Identidade Profissional | 07-12-2022 15:00

“O ensino profissional é o futuro da qualificação”

“O ensino profissional é o futuro da qualificação”
Clara Ferreira é professora há quase 30 anos e adjunta da direcção do AE Ginestal Machado há quatro

Clara Ferreira iniciou o seu percurso profissional como programadora informática mas pelo caminho apaixonou-se pelo ensino, que nunca mais largou.

A professora e adjunta da direcção do Agrupamento de Escolas Ginestal Machado, em Santarém, defende que o ensino profissional é o futuro da qualificação, embora ainda esteja envolto num preconceito enraizado. Entre as fragilidades do sistema educativo em Portugal o cansaço dos professores é a que mais a preocupa.

O ensino profissional tem que deixar de ser visto como a alternativa para os alunos com piores resultados. A luta contra este preconceito há muito enraizado na sociedade - incluindo entre encarregados de educação e professores - tem sido uma das que integra a agenda da professora de Informática, Clara Ferreira, que lecciona na Escola Secundária Ginestal Machado, em Santarém, onde o ensino profissional, garante, é “exigente e valorizado”.
Nesta escola, onde todos os anos esgotam as vagas dos cursos profissionais, os alunos têm acesso facilitado ao mercado de trabalho e muitos “são bem sucedidos”, dada a vertente muito prática do ensino. Quanto aos que optam por seguir para o ensino superior, diz a professora especificamente sobre os que frequentam o curso de Informática e Sistemas, têm “mais-valias porque vão melhor preparados”.
Clara Ferreira não duvida que “o ensino profissional é o futuro” da qualificação. “As pessoas vão começar a ver os profissionais com outros olhos, precisam ver. Mesmo o ensino superior tem de se adaptar porque não precisamos de tantos cientistas da teoria, mas de pessoas que façam na prática, que comecem cedo a estagiar e a trabalhar”, defende, vincando que é urgente erradicar o preconceito que ainda persiste.
O percurso desta professora começou a escrever-se por mero acaso, numa altura em que o plano era trabalhar como programadora de informática numa empresa. Chegou a trabalhar em duas, mas a meio do curso de Informática de Gestão no Politécnico de Santarém foi dar aulas para a Escola Secundária do Forte da Casa e essa experiência trocou-lhe as voltas. “Apaixonei-me de tal forma pelo ensino que nunca mais quis largar”. Recusou efectivar numa empresa onde iria “ganhar o dobro” e, por causa disso, mas também porque “já naquela altura não havia muito respeito pela profissão”, a mudança de rumo profissional foi “muito mal recebida” em casa. “Ainda hoje não me posso queixar do cansaço sem vir a velha história: eu avisei-te”.

“Transformou-se o ensino numa profissão muito pouco apelativa”
As queixas desta professora com 30 anos de serviço prendem-se sobretudo com a falta de tempo para fazer actividades que lhe dão prazer, como a dança, a fotografia e a natação. “No tempo em que comecei a dar aulas os professores tinham tempo para ser interessantes aos olhos dos alunos”. Actualmente vivem envoltos em burocracias, mais horas de aulas - nalguns casos para compensar a falta de professores - e mais alunos por turma. “Para se ter uma ideia, um professor em final de carreira dava 12 horas de aulas, hoje dá 26, além de trabalhar mais anos”.
“Vejo à minha volta pessoas extremamente cansadas e magoadas com uma profissão muito pouco valorizada pelos encarregados de educação, Governo e pela restante função pública, o que prejudica o ensino. Imagine-se o que é ter aulas com uma pessoa triste, cansada e desanimada. Atenção, estamos a construir um país aqui; as escolas precisam de pessoas jovens e cativantes”, afirma, salientando que entre as muitas fragilidades do sistema educativo em Portugal “o cansaço dos professores é o que mais preocupa”. E bem que poderia falar durante horas de muitas outras questões, como os baixos salários, o facto de muitos terem que andar anos de mochila às costas até efectivar (se não desistirem antes de acontecer), o desrespeito da sociedade para com a profissão ou a necessidade de modernização das escolas ao nível de equipamentos e infra-estruturas.
Conseguir deixar a escola melhor do que a encontrou em termos de equipamentos informáticos é um feito do qual Clara Ferreira já se pode orgulhar. Não que faça intenções de deixar o ensino num futuro próximo mas a “vontade de mudar a escola para melhor” foi a grande motivação para encarar, há quatro anos, o cargo de adjunta da direcção. Conseguiu modernizar o software que permitiu aos professores lançar notas à distância, melhorou o acesso à Internet e que fossem substituídos computadores obsoletos. “Quando os montei, um a um, chorei porque sabia que a partir daquele momento os meus colegas iam poder dar aulas condignamente”, diz, lamentando em jeito de alerta para a necessidade de maior investimento do Estado nas escolas, que a estrutura eléctrica seja a mesma de há “50 anos” e falhe demasiadas vezes.
Sobre a informática, disciplina que lecciona (denominada de Tecnologias da Informação e Comunicação no ensino regular), aproveita para alertar que os alunos de hoje são “nativos digitais” e que “a informática muda todos os dias e não quando o Ministério da Educação (ME) se lembra de fazer novos programas”. Devido a atrasos nessa mudança, confessa, já teve que usar “programas que não eram os indicados” pelo ME para que os alunos pudessem acompanhar a actualidade. Voltando ao tema da falta de professores mais especificamente na disciplina de TIC, a professora remata desta forma: “sentar os alunos dois a dois em frente a um computador durante 45 minutos uma vez por semana não é solução para o ME colmatar a falta de mão-de-obra. A qualidade do ensino fica comprometida”.

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