Entrevista | 22-06-2025 18:00

António Torrão é autarca há 20 anos em Aveiras de Cima e quer ser presidente da Câmara de Azambuja

António Torrão é autarca há 20 anos em Aveiras de Cima e quer ser presidente da Câmara de Azambuja
António Torrão, actual presidente da Junta de Freguesia de Aveiras de Cima, é o cabeça-de-lista da CDU à Câmara de Azambuja. Defende o fim das concessões da água e dos resíduos e aposta numa política de proximidade - foto O MIRANTE

A terminar o limite de mandatos como presidente da Junta de Aveiras de Cima, António Torrão avança como candidato da CDU à Câmara de Azambuja. Autarca há mais de duas décadas e defensor convicto da política de proximidade, diz que se vencer as eleições vai pôr fim às concessões da água e da recolha de resíduos. Diz que os socialistas não têm sabido aproveitar os fundos comunitários e que a saúde precisa de uma solução definitiva.

O candidato da CDU à Câmara de Azambuja acredita que ao fim de 24 anos como autarca numa junta de freguesia pode fazer diferente e melhor na Câmara de Azambuja, governada há 40 anos pelo Partido Socialista. E quer fazê-lo começando por se aproximar das pessoas que, defende, precisam de ser ouvidas. Para que quem está no poder possa resolver problemas, por vezes simples, que impactam a qualidade de vida da população. Uma convicção que vem de uma herança que lhe foi passada pelo seu “mentor”, o presidente da Junta de Aveiras de Cima que o antecedeu e o levou para a política, Justino Oliveira.
“Eu de política não percebia nada, era um amador. Vim para cá e era gago e surdo, mas com os anos aprendi que para se ser autarca é preciso saber ouvir, mesmo quem não tem razão. Quando se é autarca e não se quer ser incomodado na rua não vale a pena continuar. O foco tem de ser sempre as pessoas”, diz António Torrão. Antes de ser eleito presidente de junta foi secretário na mesma freguesia durante vários mandatos e acredita que não tem inimigos na política. Homem simples, cumprimenta toda a gente por quem passa na freguesia, tomando sem rodeios, e muitas vezes, a iniciativa.
Nascido e criado em Aveiras de Cima, onde sempre morou à excepção do tempo em que esteve emigrado em Angola, começou cedo a trabalhar na construção civil. Aos 16 anos, conta, era um dos que andava a fazer a marcação, com estacas, da auto-estrada 1 entre Vila Franca de Xira e Santarém. Agora, aos 65, e depois de ter cumprido o ciclo de mandatos permitidos por lei na sua freguesia, diz que quer levar a experiência e a vontade de fazer avançar o concelho de Azambuja que, na sua opinião, não tem sabido crescer nem aproveitar as ferramentas financeiras disponíveis para dar o salto.


Há 24 anos no executivo da Junta de Aveiras de Cima, concorre agora à Câmara de Azambuja. É sede de poder ou não tem nada mais interessante para fazer?
Não, não é sede de poder. Acho é que está na altura de ir na corrida à câmara para a ganhar e tentar fazer melhor por este concelho, não só pela minha freguesia mas pelo concelho inteiro.
E o que é que um dinossauro da vida autárquica pode trazer de melhor a este concelho?
Algo que é muito importante e que se tem vindo a perder: a proximidade com as pessoas. As pessoas precisam de ser ouvidas não só quando há eleições, precisam de ser ouvidas todo o tempo. Não se preparam eleições a três meses, preparam-se de quatro em quatro anos. E neste concelho há tanta situação para resolver, inclusive coisas que a nível financeiro não eram nada de especial e que podiam ser resolvidas, mas não são...
Ganhou Aveiras de Cima sempre com maioria absoluta. Como é que se vence o PS, que na câmara vive no poder há 40 anos?
Fazendo ver que com o PS não temos progredido tanto como era expectável. Falo pela minha freguesia. Sempre pedi para nos deixarem crescer, porque temos condições naturais para isso, mas ao longo dos anos não foi isso que aconteceu. Estou aqui há 24 anos e desde o início que peço a requalificação da mesma rua; há projectos que não foram executados pelos promotores porque não houve abertura da parte do município... É um erro estratégico de quem tem estado a decidir os destinos deste concelho ao longo destes anos e que optou por fazer este tipo de política do ‘se nós não andamos, os outros também não podem andar’. Isto tem de acabar!
Não perspectiva, à semelhança do que aconteceu as legislativas, uma viragem do eleitorado à direita?
Não. As eleições autárquicas são especiais, porque se vota mais na pessoa do que na cor política. Não vamos ter aqui esse fantasma do Chega.
Uma aliança com o PS está à partida excluída?
Não, não está excluído qualquer acordo. Mas não estamos agora a pensar em acordos. Quando decidi participar nesta corrida à câmara foi para a ganhar. Vou correr para o primeiro lugar, não para um terceiro ou quarto.
A aliança que foi estabelecida no actual mandato para dar governabilidade ao PS tirou força à CDU, com a vossa vereadora Mara Oliveira sempre colada à máquina socialista?
Sim e é natural. Não temos de passar a vida toda a ser oposição, também podemos contribuir. E a Mara tem feito um trabalho muito bom na área social. Mas pelo que sei houve contrapartidas do acordo que não saíram do papel, como é o caso da construção de uma piscina em Alcoentre. Mas importa dizer também que votámos contra algumas propostas, por exemplo, a da transferência de competências na Saúde, porque achamos que a Saúde deve ser do Estado e não dos municípios. Até porque já tínhamos tido uma má experiência com a aceitação da Educação da qual, todos os anos, resulta um défice de 600 mil euros. Já são mais de 10 milhões que podiam ter sido investidos no concelho se não tivéssemos aceitado este acordo com o Estado que não foi viável. Estamos a pagar e a perder.
O projecto Bata Branca, que tem garantido consulta a quem não tem resposta pelo SNS, é a solução certa para o problema da falta de médicos?
Não, não é. É um remendo. Tem corrido bem porque para quem neste concelho não tinha nada, passou a ter consultas, a ter médico, mas não em definitivo. Uma solução definitiva tem que passar pela criação de uma unidade [modelo] C para que haja outra dinâmica, para que os médicos se queiram aqui instalar.
Recuperar para a esfera pública a gestão da água é uma bandeira comunista que vai manter hasteada?
Sim, porque a água neste concelho é das mais caras do país e a empresa tem lucros e não tem investido praticamente nada na rede, que ainda é a mesma do tempo em que os comunistas governavam a câmara municipal. Acabamos por estar a engordar os privados e por pagar as taxas máximas. O mesmo com a recolha dos resíduos sólidos de que toda a gente se queixa. Basta olhar para os municípios aqui ao lado: se fazem a recolha é porque é rentável. Se as empresas têm lucro, os municípios também os podem ter. Mas, claro, para isso é preciso fazer investimento e ir à procura dos apoios.
Porque diz que o movimento associativo está maltratado?
Para começar, acho que devia ser reconhecido o estatuto de voluntário no associativismo, porque cada vez é mais difícil conseguir pessoas para dirigir as associações, ou seja, para despenderem do seu tempo para servir os outros. Depois, porque acho que devia ser dado um apoio mais directo para as instalações das colectividades que, nalguns casos, deixam muito a desejar.

“Azambuja precisa de parar de pensar só no momento”

À entrada de Aveiras de Baixo vê-se há anos um cartaz do município a dizer que ali vai nascer um parque biológico. Foi um anúncio que saiu precipitado?
Foi. O espaço em si é bonito e é onde fazem a iniciativa Um Dia no Campo, mas podia ser mais aproveitado. Acho que era o sítio ideal para instalarmos uma escola profissional com cursos para áreas em que há falta de mão-de-obra, como carpinteiros, canalizadores, electricistas, pedreiros. Precisamos de formar gente nessas áreas e há muitas verbas do PRR, muitos milhões que vão ficar por utilizar.
Qual a sua estratégia para atrair empresas de valor acrescentado para o concelho?
Entram no concelho de Azambuja cerca de seis a sete mil pessoas por dia para trabalhar na área da logística. Precisamos de outro tipo de empresas, mas para isso temos que criar condições para que se possam instalar e não as empatar com tanta burocracia. Recordo um projecto muito falado, o Aveiras Eco Valley que iria atrair grandes multinacionais na área da informática e que traria condições para as pessoas viverem e trabalharem num espaço só...
O que é feito desse projecto que anunciava 20 mil postos de trabalho e 10 mil novos residentes para um concelho com cerca de 21 mil habitantes?
Sabemos que está em Plano de Pormenor e que o terreno já foi adquirido. Para além disso, não sabemos mais nada. Mas acho que ninguém vai investir tanto dinheiro na compra de um terreno se não for para avançar. Estou convencido que em 10 anos temos o Aveiras Eco Valley.
Dez anos não é muito tempo?
Não se desenvolve de um dia para o outro, porque há muita coisa para fazer antes de chegar ao arranque do projecto. É preciso preparar uma série de infraestruturas primeiro para não criar problemas graves, nomeadamente ao nível do trânsito. A rotunda de acesso à A1 em Aveiras, por exemplo, já é caótica. Portanto, é preciso criar as condições para que depois não soframos.
Teria feito diferente no processo para a requalificação da Escola Secundária de Azambuja, que anda há 20 anos para sair do papel?
A Junta de Freguesia de Aveiras de Cima pôs à disposição um terreno para construir uma escola nova. Havia financiamento em 85%, mas acharam que era uma ideia megalómana, que éramos lunáticos. Esquecem-se que o concelho é disperso e que ninguém vai do alto concelho para a Escola Secundária de Azambuja, esses alunos vão para o Cartaxo ou Rio Maior, e que podíamos ter uma escola nova no centro do concelho. Não tem de ficar tudo na sede de concelho. Também não se percebe como é que nos concelhos ao lado se consegue captar fundos para requalificar escolas e em Azambuja não. Além da secundária, temos em Aveiras de Cima uma escola com 39 anos que já devia ter sido requalificada pelo menos na parte energética, que representa perdas brutais por nem vidros duplos ter.
A Câmara de Azambuja não tem sabido aproveitar programas de fundos comunitários da União Europeia, é isso?
Acho que não temos conseguido, porque temos aqui uma política muito complicada em termos de acção. Os projectos, independentemente de a câmara ter ou não dinheiro para executar as obras, são fundamentais porque programas desses abrem no máximo 30 dias e só os conseguimos aproveitar se tivermos projectos para submeter. Não é fazer o projecto depois de se apresentar uma pré-candidatura e ficarmos para trás ou sermos excluídos à partida. Azambuja precisa de parar de pensar só no momento, na calçada que afundou, no sinal que foi abaixo, e ter visão para a frente e para isso é preciso desenvolver projectos.
A população de Aveiras de Cima já pode dormir descansada com a CLC, empresa considerada de perigosidade elevada, à porta?
Não, nunca se pode dormir descansado quando se está próximo de uma unidade daquela dimensão, que tem riscos enormes. As pessoas que moram naquela área deviam ter uma informação muito consistente sobre como agir em caso de acidente. Mas essa informação não tem chegado às pessoas. Portanto, falta investir na formação da população.

Com 24 anos de experiência autárquica, António Torrão quer pôr a CDU a governar Azambuja e critica a falta de investimento nas escolas e nas infra-estruturas básicas do concelho - foto O MIRANTE

“Numa junta estou habituado a aproveitar cêntimos quando podia aproveitar milhões”

Ser presidente de junta é um bom treino para se ser presidente de câmara? Acho que sim. Conseguimos ter uma ideia de todo o concelho, porque falamos com os outros presidentes de junta e acabamos por conhecer os problemas reais das pessoas porque somos de proximidade. Mas também porque aprendemos a saber até onde é que uma autarquia local pode ir. Numa junta estou habituado a aproveitar cêntimos quando, às vezes, podia estar a aproveitar milhões se o dinheiro fosse melhor distribuído e tivéssemos mais meios.
No caso de ser eleito seria capaz de olhar com equidade para o concelho e largar a preferência por Aveiras de Cima? Claro. Estou a candidatar-me ao concelho de Azambuja e não a uma freguesia. Agora, com certeza, há zonas do concelho que precisam ser olhadas de maneira diferente. Por exemplo, o alto concelho tem um património cultural brutal que está mal aproveitado, degradado, e durante estes anos todos não houve capacidade para mudar isso.
Fala do Palácio de Pina Manique, em Manique do Intendente? E da Casa da Câmara e do próprio Castro de Vila Nova de São Pedro que podia ter outra dinâmica. Sobre o palácio, sim, é verdade que não é nosso mas é do nosso interesse cultural, turístico, então temos de trabalhar com as entidades certas para saber como se pode requalificá-lo, transformá-lo numa pousada, quem sabe...
Insistiria na recuperação dos bairros dos estabelecimentos prisionais de Alcoentre e de Vale Judeus para os devolver à população a custos controlados? Sim, porque precisamos urgentemente de casas. Estão-nos a chegar pessoas imigrantes todos os dias, com famílias completas e temos de dar condições às pessoas para se conseguir fazer uma boa integração. E tínhamos a esperança que isso se começasse a desenvolver, mas nada. Estamos a perder o Primeiro Direito [programa de apoio à habitação] porque não tivemos a capacidade de o executar. Além disso, temos muitas casas degradadas e devíamos ir por aí também e triplicar o IMI aos proprietários. Há uma série de questões que têm de ser tratadas com vontade.

Mais Notícias

    A carregar...
    Logo: Mirante TV
    mais vídeos
    mais fotogalerias

    Edição Semanal

    Edição nº 1721
    18-06-2025
    Capa Médio Tejo
    Edição nº 1721
    18-06-2025
    Capa Lezíria Tejo
    Edição nº 1721
    18-06-2025
    Capa Vale Tejo