismo temos que saber aproveitar as marcas que existem. Curiosamente, acabamos por ser a única entidade que continua aqui a afirmar muito o Ribatejo, também por isso, pelo reconhecimento nacional do que é o Ribatejo. Diria que temos grande parte dos municípios que se identificam com esta marca identitária do Ribatejo. Formalmente é Lezíria do Tejo, mas em termos de comunicação nós afirmamos o Ribatejo e isso tem sido do agrado dos municípios, das entidades privadas, dos promotores turísticos.
As particularidades e necessidades do território da Lezíria do Tejo no sector do turismo não ficam para segundo plano, não se diluem num território tão vasto como o Alentejo? Não, porque trabalhamos o marketing territorial e toda a estratégia de forma separada. Foi nossa aposta desde há um ano, quando assumimos funções, que o Alentejo é uma realidade e o Ribatejo é outra. Por exemplo, na última Bolsa de Turismo de Lisboa, pela primeira vez, o Ribatejo teve um stand autónomo dentro do nosso espaço comum. O nosso racional é que haja um trajecto próprio para o Alentejo e outro para o Ribatejo.
Os municípios hoje dão muito mais atenção ao sector do turismo? Sim, havia aqui outras prioridades em termos de desenvolvimento económico, como a indústria, a agro-indústria, era outro paradigma. Hoje, o turismo chegou de facto à Lezíria do Tejo, ao nosso Ribatejo. Hoje há uma atenção muito particular sobre o tema.
Fala-se muito na falta de alojamento como um obstáculo ao crescimento e desenvolvimento do turismo nesta região. São mesmo necessários mais hotéis e outros alojamentos? Precisamos de mais camas e de mais hotéis. E precisamos numa lógica de hotelaria que cria destino. Os hotéis muitas vezes criam esse destino, porque criam a disponibilidade, a oferta para acolher. É por isso que temos essa percepção e estamos a agir.
A agir como? Junto do sector privado? Sim. Nós identificámos este ano, no âmbito do nosso roteiro de investimentos, dois concelhos onde estamos a trabalhar: Santarém e Alpiarça. E temos uma equipa de consultores que, juntamente com os municípios, identifica oportunidades de investimento, terrenos, edifícios que possam ter essa conversão em hotelaria, para que no final essa equipa apresente ao município um dossiê específico de oportunidades para promotores hoteleiros.
E porquê esses dois concelhos? Santarém não tem um hotel novo desde 1993, parece-me. Santarém é capital de distrito e, de facto, precisa de hotelaria. E Alpiarça porque quando estávamos a preparar o racional para esta matéria, numa das conversas que tivemos com a senhora presidente, já tinha dado alguns passos nesse sentido. No próximo ano iremos identificar mais dois municípios. Isto também vai ao encontro das nossas possibilidades, pois requer a contratação de uma equipa específica para fazer esse trabalho. E, obviamente, continuamos sempre a sinalizar pelos nossos meios essas oportunidades aos promotores turísticos. Este trabalho de comunicação que temos vindo a desenvolver neste último ano tem feito com que os promotores comecem a ter muita curiosidade e eu próprio, neste pólo, já recebi vários investidores com intenção de investir ou a perguntar-nos onde é que nós entendemos que há mais carência e a maior oportunidade.
“O Ribatejo é uma das regiões mais autênticas do país”
Os municípios do distrito de Santarém estão há muitos anos divididos por diferentes regiões de turismo. Isso não dificulta uma estratégia regional conjunta nesse sector? O mais importante para o turismo é a segurança e a estabilidade. E também a estabilidade naquilo que são as divisões administrativas. É nosso entendimento que quanto maior for a estabilidade, também em tempo, maior possibilidade existe que o trabalho executado, a promoção realizada comece a dar os seus frutos. Os municípios do Ribatejo têm estado a pular de uma área para a outra e talvez por isso agora, com alguma estabilidade que tem havido, surjam estes projectos. Porque a estabilidade administrativa e da organização é muito importante.
Como técnico da área do turismo, não faria mais sentido os municípios deste distrito estarem sob o chapéu da mesma entidade de turismo? A questão é que a decisão foi tomada em 2013 e pelo que tenho conhecimento não houve uma resposta dos municípios perante a proposta que foi feita. Obviamente que quanto maior for a linha de continuidade e a identificação cultural, numa lógica de autenticidade também do próprio território, mais vantajoso se torna, mas não é decisivo. Decisivo é ter esta estabilidade que nos permite estar aqui hoje a trabalhar e a pensar no nosso Ribatejo.
O que é que pode fazer a diferença no Ribatejo a nível do turismo? A diferença já cá está, que é esta autenticidade. É uma das regiões mais autênticas e com maior identidade do país. E é preciso valorizar tudo aquilo que é diferenciador das outras regiões e dos outros pontos do mundo. Porque hoje competimos internamente com as outras regiões mas temos também de olhar para o mundo.
Estamos a falar de quê? Do cavalo, do touro, do campino, do Tejo? Estamos a falar daquilo que são as tradições. Aliás, o nosso logo é ‘Ribatejo viva a festa’. A festa tem a ver com o touro, o cavalo, também o Tejo, que é uma questão muito relevante, a cultura, o património… Também temos a tradição da arte equestre, a natureza, com zonas de grande relevância como o paul do Boquilobo o estuário do Tejo. Depois há a dimensão da gastronomia, tão forte e tão identitária, com Santarém Capital da Gastronomia ou a Sopa da Pedra que ainda há dias teve um festival em Almeirim que foi um sucesso. Temos um conjunto atractivo de produtos muito relevante. E, obviamente, a questão dos vinhos do Tejo, numa lógica de enoturismo que temos vindo a apoiar.
“Na política e no amor nunca digas nunca”
Pedro Beato é filiado no PS mas sublinha que não tem militância activa, garantindo que neste momento tem dois partidos: o turismo e o Benfica. “Tenho o meu pensamento político mas o meu compromisso nesta missão teve por base uma candidatura apartidária. Reunimos o consenso de todas as forças políticas e também o suporte da iniciativa privada. É uma equipa de profissionais do turismo, que defende o turismo independentemente da cor das áreas governativas quer locais quer nacionais”. Quanto a uma eventual candidatura autárquica no futuro, não fecha a porta à chave: “na política e no amor nunca digas nunca, mas a minha missão e o meu compromisso nesta fase é com a Entidade Regional de Turismo. O Alentejo e o Ribatejo podem contar comigo”.
É filho de um capitão de Abril, Carlos Beato, antigo companheiro de armas de Salgueiro Maia e que integrou a coluna militar da Escola Prática de Cavalaria de Santarém na madrugada da revolução de 25 de Abril. Pedro Beato encara como “uma grande responsabilidade” e um “privilégio” ter em casa alguém que ajudou a mudar o rumo do país, em conjunto com muitos jovens que há 50 anos fizeram prevalecer os valores da liberdade.
Pedro Beato nasceu no dia 17 de Dezembro de 1980, no antigo Hospital de Santarém, cidade onde a família vivia e onde esteve até aos vinte anos, quando foi estudar para a universidade em Lisboa. Vive em Melides, no litoral alentejano, mas continua a ter casa em Santarém. É casado, tem duas filhas e é formado em gestão turística. Ocupa actualmente a vice-presidência da Entidade Regional de Turismo do Alentejo e Ribatejo, onde já trabalhava como director.