O ás da matemática criado em Santarém que hoje dá cartas na comunicação

João Duarte nasceu em Lisboa, mas viveu sempre em Santarém até ir fazer o ano zero na faculdade. Continua a visitar a cidade do gótico para ver a avó que o criou e os amigos, como o ex-presidente da câmara, Ricardo Gonçalves.
Foi jornalista na fundação do Jornal de Negócios que ia buscar os jovens à saída da universidade. Mas o jornalismo foi sol de pouca dura e fundou uma agência de comunicação sem pensar muito bem nas responsabilidades, porque senão não o teria feito. Hoje é dono do YoungNetwork Group, que opera em várias áreas do sector, com 200 profissionais. Tem jornais online, um sobre regiões e quatro dedicados exclusivamente aos clubes Sporting, Benfica, Flamengo e Corinthians. Nesta entrevista fala sobre comunicação, sobre a cidade, que precisa de se afirmar como capital, e a região, que diz ter um problema de marca, da sua infância e da sua vida de que se sabe pouco na Internet.
António Palmeiro e João Calhaz
João Duarte é o fundador e administrador de um grupo empresarial com 200 funcionários e tirando algumas opiniões em revistas e jornais de marketing e comunicação, são poucas as referências na internet sobre a vida deste empresário de Santarém. Por isso vamos contar as curiosidades que tínhamos e que ele conta abertamente e sem alguma vez tentar contornar as respostas. Comecemos pela infância em Santarém, para onde foi logo após ter nascido em Lisboa, a 24 de Fevereiro de 1975. Por isso continua a dizer que é de Santarém. Mora na zona Oeste há quase duas décadas, é ateu e tem quatro filhos, cujos nomes fugiram à tendência familiar de chamar João aos filhos. O seu irmão, que tem o mesmo nome, e a irmã escolheram João para nome de todos os filhos.
Foi criado a maior parte do tempo pelos avós. A avó tinha a nobre missão de tomar conta da família. Criou muita gente: os irmãos de João, os primos. O avô, beirão de gema, já faleceu e era o responsável da fiscalização da Segurança Social no distrito de Santarém. O bisavô era da Guarda Nacional Republicana e foi combatente na Primeira Guerra Mundial. Os avós vinham de famílias pobres, como quase todas as famílias naqueles tempos. O avô ficou órfão de pai aos seis anos e instalou-se em Santarém para estudar no seminário, porque era onde podia ter uma educação de excelência para quem não tinha dinheiro para pagar os estudos. Germano Gonçalves Neto, que se fosse vivo teria 95 anos, era muito conhecido na cidade, jogava ténis de mesa e foi campeão nacional já com 50 anos de idade com a sua equipa: o Trindade, o José Cardoso, o Alexandre Veríssimo.
João Duarte estudou no Colégio Andaluz, onde é agora é o Politécnico. Depois foi para o liceu (Escola Sá da Bandeira) e o 12º foi feito na faculdade, o que se chamava de ano zero. Até sair para Lisboa diz que não teve uma vida de grande registo, além de ser um bom aluno, sobretudo a matemática, e de jogar basquetebol dos 13 17 anos. Considerando-se um jogador que “não tinha especial habilidade, mas que tinha muito gosto em fazê-lo; chegou a defrontar a equipa de Almeirim onde jogava o presidente da câmara que está em final de mandato e é candidato à Câmara de Santarém, Pedro Ribeiro, e outro Pedro Ribeiro, que foi presidente da Câmara do Cartaxo.
Optou por ir para Economia, mas sem saber muito bem como é que foi parar a este curso porque não tinha noção do que pretendia ser “quando fosse grande”, ao contrário da generalidade dos miúdos de hoje que são mais esclarecidos e conhecem melhor as opções. Mas se não tivesse escolhido Economia haveria de ter ido para um curso com Matemática porque é de uma família com muita apetência para as contas, para o raciocínio lógico. Estudou na Universidade Católica e, no último ano, entra como jornalista estagiário no Jornal de Negócios. Na altura, o jornal, acabado de ser constituído, tinha pouco dinheiro e contratava muita “malta nova” de Gestão e de Economia. De estagiário passou a jornalista, a editor e a director de uma revista que era encartada uma vez por mês no jornal.
No jornalismo começou a perceber o mundo da comunicação a que juntou uma veia empreendedora, mais do que gestor, reconhecendo ser um gestor razoável, e fundou a YoungNetwork. Uma agência de comunicação que evoluiu para um grupo presente em mais nove países, com mais incidência, além de Portugal, em Angola e Moçambique, que presta vários serviços, como consultoria de comunicação, publicidade, e que é uma das marcas mais reputadas no digital em Portugal. “Começámos por ser um grupo de assessoria mediática. Quando montei a empresa pensava que sabia mais do que realmente sabia e isso até foi bom porque se fosse dar esse passo com as coisas todas analisadas e em consciência, não teria avançado”, lembra João Duarte, que na altura tinha 25 anos e a confiança de que conseguia fazer melhor que os outros. Os conhecimentos ajudaram? “Ajudam sempre um bocadinho, mas só tinha dois anos e meio de experiência de jornalismo, portanto, não tinha assim tantos conhecimentos.

As agências com nomes de mulheres, o estilo de gestão e os partidos rejeitados
O que é que deu a João Duarte para criar no grupo três agências com nomes de mulheres? São homenagens e referências! A Alice reporta-nos para o “país das maravilhas, a In Digital Land. Ou seja, o digital inspirado na Alice no País das Maravilhas. A Carmen, a agência criativa, é inspirada na figura de Carmen Miranda, “a mulher que saiu de Portugal para o mundo, para o Brasil, e que era um furacão” e na criatividade queremos ser assim”. A Taylor é uma homenagem a uma das maiores estrelas de Hollywood: Elizabeth Taylor. “Não fui eu que tive as ideias, mas foram discutidas e aceitei-as de bom grado”, elucida.
Tal como aceitou as ideias dos nomes das agências, João Duarte considera-se um gestor que ouve mais do que manda fazer porque quer. “Se calhar as pessoas que trabalham comigo não têm a mesma ideia, mas diria que num grupo de alguma dimensão, as decisões que são puramente individualistas são raras”, realça, acrescentando que não tem intervenção em muitas das actividades do grupo e se fosse ele fazia-as de forma diferente. Há um conjunto de regras que tentamos seguir, mas depois cada director, cada coordenador decide.
João Duarte não esconde que já foi engando várias vezes, mas continua a achar que “não é preciso ficar de muito pé atrás, porque a probabilidade de outra pessoa a seguir ser igual não é assim tão grande”. E para que não pensemos que está apenas a dar um ar de bondoso, sublinha: “Estou a falar a sério”. Para o comunicador quem tem esse problema é a esquerda mais à esquerda que tem a ideia de que quem tem mais sucesso ou mais dinheiro é porque andou a enganar alguém. “Se pegarmos em mil trabalhadores de uma de uma fábrica há uma percentagem desonestos, tal como há uma percentagem de gestores desonestos”, conclui, sublinhando que nem todos são mais trabalhadores que os outros, nem todos gerem melhor que os outros.
A sua empresa trabalha com qualquer cliente, desde que não promova produtos ou serviços ilícitos, mas quanto a partidos já há um travão ideológico. “Somo independentes e há um conjunto de partidos políticos para os quais recusamos trabalhar. “O que vou dizer não colhe muitas simpatias, mas não trabalhamos com o Chega, o PCP ou o Bloco de Esquerda. Só trabalhamos desde o PS até à Iniciativa Liberal. Não vamos mais além disso, nem para a direita, nem para a esquerda”, revela João Duarte, que diz que não pode estar a trabalhar com quem, por exemplo, é contra a economia de mercado. Mas há uma pergunta que se impõe: trabalham a imagem de pessoas com problemas com a justiça? “Há um conjunto de coisas que não podemos estar a defender. Fomos abordados para trabalhar a comunicação de uma pessoa que está acusada em processos de assédio sexual. Recusámos. Não queremos estar envolvidos nessas questões”, responde prontamente o administrador da YoungNetwork Group.
O Ribatejo tem um problema de marca e Santarém precisa de mais força política
Como é que vendia esta região para ser mais interessante? A região do Ribatejo tem um problema de marca, de branding [gestão estratégica da marca potenciando a sua identidade, imagem e reputação]. Não se tem a percepção da importância da região, mesmo em termos de agricultura. Se falarmos de agricultura com pessoas que não são do sector o que identificam é o Alentejo, ou outras zonas, e não falam do Ribatejo, que é das maiores regiões agrícolas de Portugal.
Mas o Ribatejo não é só agricultura… Também é o Tejo, que está por potenciar. Há muito trabalho para fazer aqui na nossa região, que tem sido pouco impactante. O Oeste, onde resido, tem uma marca mais forte.
A união que se perspectiva entre o Vale do Tejo e o Oeste parece-lhe benéfica? O Oeste tem muito potencial, muita potência de muitas coisas. Tem mar e tem muita indústria. Têm de se fazer projectos estruturantes em Santarém. Há alguns a acontecer, mas continua a ser uma cidade que vive de costas viradas para o rio, para a Ribeira de Santarém, para as Caneiras que são zonas fabulosas em termos de potencial. A linha férrea entre a cidade e o Tejo não pode servir de desculpa.
O que é que pensa da abolição da marca Ribatejo em detrimento da Vale do Tejo? Não tenho uma opinião totalmente fechada. Vale do Tejo é mais abrangente, mas sou mais por Ribatejo, por razões históricas. Quando a região passou a pertencer ao Alentejo em termos de fundos comunitários, trocámos a identidade pelo dinheiro. O que falta na região de Santarém não é só mais investimento é também mais força política.
Tomar tem sabido vender-se melhor do que Santarém? Não sei se Tomar com uma festa dos Tabuleiros de quatro em quatro anos tem sabido vender-se bem. Eu sei que a festa deve dar trabalho, mas é muito tempo. Santarém é a cidade principal do distrito, mas tem que ser mais explorada na sua centralidade, na sua proximidade a Lisboa.
Está a conseguir-se reforçar a capitalidade de Santarém? Ainda está muito por fazer. Claro que já evoluímos bastante, mas não chega.
Quando vem a Santarém o que é que vê? Vejo uma cidade lindíssima que pode fazer muito mais do ponto de vista turístico, do ponto de vista de indústria. É importante continuar a valorizar o património. Não podemos ter o [teatro] Rosa Damasceno como está. Aquilo é uma tristeza. O mercado demorou muitos anos. Uma obra destas não pode demorar tanto tempo. A cidade é Capital do Gótico, falamos disso com muito orgulho, mas pouca gente sabe isto. Quase ninguém sabe que o Pedro Álvares Cabral está sepultado na Igreja da Graça.
Mas mais turismo e mais indústria depende também da existência de mão-de-obra… O turismo, por exemplo, implica imigração porque há uma geração que agora gosta menos de trabalhar e porque não nasceram os portugueses suficientes. Já nem na construção existem portugueses ou existem poucos. As pessoas não estavam habituadas a pessoas muito diferentes de nós, com religiões diferentes.
A palavra que está a dar votos e a comunicação dos candidatos à capital do distrito
Como amigo do ex-presidente da Câmara de Santarém, Ricardo Gonçalves, esperava mais dele como autarca? É um bocado difícil falar dessas coisas, porque também trabalhei para a câmara, mas acho que o trabalho dele foi positivo. Os mandatos, já se sabe, têm altos e baixos e em Santarém há uma coisa muito positiva, que não tem tido visibilidade, que é a questão financeira. As contas estavam muito no vermelho e ele deixou-as numa situação muito saudável. É mais fácil construir agora a partir daquilo que deixou.
Ainda bem que Ricardo Gonçalves também se formou em Economia, não é? Também é do perfil dele. O Ricardo é poupadinho e uma pessoa fácil de se gostar.
Dos candidatos à Câmara de Santarém, João Leite e Pedro Ribeiro, quem é que comunica melhor? São dois bons comunicadores. Mas acho que o João leva vantagem, diria eu, porque está no está no lugar de presidente. Mas por outro lado, também leva mais com o desgaste de ser o mesmo partido há muitos anos no poder. Para o PS a oportunidade está nestas eleições, porque se ganhar é natural e fácil que seja reeleito. O último mandato é sempre o pior. O Ricardo Gonçalves já sofreu um bocadinho a erosão nos votos ao fim de oito anos, porque as pessoas já estão cansadas.
Qual é a melhor forma de comunicar em eleições autárquicas? Há temas que podem não ser os mais importantes naquilo que é o trabalho autárquico, mas que são mais importantes para se comunicar numa eleição. Assim como há temas proibidos. Há frases que consoante as circunstâncias podem ou não ser ditas. Por exemplo, dizer que vai diminuir pode ter vantagens e desvantagens em comunicar perante o que se vai diminuir. Na Argentina neste momento o que dá votos é dizer que se vai diminuir muito o Estado.
Em Portugal o que é que está a dar votos? É o crescimento. Essa é a palavra chave. Pode não ser a que dá mais votos agora, mas é a mais importante. A verdade é que há um foco muito grande no distribuir e tem que se meter um foco muito maior no crescimento. Depois há as percepções, um tema fundamental neste momento, como é a questão da imigração e que já levou o PS a corrigir o rumo. É uma questão que está na cabeça das pessoas. Na minha opinião a imigração é fundamental para a Europa e para países como Portugal.
Actualmente com tanta comunicação onde é que está o papel da informação? Os guardiões da informação são os jornalistas, não são as agências de comunicação. Às vezes podemos estar a fazer comunicação no sentido de influenciar e persuadir os públicos para determinado sentido. Mas no limite, quem tem que avaliar os factos é a comunicação social, pelo que a função dos jornalistas é muito importante.
A vossa empresa também serve de trampolim para funções públicas, como aconteceu com o seu conterrâneo Tiago Preguiça que foi director-geral da Segurança Social, assessor e chefe de gabinete nos Governos do PS. A nossa empresa é uma escola de formação. Às vezes vamos buscar as pessoas à faculdade e fazem o percurso durante muitos anos. Com o Tiago Preguiça percebia-se logo muito potencial, muita qualidade. Agora é director de uma empresa de combustíveis espanhola. Temos outras pessoas que passaram pela empresa que são directores de comunicação em câmaras municipais.
O Euroregião que lhe fez virem as lágrimas aos olhos, os jornais de clubes e o clube electrónico
Quando João Duarte soube que o seu projecto de criar um jornal online sobre as regiões de Portugal, o Euroregião, que diz ser um serviço de informação de utilidade pública, tinha sido um dos poucos vencedores entre meio milhar que disputava um orçamento da União Europeia, vieram-lhe as lágrimas aos olhos. Não tanto pela dimensão do projecto mas por ter sido escolhido entre muitas empresas.
Mas a sua ligação à informação passa também pelo mundo do futebol, depois de ter feito a comunicação do Sporting, através de um pequeno grupo de média que criou jornais monoclubes online: um que só fala do Benfica (Glorioso 1904), outro do Sporting (Leonino), outro do Flamengo (Gazeta do Urubu) e outro do Corinthians (Fiel Manchete). João Duarte diz que são jornais potentes com 10 a 15 milhões de visualizações por mês.
Mas outra paixão de João Duarte é um clube de desportos electrónicos, Sharks Esports, que funciona exactamente como um clube de futebol, que gere há oito anos e tem tido “um sucesso assinalável, ao ponto de vendermos jogadores por valores que a União de Santarém não conseguiria alcançar”. Os jogadores têm normalmente até 30 anos por causa da “mecânica e cérebro” e chegam a ser vendidos por mais de 300 mil euros. “Um jogador nosso com 130 quilos que foi ganhar 10.000 euros por mês para o outro clube e a nossa equipa é a 50ª do mundo”. Neste momento a equipa está perto de conseguir entrar na maior competição que é o Major América.