O MIRANTE | 02-03-2023 14:00

Bombeiros Voluntários de Vialonga são uma associação de braço dado com a comunidade

Bombeiros Voluntários de Vialonga são uma associação de braço dado com a comunidade
ESPECIAL PERSONALIDADES DO ANO
Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Vialonga, presidida por Cristiana António, desenvolve várias actividades ao longo do ano que fazem a diferença no quotidiano da freguesia do concelho de Vila Franca de Xira

A Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Vialonga faz a diferença no quotidiano da freguesia mais a sul do concelho de Vila Franca de Xira pela sua forma de actuar e no apoio que presta à população. A corporação é presidida por Cristiana António, uma mulher num mun-do ainda marcadamente masculino. Na direcção há quatro homens e duas mulheres: Sónia Fer-nandes, José Luís, Rufino Madruga, José Pires e Fernando Fonseca. O comando é constituído por Francisco Marques, comandante em substituição, e Gonçalo Guiomar, adjunto. A corpora-ção é reconhecida pela sua dinâmica, vitalidade e por estar sempre de portas abertas à comuni-dade.

Dirigir uma instituição em que os homens estão em grande número tem sido um desafio?

O facto de ser mulher não me faz diferença. Dizem que as mulheres têm uma sensibilidade diferente para certas coisas. São muito preocupadas com pormenores e com a organização. Se isso for uma diferença então que seja positiva (risos). Não sinto diferenças em trabalhar seja com homens, seja com mulheres. Temos é de nos conseguir entender conversando e resolvendo os assuntos internamente.

Como é que surge a sua ligação aos bombeiros?

Tive um pai que nunca foi bombeiro, mas frequentava os bombeiros. Como já tinha feito parte de outras associações: o Parque Residencial de Vialonga e a Ava Villa (Associação de Voluntários e Amigos de Villa Longa) fui convidada, em 2010, para integrar os corpos sociais dos bombeiros e aceitei. Em 2021 aceitei o desafio de ser presidente.

Foi um mandato curto, com a direcção a cair logo no ano seguinte…

Alguns membros da anterior equipa tinham opiniões divergentes, discordaram da forma como as coisas estavam a funcionar e decidiram apresentar a demissão. Perante isso achámos que a melhor coisa a fazer era demitir-nos todos, convocar eleições e deixar os sócios decidir. Das duas listas a votação os sócios deram-nos novamente a confiança para continuar e somos duas mulheres na direcção. Curiosamente no concelho de Vila Franca de Xira três corporações já são lideradas por mulheres nesta altura (Vialonga, Alverca e Póvoa de Santa Iria).

Como é que caracteriza a gestão da direcção?

Aqui todos defendemos a mesma dama. Temos de fazer ver que nem sempre temos capacidade financeira para fazer tudo o que queremos, mas tentamos sempre. Mesmo com pouco temos de ver o que conseguimos fazer para que sejamos o mais úteis possível à nossa terra.

Já sentiu pressões ou ouviu comentários desagradáveis por ser mulher?

Isso não me afecta. Se ouvir encaro-os como piropos, elogios, coisas boas (risos). A sociedade está em constante mudança. Espero que ser-se homem ou mulher a ocupar qualquer cargo de liderança deixe de ser um assunto. Espero que um dia isso seja apenas a constatação de um facto enquanto seres humanos.

Espera contribuir com o seu exemplo para as novas gerações?

Sabemos que prevaleciam os homens nestes cargos porque eram eles que iam aos cafés e conviviam. Naturalmente eles próprios convidavam outros homens para constituir direcções e as mulheres não estavam envolvidas nessa rede. O associativismo é feito dos encontros de amigos e de quem pensa da mesma forma para fazer um trabalho voluntário conjunto em prol da comunidade. O associativismo é este princípio e nele há espaço para homens e mulheres e cada vez mais conseguimos que haja essa paridade. No associativismo as mulheres não estão de fora porque muito do trabalho feito pelos homens conta sempre com a ajuda delas. Se ser mulher ajudar a cativar outras pessoas para o associativismo isso é positivo.

Já pensou que o associativismo pode desaparecer um dia?

O Estado nunca conseguirá, localmente, implementar respostas que respondam ao conjunto de todas as necessidades de uma freguesia e o associativismo tem esse papel. Não se pode ligar a gestão associativa a amadorismo e a um grupo de amigos que decide brincar ao associativismo. A área dos bombeiros está muito exigente do ponto de vista profissional, das regras, da burocracia, da parte jurídica e da gestão financeira. Isso exige que as pessoas sejam mais profissionais naquilo que estão a fazer voluntariamente.

A profissionalização é o caminho?

Ser voluntário não é ser menos profissional e empenhado que o pessoal do quadro. Os nossos profissionais não deixam de ser voluntários também. Mas é verdade que o Poder Central não facilita a integração dos voluntários. Metade do corpo activo continua a ser de voluntários não remunerados. Mas os que chegam com espírito voluntário, sem esperar grande coisa em troca, são cada vez menos. Na realidade neste tipo de actividade correm-se riscos e submetem-se a situações muito específicas que não são iguais a outros tipos de voluntariado. Por isso há um conjunto de incentivos pelos quais nos batemos há muitos anos. Isso faria o voluntário sentir-se mais motivado.

Central única vai melhorar a resposta

O que vai representar a criação de uma central única no concelho de Vila Franca de Xira?

A pressa pode ser inimiga de uma boa solução. Considero uma boa política estruturar os recursos, partilhados, mas complementados. Isto é, precisamos mais de veículos de combate a incêndios rurais porque temos zona florestal. Se calhar quem está em meio urbano precisa de mais auto-escadas e a isso chama-se complementaridade de recursos. A ideia é com a central mobilizar os recursos que são do concelho e geri-los para benefício do próprio concelho.

Há boa partilha de meios entre as corporações?

Há necessidade de haver capelinhas quando alguém se senta à mesa negocial e defende as necessidades da sua freguesia, como é óbvio. Mas no resto todos se entreajudam. Gostava que as associações, de forma organizada, tivessem mais apoios da câmara, recursos humanos e viaturas. Sabemos que é um investimento significativo para o município, mas é necessário. A responsabilidade da Protecção Civil e do socorro é do Estado, logo, estamos a ajudar nessa tarefa.

O que é que representa para a vida das corporações o Dia Municipal do Bombeiro que este ano se vai celebrar em Vialonga?

Faz sentido e é uma oportunidade para as pessoas conhecerem o nosso trabalho. Rodar anualmente entre todas as corporações permite que as pessoas tenham noção do que é a dimensão dos bombeiros a nível municipal. Os bombeiros não são apenas para quando as pessoas precisam, é isso que queremos desmistificar.

Quais as principais carências que sentem?

Temos carências financeiras, mas também ao nível dos recursos humanos. Um veículo de combate a incêndios custa mais de 300 mil euros. Uma associação não tem essa disponibilidade financeira, a menos que tenha capacidade de gestão eficaz senão está sempre dependente de subsídios. Temos aberto a porta do quartel para promover eventos que suprimam essas dificuldades através da nossa secção de cultura e desporto que agrega elementos da direcção e bombeiros. A pandemia veio travar alguns dos eventos que promovíamos, como passeios todo-o-terreno e noite de fados, mas queremos realizar um arraial nos santos. Temos também frequentemente as nossas viaturas em telenovelas e séries nacionais, o que é uma boa fonte de rendimentos para a corporação e dessa forma somos também úteis numa vertente diferente. Quando vamos participar nas filmagens explicamos às equipas de realização a forma certa de fazer determinadas operações de socorro e fazemos ao mesmo tempo prevenção às filmagens.

Uma associação com 45 voluntários e 25 profissionais

A Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Vialonga nasceu em 1974 para dar resposta à falta de meios de socorro à comunidade naquela vila do concelho de Vila Franca de Xira. Um grupo de amigos, liderado por José Almeida Fernandes, que fazia parte do vizinho corpo de bombeiros da Póvoa de Santa Iria, decidiu meter mãos à obra e constituiu uma comissão para angariar dádivas da comunidade tendo em vista a compra de uma ambulância que servisse as gentes de Vialonga.

A primeira ambulância, uma Peugeot 504 importada, foi recebida em festa na comunidade, com o lançamento de foguetes e uma parada pelas ruas. O registo notarial da associação dos bombeiros foi rubricado a 15 de Março de 1975 e o quartel inaugurado a 15 de Julho de 1979.

A associação cresceu ao ritmo da evolução populacional de Vialonga e precisou de ampliar as suas instalações por já não ter espaço suficiente para guardar as mais de duas dezenas de viaturas ao serviço. Durante 18 anos a associação lutou pela construção de um novo quartel que viu a luz do dia em 2019 e custou 1 milhão e 100 mil euros. A construção foi financiada por fundos comunitários e da câmara municipal cabendo à associação uma verba de 227 mil euros, que vai ter de pagar durante os próximos 25 anos.

A direcção é liderada pela psicóloga Cristiana António, de 44 anos, uma mulher num mundo ainda muito dominado por homens. A associação tem 2.500 sócios e um orçamento anual a rondar os 800 mil euros. Dá emprego a 25 pessoas e tem 45 voluntários.

A corporação desenvolve actividades de prevenção, emergência, socorro, transporte de doentes urgentes e não urgentes e também colabora com a comunidade numa lógica de parceria e formação. Tem reforçado a captação de recursos para o corpo de bombeiros. Aposta também na divulgação do papel dos bombeiros junto da comunidade e nos últimos anos tem também dado formação de Primeiros Socorros e Suporte Básico de Vida aos alunos da Escola Básica de Vialonga.

Por ano responde a mais de três mil serviços, a grande maioria no concelho. Também é chamada a reforçar a intervenção nos concelhos vizinhos da Grande Lisboa e em incêndios noutras regiões do país. A corporação também é uma participante activa nas rodagens das principais novelas e séries de ficção nacional, algo que lhes permite encaixar mais algumas verbas financeiras.

No concelho é reconhecida a sua capacidade e é vista como uma associação com grande vitalidade associativa. Nas últimas eleições, em 2022, concorreram duas listas, vencendo a que era liderada por Cristiana António. Uma das apostas é que a corporação seja vista como uma casa que tem as portas sempre abertas à comunidade e que nunca recusa ajudar quem precisa. Nos Bombeiros de Vialonga acredita-se que é pelo exemplo que se lidera e que é pelos valores do humanismo e da solidariedade que se comanda cada decisão do dia-a-dia.

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