“Ir trabalhar para a empresa da família é escolher o caminho mais difícil”
Luana Piedade, licenciada em Gestão de Recursos Humanos, escolheu trabalhar na Quintinha d’Aldeia, empresa fundada pelos seus pais, em Pernes. E, contrariamente ao que lhe disseram, este não foi o caminho mais fácil. Trabalhar com a família é “sentir muito tudo”, o que corre bem e o que corre mal. Diz que gerir pessoas é jogar com o imprevisível e defende que a comunicação transparente é o maior trunfo. Sobre os jovens da sua geração, considera que lhes falta espírito de sacrifício.
Gerir recursos não é fácil em nenhuma área de actividade, porque lidar com pessoas acarreta sempre imprevisibilidade. “É difícil perceber as pessoas. Saber o que as atrai e o que as mantém motivadas para que produzam mais e tragam mais valor para a organização”, diz Luana Piedade, 23 anos, responsável de recursos humanos na Quintinha D’Aldeia, empresa especializada na produção de enchidos e charcutaria. É por isso que, defende, a “comunicação aberta”, sem barreiras, é fundamental para se fazerem ajustes, reter e atrair talento.
“Nenhuma empresa é feita só de si própria, precisa das pessoas para produzir. E as organizações têm de perceber que, para que resulte, precisam também de valorizar os seus colaboradores”, defende a jovem licenciada em Recursos Humanos que acredita que, sobretudo os jovens da sua geração, “não querem empregos das 09h00 às 18h00 que sejam monótonos. Os jovens querem mais, procuram um emprego onde possam ser criativos, aprender mais e ter novas experiências”, afirma. Na Quintinha D’Aldeia, situada em Pernes, no concelho de Santarém, atrair colaboradores é tarefa árdua e é por isso, explica, que a administração se esforça por fazer com que todos estejam “motivados e satisfeitos para que trabalhem para a produtividade”. Para que, resume, “estejam todos a remar na mesma direcção”.
O percurso profissional de Luana Piedade ainda agora se está a desenhar, mas é já repleto de peculiaridades. A começar pela assertividade com que chegou a casa e disse aos pais que, após um mês a frequentar a licenciatura em Psicologia, em Lisboa, não era o que queria para o seu futuro. “Tenho muita consideração pelos meus pais e o que não queria era desiludi-los, andar a brincar aos cursos quando sabia que não era aquilo que queria”, relata. Foi criticada por uns, por desistir do curso ao fim de um mês, mas no seguinte já estava no ISLA, em Santarém, a frequentar a licenciatura de Gestão de Recursos Humanos . “Foi das melhores decisões que tomei”, atira. Pode ter perdido a liberdade de viver sozinha em Lisboa, mas além de frequentar o curso que queria, ganhou a possibilidade de acompanhar a empresa fundada pelos pais, certa de que era ali que queria trabalhar. “Era o que ambicionava, trabalhar ao lado dos meus pais no projecto que criaram e ajudar no que conseguisse”, diz.
Luana Piedade está certa da decisão que tomou embora tenha ouvido, muitas vezes, que estava a escolher o caminho mais fácil. “Ouvi muitas vezes isso. Mas eu acho que ir trabalhar para a empresa da família é escolher o caminho mais difícil”. O fácil seria, com este curso, ir para uma empresa onde não sentisse tanto o peso das decisões. “Trabalhar na empresa da família é sentir muito tudo. Quem tem pais com empresas e trabalha nelas sabe que gerir nos dias de hoje não é fácil. Há muito desenvolvimento sempre a acontecer lá fora em termos tecnológicos, de produtos, de marketing e inovações. Há muita coisa a acontecer e as empresas têm que acompanhar isso, senão acabam por ficar para trás”, refere.
Curiosamente, quando disse aos pais que a sua vontade era trabalhar no projecto da família, estes disseram-lhe que “a vontade deles não era nenhuma”. Precisamente, acredita, pela dificuldade que é gerir um negócio. Dois anos depois da sua entrada a experiência não podia estar a correr melhor. “Trabalhamos muito bem em família e também graças aos nossos colaboradores temos conseguido fazer com que este projecto cresça todos os dias”, diz, contando que rejeitou duas propostas de trabalho que surgiram logo após o final do curso.
Jovens vão para o primeiro emprego a querer ganhar bem e ter pouco trabalho
Luana Piedade valoriza a comunicação transparente, que numa empresa deve acontecer de baixo para cima da pirâmide organizacional e vice-versa, em igual proporção, defende. E não tem medo de dizer o que pensa em relação aos jovens recém-licenciados. “Se calhar o que vou dizer vai ser mal interpretado, mas vou dizer na mesma: é importante termos tempo para a nossa vida pessoal, mas os jovens hoje acham que por tirarem uma licenciatura já são qualquer coisa e que por isso têm de lhes dar um emprego bem remunerado e onde não tenham que se esforçar muito. Acho que têm de ter espírito de sacrifício, que têm de se empenhar, mostrar que se estão a esforçar por dar valor àquela organização”, defende, considerando que a educação que se tem em casa influencia essa forma de estar. “Sempre vi os meus pais trabalhar muito, dedicarem-se muito, empenharem-se muito, para conquistar tudo aquilo que ambicionavam. Nada lhes caiu do céu. Isso foi o que vi e o que incutiram em mim e no meu irmão: se desejamos algo temos de lutar por isso porque nada cai do céu”, diz.
Além dos recursos humanos, Luana Piedade é responsável pela Higiene e Segurança Alimentar da Quintinha d’Aldeia, tendo formação na área. Tem também o certificado em Competências Pedagógicas, o que lhe permite dar formação. Embora trabalhe na empresa dos pais, quis deixar claro desde o início junto deles e dos colaboradores: “não quero que me tratem como a filha do patrão ou da patroa; sou como os meus colegas colaboradores e, quando faço mal, quero ser, e sou, chamada a atenção”.


