O MIRANTE dos Leitores | 20-09-2025 12:38

Os jovens, os telemóveis e as escolas

Júlia Bernardino

Nas salas de aula, a célebre frase proferida e bem conhecida por todos os docentes “guarda o telemóvel!”, já não se ouve, e os alunos, mais presentes e concentrados nas tarefas da aula, podem, finalmente, desenvolver competências sociais e de comunicação, que se tinham perdido devido à dependência causada pelo telemóvel.

Na década de 90 surgiram os primeiros telemóveis em Portugal.

Com teclas, bastante dispendiosos, pesados, fixos nos automóveis ou transportados numa grande mala, tinham um alcance muito limitado, não abrangendo Portugal de lés-a-lés. No início, poucos o possuíam ou conheciam até, estando a sua utilização mais ligada a empresas, a empresários e a comerciais.

Todavia, rapidamente conquistaram o mundo e Portugal não foi exceção! As listas telefónicas, nascidas em Portugal nos finais do século XIX, caíram em desuso com o aparecimento dos primeiros telemóveis com acesso à internet: uma palavra, uma frase, um clique em procurar e, voilà! Num ápice, o resultado da pesquisa aparece perante os nossos olhos, primeiro pasmados, depois, encantados!

Em casa, no trabalho e nas escolas, o telemóvel tornou-se o companheiro inseparável de tantas e tantas pessoas.

Contudo, se por um lado se ganhou em rapidez e em capacitação digital, por outro perdeu-se em relações humanas. As conversas infindáveis entre amigos, as discussões sobre “o sexo dos anjos” que nunca levam a conclusão alguma, mas que são o mote para grandes dissertações filosóficas e arrancam gargalhadas, são substituídas por uma engenhoca que nos conecta com o mundo, com pessoas que não conhecemos, mas que nos impelem a deixar uns “likes”. São essas mesmas pessoas que debitam no instagram e no tiktoc sobre assuntos que não nos interessam, mas aos quais assistimos, ou por pressão dos pares, ou porque simplesmente perdemos uma das maiores competências basilares da humanidade: a capacidade de dialogar, de interagir e de nos relacionarmos com os demais, presencialmente, olhando-nos, olhos nos olhos, e debatendo vários assuntos que, pertinentes ou não, contribuem para o bem-estar individual e coletivo.

E, foi esta necessidade de voltarmos a nos relacionar com os demais, a saber estar em sociedade e a aprender a ser cidadãos ativos, sem precisarmos de recorrer à rede, ao suporte que o telemóvel fornece aos mais tímidos, que terá, certamente, estado na base da decisão da tutela no que respeita à proibição do uso dos telemóveis nas escolas.

Enquanto mãe, considero esta uma decisão fantástica, pois obriga as crianças a correr, a brincar às escondidas e à apanhada e os adolescentes a conversar sobre os mais variados assuntos, desde preferências musicais ao futebol, passando pelas últimas dicas de maquilhagem e unhas de gel e pelo último grito da moda que todos querem usar!

Enquanto professora, aplaudo, veementemente, esta decisão que tardou em chegar! Se, por um lado, e para os alunos mais velhos, os telemóveis são úteis dentro de uma sala de aula, para pesquisas e projetos pontuais, por outro, o seu uso foi generalizado a todos os recintos escolares, tornando os recreios e os espaços de convívio em autênticos cenários digitais, com jovens estudantes sentados em círculos, ou em pé, a jogarem virtualmente uns com os outros, a visualizarem tiktocs e, até mesmo, a conversarem num mundo onde as palavras ditas são mudas, desprovidas de som, substituídas por sms digitados à velocidade da luz.

O ano letivo iniciou em muitas escolas no dia 11 de setembro e as ordens emanadas da tutela estão em vigor e a ser cumpridas. O Agrupamento no qual leciono não fugiu à regra e verificam-se já algumas diferenças no saber estar e interagir dos alunos. Finalmente, uma medida imposta pela tutela que visa o bem-estar geral de toda a comunidade educativa e que, ao contrário do que à priori poderíamos pensar, foi muito fácil de implementar, encontrando-se já a dar os primeiros frutos!

O pátio fervilha com as conversas e as risadas ecoam! Os alunos dão asas à sua imaginação e reaprendem a saber estar e a falar com os seus pares e com os adultos, reaprendem a interagir e a fazer parte de um todo, a serem jovens com participação ativa na sociedade e no mundo em que vivem.

Nas salas de aula, a célebre frase proferida e bem conhecida por todos os docentes “guarda o telemóvel!”, já não se ouve, e os alunos, mais presentes e concentrados nas tarefas da aula, podem, finalmente, desenvolver competências sociais e de comunicação, que se tinham perdido devido à dependência causada pelo telemóvel.

Parece que recuei no tempo e voltei aos primeiros anos de profissão, sem internet, sem iphones ou andróides, apenas a imaginação dos alunos que, tal como há décadas atrás, inventam mil e uma formas de estar e brincar, incluindo todos, inclusivamente aqueles que não têm telemóveis de topo gama, pois, afinal, já são necessários para que haja pontos de encontro entre os jovens. O companheirismo, a amizade e a tão almejada interação e participação social ativa parecem, finalmente, estar de volta às nossas escolas portuguesas!

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