Identidade Profissional | 15-10-2024 07:00

Dina Mendes é uma das guardiãs dos sabores tradicionais do Tejo e da região

Dina Mendes é uma das guardiãs dos sabores tradicionais do Tejo e da região
IDENTIDADE PROFISSIONAL
Dina Mendes, sócia gerente do Voltar ao Cais, queria trabalhar no mundo da moda mas foi a cozinha que lhe arrebatou o coração

Não faltam atributos e elogios ao restaurante Voltar ao Cais em Alhandra, situado a poucos metros do Tejo e onde os sabores de antigamente ganham vida pelas mãos de uma equipa apostada em bem servir. Da moda à culinária, este é o percurso de vida de Dina Mendes pelo mundo dos sabores da região.

Do arroz das lezírias aos campos onde os toiros bravos passeiam, Dina Mendes, de 51 anos, é uma guardiã dos sabores antigos do rio Tejo e da região. Sócia-gerente do restaurante Voltar ao Cais, em Alhandra, a sua jornada é marcada pela dedicação à preservação da gastronomia tradicional, especialmente a que envolve os sabores do rio e do concelho de Vila Franca de Xira.
“Vivemos numa região muito rica e tento fazer o meu melhor e a equipa também para preservar essas comidas e sabores de outros tempos. Tenho muito medo que os sabores da nossa terra venham a desaparecer com o passar dos anos. A nossa gastronomia tradicional, de tacho, está a perder-se e temos de remar contra essa maré e ir ao encontro dos nossos sabores tradicionais e dá-los a conhecer. Não nos podemos dar ao luxo de perder a nossa gastronomia típica”, conta Dina Mendes a O MIRANTE.
Embora nascida em Lisboa, na Maternidade Alfredo da Costa, Dina Mendes orgulha-se de ser da Subserra, uma ligação que influencia profundamente a sua visão e paixão pela culinária regional. Apesar do seu primeiro amor ter sido o mundo da moda, tendo chegado a estagiar em França, foi ao regressar a Portugal que encontrou o caminho que lhe definiria o futuro. Em 2007, com o marido, fundou o Voltar ao Cais, um projecto que se tornou o sonho concretizado e que é quase como um filho para o casal.
Desde cedo a cozinha esteve presente na vida de Dina Mendes. Aprendeu muito com a mãe e sempre manteve uma forte ligação ao peixe e aos pratos tradicionais. A paixão traduz-se agora numa oferta gastronómica rica em pratos icónicos da região, como o ensopado de enguias, o torricado de bacalhau e a carne de toiro. Esta última, apesar de ter sido subvalorizada no passado, ganhou o seu espaço no restaurante graças à insistência de Dina, que acredita nas suas qualidades distintas face à carne de cativeiro, como o sabor intenso e a textura ligeiramente mais escura. É por isso que o restaurante oferece ideias desta carne como o lombo de toiro à portuguesa, cataplana de toiro com camarão (que é prato do dia ao domingo ao almoço) e outras ideias fora da caixa, como os hambúrgueres e croquetes de toiro servidos sempre com arroz das lezírias. “Tentamos sempre usar ingredientes da nossa região e da nossa terra”, garante a empresária.
Rissóis de garoupa, pastéis de massa tenra, jaquinzinhos, ensopado de enguias, gambas à braz, arroz de entrecosto com grelos, açorda de coentros, filetes de sardinha ou galinha de cabidela são outras surpresas do menu, que tem sido há vários anos uma referência do guia Boa Cama Boa Mesa do Expresso.

O amor nota-se no sabor
Dina Mendes acredita que a cozinha, quando feita com amor e paixão, transforma a experiência dos clientes. Defende que o segredo de um bom prato está na paixão da sua elaboração e na qualidade dos ingredientes, algo que ela e a sua equipa praticam todos os dias. Embora possua três chefs na equipa - que para a empresária serão sempre chamados cozinheiros - diz que a equipa do Voltar ao Cais, composta por duas dezenas de pessoas, é uma verdadeira família, com muitos colaboradores que têm crescido ao longo dos anos ao lado de Dina e do marido, criando um ambiente acolhedor e de confiança.
A empresária diz ter casado com o negócio e só com muito empenho tem sido possível fazê-lo crescer e merecer a admiração dos clientes, que vêm de todo o país propositadamente para o conhecer e, por acréscimo, visitar também a vila ribeirinha. “Tento todos os dias dar o meu melhor nas funções que desempenho e nunca penso muito no que vem depois. As coisas têm corrido bem e a humildade traz-nos os resultados. Não despejamos comida à frente do cliente, como infelizmente acontece muito hoje em dia. Queremos um atendimento diferenciado, uma atenção, diálogo, é preciso”, refere.
O restaurante tem uma esplanada mesmo à beira-rio mas as entidades estatais não permitem que seja usado de Inverno devido à falta de uma cobertura que também não autoriza que seja colocada.
O Voltar ao Cais fecha ao domingo à noite e à segunda e terça-feira. “Tomámos esta opção pela nossa equipa. Damos dois dias de folga semanal. São como família e queremos que se sintam bem no trabalho”, explica.

Uma porta de entrada em Alhandra
O restaurante é hoje um ponto de encontro para portugueses de todo o país e estrangeiros que, atraídos pela fama do local e pelas recomendações, fazem questão de incluir uma visita ao Voltar ao Cais nas suas viagens. “Há estrangeiros que saem de Lisboa porque querem um serviço diferente. Estamos muito perto de Lisboa mas, na realidade, é como se estivéssemos na província. E o serviço em Lisboa, em muitos casos, infelizmente, não é o melhor. Aqui gostamos mesmo de receber”, defende.
Para Dina Mendes, a chave do sucesso está na verdade, na humildade e na dedicação constante. Mesmo sendo uma perfeccionista, ela sabe a importância de equilibrar o trabalho e a vida pessoal, desligando-se do restaurante quando as portas se fecham. E, mais do que receber elogios, guarda as memórias dos clientes – especialmente as das crianças – que escrevem mensagens nas toalhas, uma prática que reflecte o ambiente acolhedor e familiar que a empresária tanto preza. “Se as pessoas se aventurassem fora de Lisboa, veriam que temos aqui um tesouro por descobrir”, revela a mulher para quem a mentira a tira do sério. “Num negócio é fundamental a verdade, humildade e dar sempre a cara”, garante.
Para Dina Mendes, o Voltar ao Cais assume-se hoje como mais do que um mero restaurante: é um refúgio gastronómico que preserva a tradição e alimenta o futuro da região trazendo turistas e curiosos a conhecer Alhandra, uma vila à beira Tejo que encanta todos os dias a empresária. “Aqui quando chegamos à beira rio não vemos cimento e isso faz toda a diferença”, conclui.

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