O fotógrafo que não é adepto das poses nem dos sorrisos forçados
Começou a fotografar na juventude com a máquina que comprou com o suor do seu trabalho.
Foi serralheiro e ajudante de obras, mas foi na fotografia que encontrou a realização profissional. Irreverente e descontraído, Carlos Ferreira soma vários prémios fotográficos de casamentos e não se inibe ao dizer que as pessoas precisam de pousar os telemóveis, parar de fotografar e apreciar os momentos.
Carlos Ferreira estreou-se cedo no mundo do trabalho, mais precisamente aos 13 anos, idade com que se mudou do norte do país para o Entroncamento. De serralheiro a ajudante de obras, fez de tudo um pouco, mas em nenhum dos empregos que arranjava se sentia realizado. Fazia-o para ajudar a manter as contas de casa equilibradas e para “sustentar o [seu] vício”: a fotografia. Conseguiu trabalho num estúdio no Entroncamento, comprou a primeira máquina fotográfica com poupanças amealhadas e começou a fotografar os colegas de escola. Desde aí, o fotógrafo com estúdio em Torres Novas nunca mais parou. Adepto do sorriso não forçado, Carlos Ferreira é um comunicador, um observador dos pormenores, que não se limita a ficar escondido atrás de uma lente.
“Não sou uma pessoa fria que pega numa máquina e começa a disparar, mas também nunca mandei rir ninguém para uma fotografia. Acho isso ridículo”. O que faz, explica, é criar situações para a pessoa se rir naturalmente, porque “ser fotógrafo também é saber ser comediante” nalguns momentos, nomeadamente nos casamentos, que actualmente representam 80% da sua actividade a par dos baptizados, sessões de grávidas e recém-nascidos. E neste meio, onde as opções são vastas, há que saber marcar a diferença pela postura e pelo trato. “Os noivos têm de se identificar com a personalidade do fotógrafo. Depois, nós temos que nos adaptar a eles, perceber como os devemos fotografar”, diz.
Se fotografa qualquer casamento? A esta pergunta, o fotógrafo que tem no seu estúdio a referência a cinco prémios Wedding Awards, conquistados em cinco anos seguidos, responde com um “não” certeiro. “Tenho que perceber se vou gostar de fazer aquele casamento ou não. Se quiserem um casamento de fotografias a fazer poses não se vai enquadrar”, refere, explicando que no seu entender os melhores registos fotográficos são captados em momentos descontraídos, naturais. A máquina “está sempre quente, pronta a disparar” no momento certo, seja no beijo, num abraço inesperado ou num olhar emocionado. “Aquela fotografia da praxe que os familiares fazem com os noivos pode tornar-se num momento cansativo, porque é forçado”.
“Tem-se uma ânsia enorme de fotografar e publicar”
Mas o que nos casamentos incomoda verdadeiramente um fotógrafo, atira, são as câmaras dos telemóveis. “São uma praga porque queremos fotografar, fazer o trabalho profissional para o qual estamos a ser pagos pelos noivos e temos os convidados de telemóvel na mão”. Num casamento, conta, chegou a questionar os convidados se iriam continuar a apontar a câmara do telemóvel ou libertar as mãos para atirar arroz e pétalas de flores aos recém-casados. “Tem-se uma ânsia enorme de fotografar e publicar. As pessoas precisam de parar um pouco com o telemóvel e as fotografias e divertirem-se mais”, afirma.
Carlos Ferreira nota que há um decréscimo dos pedidos de fotografia impressa, seja em casamentos ou noutro tipo de eventos e que há uma procura maior pelo digital. Outra das grandes mudanças que nota desde que abriu o primeiro estúdio de fotografia, no início dos anos 90, é a ausência de trabalho no espaço físico. “Temos pouco ou nenhum. São os sinais dos tempos”, afirma na certeza de que ficaram no passado as sessões fotográficas em estúdio de uma família ou dos primeiros anos de vida de um bebé. “Estamos numa vertente muito mais natural, onde eu é que saio para fotografar o bebé recém-nascido na sua casa, o que me fascina muito mais”.
Sobre o trabalho de um fotógrafo e os comentários que ouve sobre ser um serviço “caro”, Carlos Ferreira sublinha que as tarefas não se esgotam no dia do evento. “Há um trabalho de bastidores do qual grande parte das pessoas não tem noção”. A edição de um vídeo de casamento, diz a título de exemplo, “demora uma semana” e a edição de um álbum cinco dias ou mais. E tudo isso, reforça, leva tempo e tem custos, apesar de actualmente o processo ser mais simples do que na altura em que se utilizavam máquinas analógicas.
A paixão pela fotografia desportiva
Nos primeiros anos como fotógrafo, ainda nos seus tempos de juventude, Carlos Ferreira vibrava a fotografar competições de motociclismo. “Tudo o que está em movimento e que é imprevisto é mais difícil de fotografar. E, nesse aspecto, o motociclismo ajudou-me muito, foi a minha escola”, afirma, contando que acabou por deixar esse passatempo por ser dispendioso e lhe tirar o tempo livre que hoje prefere dedicar à família, em particular aos três filhos.
Para os trabalhos que realiza, o fotógrafo conta com profissionais de vários pontos do país e, revela, gosta de trabalhar com jovens. “O discurso: eu é que sei porque estou nisto há muitos anos, irrita-me solenemente. Além disso aprendo bastante com os jovens”, conclui.