Nacional | 10-01-2023 11:41

Enxurradas resultam da falta de conhecimento e de humildade face ao clima

chuva mau tempo

Para a geógrafa e climatologista Ana Monteiro, o que aconteceu em termos de intensidade da chuva não foi único e excepcional.

A geógrafa especialista em climatologia Ana Monteiro apontou hoje a "falta de conhecimento geográfico" e de "humildade" nas decisões de obras face ao sistema climático, descartando que o fenómeno ocorrido no fim de semana no Porto tenha sido "excepcional".

"A minha preocupação era para a Área Metropolitana do Porto [AMP], onde eu trabalho e conheço melhor o território, e se adivinha que, com a falta de conhecimento geográfico e a falta de humildade [...] que existe relativamente às nossas decisões, respeitando às características desta personagem que é o sistema climático, estas circunstâncias vão acontecer, e a vários níveis", disse hoje à agência Lusa Ana Monteiro.

A professora catedrática da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP) defende que "quando se toma uma decisão, tem de haver uma visão ou uma análise holística, mas não pode ser exclusivamente de uma área de saber, tem de haver várias perspectivas do conhecimento, e a geografia tem de estar nessas decisões".

"Os cursos da água, por onde passam, o sistema climático, qual é a variabilidade, o que é um episódio excepcional, que estações climatológicas que nós temos para monitorizar o sistema climático ao nível local… isso não existe", disse à agência Lusa.

Para Ana Monteiro, o que aconteceu no fim de semana no Porto "não é único".

"É olhar para a série secular e percebe-se que não é único nem excepcional", disse à agência Lusa por telefone, baseando-se nos "registos da Serra do Pilar, no Porto", entre 1880 e 2007.

Segundo a geógrafa e climatologista, "à luz desta informação" e da análise que tem feito no seu tempo de trabalho, "as ondulações da frente polar não têm nada de anormal".

"É absolutamente comum na nossa latitude que elas aconteçam ao longo e particularmente nesta época do ano", fazendo "parte dos nossos estados de tempo muito frequentes".

Para Ana Monteiro, "o que mudou foi a nossa exposição a esse risco, a nossa vulnerabilidade a esse risco".

"Deixámos de observar o sistema climático e os estados de tempo e por isso sobrevalorizámos a técnica, a inovação tecnológica e ficámos convictos que, com inovação tecnológica, éramos capazes de resolver todas as circunstâncias", observou.

Para a estudiosa do tema, "não é difícil imaginar que com a impermeabilização do solo excessiva, e com a falta de conhecimento geográfico no sentido lato do termo, estas circunstâncias vão ocorrer".

"A única coisa que me surpreende é que a sorte nos tenha ainda protegido bastante, porque por onde correm e para onde correm os cursos de água, temporários e permanentes, é do conhecimento de quem tem de tomar decisões", disse.

Para Ana Monteiro, é necessária a adaptação aos riscos climáticos, já que "a culpa não é do clima".

"Resultam muito mais da vulnerabilidade que nós criamos, com a artificialização do território, e com esta distracção relativamente ao sistema climático, esperando que a ciência e a técnica resolvam tudo", afirmou.

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