Identidade Profissional | 07-11-2022 15:00

Uma máquina de trabalho chamada Guilhermina Abreu

Guilhermina Abreu é cozinheira no CBEI desde a década de 70 do século passado e não se vê sentada no sofá a ver televisão

A cozinheira é um rosto conhecido do Centro de Bem-Estar Infantil de Vila Franca de Xira. Há muito que atingiu a idade da reforma mas não se vê parada em casa de braços cruzados. Quando acaba o horário de serviço continua na associação a fazer voluntariado e a ajudar a cantina social que apoia 28 pessoas carenciadas.

Guilhermina Abreu tem 77 anos, levanta-se todos os dias às 05h30, está no refeitório do Centro de Bem-Estar Infantil de Vila Franca de Xira (CBEI) antes das 07h00 para receber fornecedores e, depois de toda a gente ir para casa, continua na instituição a fazer voluntariado na cantina social. Diz quem a conhece que é uma verdadeira “máquina de trabalho” e que não há forma de reduzir o ritmo. Quando chega a casa, em vez de se sentar no sofá despe a roupa de serviço e vai caminhar uma hora. No dia seguinte repete o plano. Sete dias por semana. A O MIRANTE diz que não há segredos para tanta vitalidade: “É comer pouco e trabalhar muito”, garante a vegetariana, que recusa tocar em tudo o que seja comida rápida, hambúrgueres e pizzas.
Guilhermina Abreu é natural de Viseu mas vive no Ribatejo há mais de meio século. O marido servia na Marinha e a ligação a Vila Franca de Xira vem desse percurso profissional. Guilhermina Abreu começou a trabalhar aos sete anos guardando as ovelhas dos pais, cuidava dos irmãos e ainda tinha de dividir o tempo entre a escola e a catequese. “Quando era criança não tinha grandes sonhos, apenas brincar e ser feliz. Como os meus pais eram lavradores fui crescendo sempre na agricultura e acabei por só ter duas profissões na vida: agricultora e cozinheira”, conta a O MIRANTE.
Aos 20 anos casou e a chegada a Vila Franca de Xira foi um choque. “Fui morar para o Bom Retiro, era um deserto, uma gaiola. Passei de ter liberdade e de ser um pássaro a voar no campo para ficar ali fechada num prédio. Custou-me muito. Por isso, assim que consegui arranjei trabalho num colégio para meninos de elite chamado O Castelo e disse ao marido que não queria continuar a viver às custas dele”, recorda com um sorriso. Entrou como ajudante de cozinha e ao fim de um mês já tinha sido promovida a cozinheira. Nos anos 70, quando o CBEI começou a dar os primeiros passos, inscreveu-se para uma vaga de cozinheira e ficou até hoje.
“Motiva-me a paixão de trabalhar, estar viva e ser feliz. Devo uma parte da minha vida a esta casa. Os dias bons, maus, todos passados aqui. Ainda me levanto com o mesmo entusiasmo e da mesma maneira como sempre trabalhei”, recorda a mulher que não olha às horas que está ao serviço.

Ajudar quem precisa
Na manhã de sábado em que O MIRANTE a encontrou na cantina social do CBEI, Guilhermina Abreu estava a preparar um almoço para 28 pessoas carenciadas sinalizadas pela Segurança Social. A ementa era canja e frango assado no forno com massa. Considera muito importante o papel que o CBEI tem na comunidade, não apenas na resposta aos mais pequenos mas também a quem perdeu todo o amparo e vive nas ruas. Entretanto chegaram também dois refugiados ucranianos.
“A câmara devia fazer um refeitório para os sem-abrigo, para que ao menos tivessem onde comer, para não andarem a comer o que damos debaixo das árvores, na miséria. É muito triste ver isto. Sou muito feliz a fazer o que faço e toca-me imenso todas estas situações”, confessa. Já ficou sensibilizada com muitas histórias e diz que nem sempre é fácil quando alguém cai na desgraça poder sair dela. “Ou têm um acompanhamento muito especial da parte da família, de todas as pessoas que os possam apoiar ou então é difícil. Quem é abandonado pela família, não tem força nem energia para lutar mais pelos filhos e têm que desistir, é muito triste”, lamenta.

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