Identidade Profissional | 17-12-2025 21:00

A professora catalã que criou em Torres Novas o seu próprio caminho no ensino

A professora catalã que criou em Torres Novas o seu próprio caminho no ensino
IDENTIDADE PROFISSIONAL
Dolores Barbera dirige há mais de 20 anos o centro de línguas que fundou para criar o emprego que não encontrava em Portugal - foto O MIRANTE

Dolores Barbera trocou a instabilidade profissional pela criação do seu próprio centro de línguas, que dirige há mais de 20 anos em Torres Novas, apostando num ensino próximo, turmas reduzidas e uma relação de confiança com professores e funcionários. Ao longo de mais de duas décadas, transformou aquilo que começou por ser uma necessidade — criar o seu próprio emprego — num centro de línguas que continua a marcar gerações de alunos em Torres Novas.

Filha de professora, Dolores Barbera cresceu dentro do ambiente escolar e até teve a mãe como docente durante dois anos — experiência que, entre risos, admite “não ser boa ideia”, mas que confirmou a sua vocação. A sua história começa longe dali, em Igualada, Barcelona. Formada em História e Geografia, mudou-se para Portugal no início dos anos 80, depois de se apaixonar por um português natural de Vila Moreira, Alcanena, onde acabaria por construir a vida familiar que mantém.
Chegou a Portugal com 22 anos e teve de recomeçar do zero, a aprender português, fazer equivalências e voltar a estudar para poder ensinar. Mas o percurso não foi imediato, pois entre exames e os anos dedicados a ser mãe a tempo inteiro de duas filhas, só mais tarde conseguiu apostar totalmente no ensino. Admite que na altura as oportunidades eram escassas, sobretudo para quem queria dar aulas de espanhol, sendo essa falta de portas abertas que a levou a criar o seu próprio projecto em 2004 - o centro escolar Studdy Buddy – Quitxalla. “Sempre gostei de ensinar, era aquilo para que me tinha preparado. Procurei trabalho quando vim, mas como não conseguia, percebi que tinha de criar o meu próprio emprego”, recorda.
A estreia, porém, não foi simples, tendo começado integrada num franchising nos primeiros anos e enfrentado “impedimentos burocráticos” que atrasaram a abertura do centro durante anos. Hoje, funciona com três professoras de inglês e apoio pontual em francês e alemão, sendo o inglês a língua mais procurada, com cerca de 95 alunos entre o 1º ciclo e adultos, enquanto o espanhol tem sobretudo procura empresarial, longe do grande impulso de 2006, quando a língua se tornou mais valorizada no sistema de ensino português. “O boom do espanhol foi em 2006, muito por ser mais fácil e permitir médias mais altas, e essa mentalidade ainda persiste, com pena minha”, admite.
Com cerca de cem alunos, o centro aposta em métodos que fogem ao ensino tradicional, privilegiando criatividade, tecnologia e, sobretudo, escuta activa e exercícios interactivos, mantendo também uma pequena biblioteca para os alunos que não podem comprar livros. “Tentamos dar o máximo para que todos aprendam da melhor forma”, sublinha.
A liderança no dia-a-dia
e adaptação ao país
Dolores Barbera insiste que é “professora, não gestora” e, desde o início, quis criar um ambiente de proximidade, onde tudo se resolve a conversar e nunca por imposição. A escola segue, como descreve, “a lógica de uma casa”, com horários ajustados às necessidades de cada pessoa. Trabalhar no seu próprio centro permite-lhe também ensinar de forma mais próxima e eficaz, algo que considera difícil no ensino público.
Aqui insistimos muito na oralidade e na prática constante, o que não se consegue com 20 alunos numa sala”, sublinha. Por isso, estabeleceu duas regras de que não abdica: turmas até dez alunos e planificações flexíveis, avançando apenas quando a turma está preparada. Defende também que os professores devem ser nativos ou ter vivido nos países das línguas que ensinam, porque “língua e cultura andam juntas”.
Ainda assim, admite que turmas pequenas tornam a gestão económica mais difícil, reconhecendo que “a carga fiscal pesa muito para quem é pequeno empresário”. Contudo, o centro mantém-se estável e beneficia da localização próxima de várias escolas, reconhecendo a professora, de 66 anos, que Torres Novas é um bom lugar para uma escola pequena, com menos concorrência do que nos grandes centros urbanos. Mesmo com os desafios, Dolores Barbera sente que o centro “é como um filho”, criado e desenvolvido com dedicação e guiado pelo seu gosto profundo pelo ensino.
A mudança para Portugal também não foi simples, sentindo dificuldades culturais e sociais ao vir de uma região com costumes diferentes daqueles que conhecia e sentindo de forma intensa a distância da família. A aldeia de Vila Moreira contrastava com a vida que tinha em Espanha e por isso também nunca deixou de regressar ao país natal sempre que podia, primeiro com o marido e depois com as filhas.
Para além do gosto em ensinar, Dolores Barbera tem também gosto em aprender novas línguas, algo que considera essencial na sociedade, não só pelo mercado de trabalho cada vez mais competitivo e móvel, mas pela cultura que cada idioma transporta. Entre aulas e o tempo em família, ainda arranja tempo para o ginásio e para caminhar e, mesmo quando não está a dar aulas, gosta de ficar pelo centro para ver como tudo está, pois o ensino nunca foi apenas uma profissão, mas sim um fio que a acompanha desde a Catalunha e a razão pela qual entra na sala de aula com a mesma dedicação de sempre.

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