José Castela: um mentiroso com pouca arte

José Castela: um mentiroso com pouca arte

Este é o oitavo artigo que publico em O MIRANTE sobre “as histórias e enredos sobre as Comissões de Inquérito” de que fui auditor na qualidade de deputado do PSD. Desta vez conto a história de um dos convidados que tentou usar uma estratégia para não aparecer nos media. Se a preparação destas audições obrigavam a um grande esforço de pesquisa e de estudo por parte dos deputados, isso não era menos verdade para os depoentes. Alguns dos nossos “convidados” confessavam que seguiam as audições da CPIBES como se de uma “série” ou novela se tratasse, já que era a melhor forma que tinham para se prepararem.

Assustados com o mediatismo e impacto das anteriores audições, alguns depoentes da Comissão de Inquérito começaram a tentar “fugir” das câmaras de televisão ou mesmo do escrutínio público. José Castela, entretanto falecido, protagonizou um dos casos mais rocambolescos da investigação, pois pediu a Fernando Negrão para fazer a sua audição à porta fechada. Era um direito que as pessoas tinham caso quisessem contar factos que estivessem ou em segredo de justiça ou protegidos por segredo bancário. Por outro lado, na qualidade de simples funcionários das entidades envolvidas que fossem prestar testemunho, tinham direito à sua privacidade, já que não eram figuras públicas. José Castela fez essa exigência e deu a entender que estava disposto a revelar factos importantes para a investigação. Negrão e os restantes deputados ficaram desconfiados, parecia pura estratégia para fugir dos holofotes e do escrutínio. Trocamos propositadamente de sala para esse efeito. O decorrer da audição viria a provar que tudo não passava de uma artimanha para passar despercebido. 

“Não é controller financeiro do BES? Mas ele deu-me um cartão que dizia isso” Castela tinha sido chamado à CPIBES como “controller financeiro” do grupo BES/GES. Assim que foi confrontado com perguntas sobre essa função, e ainda na sala à porta fechada, José Castela recusou quer a responsabilidade quer o título “eu não sou nem nunca fui o controller financeiro do GES/BES). Tendo em conta a informação a que já tínhamos tido acesso, esta resposta surpreendeu tudo e todos. Dias depois, numa outra audição, essa na íntegra à porta fechada, o nosso interlocutor, quando questionado sobre se José Castela era ou não era o “controller financeiro do BES/GES” respondeu: “claro que era, até me recordo de ele me dar um cartão de visita que dizia – José Castela, controller financeiro do BES” e, se bem me lembro, sacou do dito cartão que ainda tinha na carteira. A estupefação foi total. Grande “aldrabão” teremos pensado quase todos. 

Voltando à audição de Castela, Fernando Negrão acabou por o interromper, acusando-o de não estar a responder a nada do que era perguntado, e muito menos a dar respostas cujo conteúdo estivesse em segredo de justiça ou protegido por segredo bancário. Assim não fazia sentido prosseguir a audição em regime fechado, tendo Negrão decidido abrir as portas e autorizar a transmissão online da mesma.

Creio que na altura Castela não era ainda arguido mas não nos surpreendeu que viesse a ser um dos principais arguidos da acusação do Ministério Público sendo acusado de alegados crimes de burla qualificada e falsificação de documentos, sempre em co-autoria com Ricardo Salgado. Algum tempo depois José Castela viria a falecer vítima de doença prolongada. 

A pressão de vir à CPIBES era tanta que os nossos “convidados” começaram a ter cada vez mais cuidados. Raros eram os que faziam depoimento sem a presença de um advogado da sua confiança e procuravam ao máximo não dar respostas que os pudessem comprometer perante a justiça. Associado a este perigo do comprometimento judicial começava a aparecer também a preocupação com o impacto que as respostas poderiam ter para a imagem destas pessoas, tanto junto de amigos e familiares como também no mundo profissional. Se a preparação destas audições obrigavam a um grande esforço de pesquisa e de estudo por parte dos deputados, isso não era menos verdade para os depoentes. Alguns dos nossos “convidados” confessavam que seguiam as audições da CPIBES como se de uma “série” ou novela se tratasse, já que era a melhor forma que tinham para se prepararem.

Duarte Marques

Leia os artigos anteriores aqui.

Mais Notícias

    A carregar...
    Logo: Mirante TV
    mais vídeos
    mais fotogalerias

    Edição Semanal

    Edição nº 1661
    24-04-2024
    Capa Vale Tejo
    Edição nº 1661
    24-04-2024
    Capa Lezíria/Médio Tejo