Uma chefe de cozinha que adora o desafio de criar novos sabores
Tirou o curso de cabeleireira mas não gostou do ofício. A aventura no mundo da cozinha começou aos 19 anos quando saiu de Benavente para a Suíça onde começou a trabalhar num hotel.
Aos 54 anos a chefe Célia Mendes recorda os anos de aprendizagem e como começou a dar aulas. Em breve vai abrir uma pastelaria onde podemos encontrar o doce que criou, com produtos da terra, o Carolinata.
O percurso profissional da chefe de cozinha Célia Mendes começou a desenhar-se quando aos 19 anos emigrou para a Suíça. Tirou o curso de cabeleireira para ajudar a mãe, que exercia a profissão, mas não gostava do ofício e trabalhou num escritório. Na Suíça encantou-se por aquele que considera o sítio mais bonito do mundo, S-chanf. Começou no Verão a trabalhar num restaurante de montanha, onde não havia luz e a água falhava porque vinha directamente da nascente. “Amei aquilo mesmo não estando habituada. Foi onde conheci o meu marido. É o que se pode dizer que é amor e uma cabana (risos)”, conta.
O gosto pelas línguas levou-a a inscrever-se numa escola para aprender alemão, já em Portugal, antes de partir para fazer mais uma campanha na Suíça. O hotel para onde foi trabalhar recebia vários chefes de cozinha que a convidavam para trabalhar com eles noutros sítios. Célia Mendes aprendeu a confeccionar novas receitas e a aprender técnicas. “Fui sempre ganhando o gosto pela cozinha e tirava apontamentos. Tentava replicar em casa as receitas e dava a provar. Ainda hoje, quando preciso de alguma coisa, vou aos meus apontamentos antigos. Gosto de fazer as receitas que aprendi na Suíça mas com produtos nossos”, revela.
A chefe ficou duas décadas na Suíça e não só como responsável pela cozinha, onde obteve certificação. No hotel passou por todas as funções e ficou com a responsabilidade dos quartos cerca de cinco meses. De dia trabalhava em restaurantes e à noite nos bares e chegou a estar num hotel para crianças. Considera-se uma pessoa dinâmica que não gosta de fazer sempre o mesmo.
Regresso a Benavente
Célia Mendes equacionou o regresso definitivo a Portugal quando teve um problema num joelho. Mas um colega de profissão convidou-a para trabalhar na recepção de um hotel e aceitou. Nos três anos em que desempenhou a função melhorou o alemão, falava francês e dominava o italiano. Na Suíça falam-se as três línguas. As saudades dos filhos acabaram por ditar o regresso do casal a Benavente. Os filhos nasceram em Portugal e passavam temporadas de férias na Suíça com os pais mas nunca quiseram ficar fora do país definitivamente.
Quando chegou a Portugal Célia Mendes fez formação pelo IEFP de Alverca e a partir daí a vida deu nova volta. Começou a dar formação profissional na área, desafiada pelos colegas. Especializou-se em pastelaria e acumulou formações de cakedesign e chocolate. Leccionou em Alverca, Amadora, Lisboa e no Forte da Casa.
“Tenho pessoas que me dizem que se sou tão boa no que faço porque dou formação. Quando ajudamos os alunos, muitos com problemas, não consigo sair. É uma forma de contribuir para eles serem alguém na vida. São turmas consideradas rebeldes mas só querem que alguém os compreenda. Recordo turmas de meninos vindos de outro país e que terminaram o 12º ano. Ficaram com ferramentas para serem alguém, viverem com dignidade e terem forma de sustento”, conta.
A O MIRANTE Célia Mendes considera que devia ser dada formação aos professores para lidar com alunos com necessidades educativas especiais uma vez que ninguém os prepara. Lidou com alunos com autismo colocando-se no lugar de mãe. No final dos cursos a melhor satisfação que pode receber são os abraços.
“Sinto-me muito valorizada pelas pessoas e acarinhada pelos pais dos alunos. Tenho alunos que foram para fora trabalhar, outros estão em hotéis em Portugal e até eram bastante rebeldes. Às vezes mandam-me mensagens e ainda me procuram”, continua.
Carolinata e Franxiro
A criação mais conhecida de Célia Mendes é o doce Carolinata. Surgiu para o Festival do Arroz Carolino das Lezírias Ribatejanas, tem marca registada, mas só pode ser adquirido durante o certame. Em Vila Franca de Xira criou o doce Franxiro, também criado com produtos endógenos. “Deixa-me triste ir a um restaurante e a ementa não ter nada que sobressaia para atrair o cliente. Gostaria daqui a uns anos ir a um restaurante de Benavente e ter um prato de arroz carolino. Tem de haver um factor diferenciador”, afirma.
A criação de novos sabores é o maior desafio da chefe. Conta que está a estudar um doce que tem como base o tomate, um produto da região. Em breve vai abraçar um novo sonho e abrir uma pastelaria em Benavente. A data ainda não está definida mas já tem o espaço. Ali será possível comprar e encomendar o Carolinata o ano inteiro, entre outros doces mais ou menos comuns.
Actualmente ainda coordena o curso de cozinha e pastelaria na Escola Secundária do Forte da Casa, onde está há nove anos, mas não sabe se a formação vai ter continuidade. Certo é que vai deixar de leccionar para se dedicar exclusivamente ao novo negócio.
“Tenho pena e deixa saudade mas também o sentimento de dever cumprido. Não sei se o curso vai encerrar mas não passa por mim. Os alunos fazem sempre uma grande festa quando me vêem”, confessa.
Célia Mendes é júri em vários concursos de cozinha desde 2014. Os seus alunos já foram medalhados em alguns concursos que participou ao longo dos anos. Não é fã de programas de culinária e concursos de cozinha na televisão mas admite que são bons programas de entretenimento. Vai continuar a fazer formação e quem sabe, no futuro, abrir um restaurante.