Entrevista | 08-03-2025 15:00

António Jesus: “os bombeiros são o braço direito dos autarcas”

António Jesus: “os bombeiros são o braço direito dos autarcas”
Com quase 50 anos de serviço, António Jesus é o comandante dos Bombeiros Voluntários de Abrantes

Com quase 50 anos de serviço, o comandante dos Bombeiros Voluntários de Abrantes diz que é profissional durante 24 horas e que o mais importante é o bem-estar da população.

Natural de Ferreira do Zêzere, com 63 anos, António Jesus afirma que escolher a profissão foi uma decisão natural, pois grande parte da sua família é composta por bombeiros; seguiu as pisadas do pai e da mãe e actualmente a sua filha também é uma “soldada da paz”. No dia do 12º aniversário da associação, O MIRANTE visitou o quartel comandado por António Jesus, que nos explicou as razões por que a profissão de bombeiro é tão apaixonante.

É um dos fundadores da Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de Abrantes (AHBVA). Como surgiu a associação?
Foi uma associação criada para fazer face a várias situações que vinham ocorrendo há anos. Na altura, a câmara municipal decidiu passar a gestão do corpo de bombeiros do município para a actual associação, de forma a solucionar os problemas que existiam com os bombeiros municipais na altura e investir nesta nova associação. Não vou dizer se foi bom ou mau, mas os serviços e os números falam por si e tenho a consciência que estamos a servir bem a população. Fazemos mais de 6500 serviços por ano, temos um quadro activo com cerca de 70 pessoas e há 12 anos houve sim uma transformação, mas penso que temos feito um bom trabalho e melhorado a nossa capacidade de resposta.
Quais são as grandes conquistas e dificuldades ao longo destes 12 anos?
Foi manter e ir aumentando o número de efectivo e manter a qualidade de formação. Damos 2500 horas de formação certificada por ano, portanto, atingir esse patamar e conseguir aumentar a nossa capacidade de resposta e sermos reconhecidos pelo trabalho que fazemos é a maior conquista. Dificuldades não consigo especificar uma, mas felizmente temos conseguido ultrapassar todas.
Sente-se uma figura histórica no concelho?
Sou comandante desta corporação há 19 anos. Sou de Ferreira do Zêzere e vim do corpo de Bombeiros de Ferreira do Zêzere, onde estive 13 anos como comandante e cerca de seis como segundo-comandante. Vou a caminho dos 50 anos como bombeiro e como comandante já tenho mais de 30 anos de serviço. Não me considero uma figura histórica, mas tenho trabalhado muito para desempenhar bem as minhas funções a ajudar os outros a fazê-lo também.
Quando se fala em bombeiros é comum usar-se o termo herói. Sente o peso da responsabilidade?
É um elogio que tem o seu peso, mas todos estamos cientes da responsabilidade que o nosso trabalho tem. Mesmo eu, com quase 50 anos de serviço, ainda gosto de ser elogiado pelo meu trabalho. Mas penso que os mais novos apreciam ainda mais receber esse elogio e ser reconhecidos pelo trabalho que fazem.
Os bombeiros voluntários têm mais dificuldade em captar pessoas do que os municipais?
Quando abrem os concursos para recrutas há dificuldade em arranjar pessoas para os bombeiros voluntários em todo o país. Nos bombeiros municipais penso que também já se sente alguma dificuldade. Basta ver o número de recrutas que têm e as desistências. Há dificuldade em captar pessoas em ambos os lados, até porque é uma profissão de muito perigo e que exige uma grande disponibilidade. Os meses de formação são bastante exigentes e muitos não se habituam à mudança de rotina de não terem fins-de-semana e noites livres.
Acredita na profissionalização dos bombeiros?
A primeira intervenção tem de ser sempre profissionalizada e a formação tem de ser igual. O bombeiro voluntário tem de ter uma formação igualmente capaz de corresponder às situações. Agora, a disponibilidade é diferente. Porém, acho que a primeira intervenção tem de ser sempre profissionalizada e tem de haver uma capacidade de resposta ao minuto, sem dúvida.
Há dois anos houve mais mulheres a entrar na corporação. O crescimento mantém-se?
Sim. Neste momento 30% do corpo bombeiro é composto por mulheres e cerca de oito já são profissionais, o que é de facto muito bom e acho que esta maior visibilidade das mulheres nas profissões está a ocorrer não só nos bombeiros, mas em vários outros sectores.
O concelho de Abrantes tem dimensão para ter um corpo totalmente profissional?
Todos os concelhos, se isso algum dia for possível, têm que ter essa capacidade. Porque tal como na GNR e outras forças de segurança, tem de haver verbas para tal. E se for decidido que tem que haver um corpo de bombeiros profissional, de acordo com a dimensão do concelho, as câmaras têm que ter essa capacidade ou alguém tem de dar às câmaras meios e verbas para isso ser concretizado.
Os municípios devem investir mais na atribuição de apoios aos bombeiros?
Sim e isso é uma maneira de atraírem elementos para a causa, principalmente no voluntariado. A criação do cartão social é por exemplo uma grande ajuda e há várias outras maneiras de ajudar os bombeiros. Felizmente muitos municípios estão a contribuir com os cartões sociais e a ajudar no que podem, não só aos bombeiros, mas também às associações em geral. Penso que, de um modo geral, todas as câmaras já têm a noção de que têm que investir nas associações, porque os bombeiros são o braço direito dos autarcas.
Como é o seu dia-a-dia de trabalho?
Comandar é uma das funções mais difíceis que existe. Quando se lidera equipas com vários homens e mulheres, cada um com a sua maneira de ser, tem que se tentar gerir conflitos e ser rigoroso na implementação de regras. E tentar sempre que o bombeiro tenha a noção que está aqui para servir a população. O que importa é o bem-estar da população.
Como classifica o seu estilo de liderança?
Costumo dizer que sei que não sou fácil de aturar, mas o meu efectivo tem a paciência necessária para nos darmos todos bem e desempenharmos as nossas funções. Por exemplo, nunca tiro férias nos meses de Verão, porque acho que se estamos num concelho com elevado risco de incêndio não faz sentido ir de férias. Não ia conseguir estar descansado. Não exijo isso dos meus homens, mas eu não consigo. O que interessa é ao fim do dia, quando fechar a porta, saber que as pessoas estão seguras.
O que o fez querer ser bombeiro?
Penso que foi uma sucessão natural da vida, porque o meu pai foi bombeiro há muitos anos, assim como a minha mãe, e também tenho primos e irmãos que seguiram a profissão. Actualmente também tenho uma filha que é bombeira e a minha esposa também é bombeira voluntária há mais de 35 anos, então é de família.
Como concilia a vida pessoal e profissional?
Primeiro sou profissional durante 24 horas e o resto vem depois. Felizmente a minha filha e a minha mulher são bombeiras, então entendemo-nos perfeitamente e não há crise nenhuma.
Qual foi a situação mais complicada que enfrentou em serviço?
Já passei por várias, desde situações de ocorrências a vítimas jovens e até situações com homens novos que perdi. São situações que prefiro não falar em específico, mas são momentos que nos marcam e que nunca se esquecem. Faz parte da vida de um bombeiro.

Mais Notícias

    A carregar...
    Logo: Mirante TV
    mais vídeos
    mais fotogalerias

    Edição Semanal

    Edição nº 1708
    05-03-2025
    Capa Médio Tejo
    Edição nº 1708
    05-03-2025
    Capa Lezíria Tejo
    Edição nº 1708
    19-03-2025
    Capa Vale Tejo