O MIRANTE | 02-03-2023 12:00

Pedro Ferreira assume que controlo emocional é melhor arma para o combate político

Pedro Ferreira assume que controlo emocional é melhor arma para o combate político
ESPECIAL PERSONALIDADES DO ANO
Pedro Ferreira é autarca há mais de três décadas em Torres Novas e presidente da câmara há três mandatos

Pedro Ferreira vai abandonar a presidência da Câmara de Torres Novas em 2025 depois de mais de três décadas na autarquia, primeiro como vereador depois como vice-presidente e há 10 anos como presidente. Uma boa parte da sua vida foi dedicada à causa pública destacando-se também o seu papel como dirigente do Centro de Reabilitação e Integração Torrejano. Afável e de boas maneiras diz que a inteligência e o controlo emocional têm sido as suas principais ar-mas para vencer quem quer alcançar o Poder sem olhar a meios e realça que nunca se sentiu superior nem deixou de ser quem é.

Quais são os principais desafios para um autarca em Torres Novas?

É inventar tempo para ser um verdadeiro autarca. Tenho de fazer muito trabalho administrativo em casa para poder visitar todas as freguesias, estar com as pessoas e ser um autarca de proximidade. Mas, objectivamente, o grande desafio, independentemente das exigências que as freguesias têm, é fazer renascer o centro histórico. Também é importante potencializar a localização estratégica do concelho que está numa zona privilegiada do país. Vale a pena investir neste concelho porque temos condições muito especiais. As maiores lacunas são na área da Saúde e do Ensino Superior. São precisos mais médicos e gostava de ter ensino superior no nosso concelho.

Foi vice-presidente durante 20 anos e está há 10 como presidente da câmara. Tem vontade de partilhar os momentos que mais o marcaram?

Sou simpaticamente um desbocado. Quando estou com amigos ou com a família desabafo tudo o que me vai na alma. Faço por almoçar em sítios diferentes todos os dias e quando estou mais desanimado as pessoas notam e perguntam-me o que tenho. Se me perguntarem algo que possa responder não tenho problemas nenhuns em fazê-lo e até gosto de partilhar.

Ganhou ou perdeu com a política?

Ganhei muito mais. Nunca esperei estar tanto tempo no executivo municipal. Antes de entrar para a política tirei um curso comercial, fui para empregado de escritório, tirei um curso de Técnico de Contas, cheguei a chefe de escritório. Depois fui inspector de seguros e fui sub-gerente de uma delegação. Foi na área dos seguros que senti que tinha aptidão para a política. Os inspectores de seguros contactam muita gente e fazem muitos quilómetros na estrada. Comecei a conviver com toda a região. São currículos de vida que dão tarimba. Quando fui convidado para dar o meu contributo à terra senti que estava na minha altura. Depois de 20 anos como vice-presidente de António Rodrigues sentiria uma mágoa muito grande se não me candidatasse a presidente.

Como avalia o seu trabalho?

São papéis diferentes, mas em termos de dedicação senti-me sempre o mais ligado possível ao trabalho e às pessoas. Isto não é política barata, até porque já não posso concorrer a mais mandatos como presidente. Nunca me senti superior nem deixei de ser quem sou. Sempre adorei trabalhar com os funcionários do município e não me lembro de ter levantado a voz para algum. Agora que posso partilho uma sensação: tenho a certeza que 99% dos funcionários votaram em mim para presidente. Um conselho que dou a qualquer presidente é que trate bem os funcionários do município.

vontade de vencer na política pode colocar muitas amizades em causa

Tem inimigos na política?

Não tenho inimizades, seja com vereadores ou eleitos na assembleia porque tento sempre contornar e ser o mais racional possível. Mas confesso que fico chocado e indignado com algumas atitudes públicas e formas de falar de alguns autarcas. A vontade de vencer na política pode colocar muitas amizades em causa. Mas o meu silêncio tem saído sempre vencedor.

Quantas vezes acha que fez promessas e não conseguiu cumprir?

Tenho-me corrigido nomeadamente em relação aos prazos. Tenho falhado muitas vezes. Agora sou mais cuidadoso. Tirando o cumprimento dos prazos a maioria das promessas temos conseguido cumprir. As que ainda não foram vão ser com certeza ainda no meu mandato. Por exemplo, a reabilitação do Centro de Interpretação das Grutas do Almonda, no Vale da Serra; outra que está em curso, e que está a demorar mais a terminar, mas que para mim é uma coroa de glória, é o pavilhão de Riachos; a requalificação das piscinas e do mercado municipal; garantir saneamento básico em todas as freguesias do concelho. Há sempre muitas coisas para fazer.

Tem conseguido arranjar os trabalhadores que necessita para trabalhos menos qualificados?

Jardineiros temos conseguido, coveiros tem sido muito difícil. O funcionário público que trabalhe na área da serralharia, carpintaria, entre outras, não ganha muito. Se trabalharem para uma empresa ou fizerem uns biscates ganham mais do que estando na autarquia.

Tem havido algumas críticas em relação à falta de alcatroamento de caminhos rurais. O alcatrão continua a ser sinónimo de progresso?

Ainda é. Todas as terras devem ter boas acessibilidades. Durante vários anos recebi muitas queixas por causa da estrada que liga Nicho dos Riachos e o Entroncamento que concluímos com excepcional qualidade. Na Charneca de Alcorochel também temos de fazer uma grande intervenção, como na Beselga de Cima. As pessoas merecem que as suas terras tenham boas acessibilidades.

Faz sentido falar em boas acessibilidades na região se não existem transportes públicos?

É um trabalho de sapa convencer as pessoas a aderirem aos transportes públicos porque nunca tiveram grande qualidade. Por questões de rapidez e comodidade é difícil que as pessoas se mentalizem a utilizar este meio de transporte. No entanto, em relação aos transportes urbanos já vejo as coisas de forma diferente. Os nossos foram os primeiros do distrito e continuam a ter muita adesão.

O que menos lhe agradou no processo de transferência de competências do Governo?

Houve, e ainda há, muita falta de informação e diálogo. Se no início todas as autarquias aceitassem de mão beijada tudo o que nos estava a ser proposto seria um inconveniente financeiro, um pesado encargo, maior do que o valor das transferências. Por isso demorámos a aceitar a transferência de competências na área da Acção Social. Também vamos aceitar em breve a da Saúde. Há uma situação que pouco se fala neste aspecto que é a transferência dos edifícios públicos devolutos para as autarquias. Em Torres Novas temos interesse que isso aconteça.

O município teve um programador para o Teatro Virgínia mas acabou por não contratar mais nenhum. Porquê?

Tivemos sempre directores contratados e continuamos a ter um papel cultural de excelência no país. Houve concurso público para esse lugar mas Torres Novas não foi comtemplada. Foram classificados teatros muito recentes que nunca deram provas das suas capacidades. O Virgínia nunca parou de funcionar com qualidade. Em Abril vai haver novo concurso público e estamos a delinear estratégias para correspondermos às exigências. Mas não é garantia de qualidade termos esse director. A equipa que tem coordenado o Teatro Virgínia tem feito um excelente trabalho. Mas vamos concorrer porque podem vir verbas muito significativas.

Se soubesse o que sabe hoje o que teria feito de diferente?

Apenas lamento não ter conseguido conquistar algumas coisas para o concelho como, por exemplo, ter uma instituição de ensino superior. Mas ainda não parei de lutar por esse sonho e já estamos em contacto para o conseguir a médio prazo. De resto, sou feliz com o que faço. Ser autarca é uma vocação e sou-o de forma apaixonada. Quando deixar de o ser vou ligar-me a uma associação e vou dedicar-me da mesma maneira. Só tenho pena de ter deixado de lado o desenho e a pintura, duas actividades para as quais tenho alguma aptidão. Também gosto de escrever. Tenho uma espécie de livro de memórias para concluir há imenso tempo. Um dia vou lançar o livro mesmo que depois fique envergonhado.

Os arrependimentos atrapalham-no ou não tem arrependimentos?

Tenho arrependimentos, mas não me atrapalham. Penso neles durante algum tempo mas depois sigo em frente.

É conhecido por ser boa pessoa. Revê-se nessa classificação?

Muito sinceramente revejo. Tenho levado tanto pontapé na vida, de pessoas que não esperava e que me eram próximas, mas consigo sempre colocar açúcar para tornar uma coisa tão amarga numa um bocadinho mais doce.

Também tem azeites?

Sim, também tenho. Mas os meus azeites são diferentes dos das outras pessoas. Primeiro que aqueçam ao ponto de fritar qualquer coisa é preciso muito. Se isso acontecer é porque estão mesmo a pisar-me. Mesmo os gritos que alguns dão passam-me ao lado e tento sempre responder-lhes de forma inteligente. É uma riqueza para qualquer ser humano ter inteligência e controlo emocional.

Que importância tem este prémio para si?

Considero O MIRANTE um grande jornal regional e nacional. É um orgulho para mim e para a minha família ser distinguido tendo como critério a minha personalidade e modo de estar na política e na vida.

Três décadas ao serviço da causa pública

Autarca na Câmara de Torres Novas há três décadas Pedro Ferreira é um homem simples, afável e que não gosta de polémicas. Diz que é uma riqueza para o ser humano ter inteligência e controlo emocional na altura de responder a provocações menos agradáveis de pessoas que têm necessidade de vencer na política a todo o custo. Nasceu em Torres Novas há 71 anos. Aluno aplicado, terminou o curso de Comércio na Escola Industrial e Comercial de Torres Novas com excelentes notas. Gostava de ter continuado os estudos, mas por falta de condições financeiras foi obrigado a começar a trabalhar muito cedo. Arranjou emprego na empresa Luz & Irmão, em Riachos, onde esteve quase duas décadas. Entrou como um jovem sem experiência e saiu como chefe de escritório. Durante esse período tirou o curso de Técnico de Contabilidade e de Inglês, uma língua que o apaixona. Entretanto surgiu-lhe a oportunidade de melhorar o seu vencimento trabalhando para uma empresa de seguros, onde passou vários anos. Foi nessa altura que começou a despertar para a política e, em 1993, pediu uma licença sem vencimento e candidatou-se ao município de Torres Novas como segundo da lista do Partido Socialista.

Durante duas décadas foi vice-presidente da câmara e está há cerca de 10 anos como presidente, cargo que vai ocupar apenas mais dois anos uma vez que não pode voltar a recandidatar-se devido à limitação de mandatos. Quando sair quer dedicar-se a recuperar o tempo que roubou à família em prol da causa pública. Pedro Ferreira diz que a juventude teve um papel preponderante na sua forma de ser e estar na vida. Foi escuteiro muitos anos tendo exercido várias funções. É um homem do associativismo destacando-se o papel fundamental que teve no sucesso alcançado pelo Centro de Reabilitação e Integração Torrejano.

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